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Será que barras de ouro realmente valem mais do que dinheiro?

Por Vinicius Oliveira
Atualizado em 9 ago 2017, 16h49 - Publicado em 19 Maio 2015, 14h08

 

Silvio Santos já dizia que barras de ouro valem mais do que dinheiro. O presente não dá tanta razão ao homem do baú, mas a história ajuda a explicar o fascínio do metal. O encanto começa logo na tabela periódica. O ouro se destaca entre os outros 118 elementos: ele não é um gás, não corrói, não pega fogo e não te mata pelo contato. Só por esses critérios, a maior parte da tabela é eliminada. Além disso, é raro, mas não tanto quanto o ósmio. Ele também não oxida, como a prata. Restariam o ródio o paládio, mas eles não eram conhecidos antes de 1800. Finalmente, numa finalíssima com a platina, o ouro ganha por ter ponto de fusão menor (1.064 °C x 1.772 °C), o que facilita o manejo.

A soma dessa singularidade com um brilho que não se apaga deu valor ao ouro e à corrida para acumulá-lo. O poeta grego Píndaro, no século 5 a.C., já dizia que “o ouro é um filho de Zeus, nem as traças nem a ferrugem conseguem desgastá-lo, mas a mente humana é devorada por sua posse”.

Até o desenvolvimento da produção de moedas, apenas monarcas religiosos tinham contato com o metal. Afinal, era preciso mostrar quem mandava e quem tinha “contato direto” com os deuses. Egípcios, por exemplo, usavam barras com a estampa do faraó Menes. Só que, à medida que a economia se desenvolvia, era necessário criar algo mais simples para intermediar as transações. O ouro era o candidato natural. Mas tinha um problema: medir, pesar e conferir a pureza era difícil numa época em que não havia qualquer rascunho de Inmetro.

Foi então que, por volta de 550 a.C., na Lídia, atual Turquia, começaram a ser cunhadas as moedas como nós as conhecemos hoje. As primeiras eram feitas de electrum, a liga metálica que surge da mistura entre ouro prata. Isso criou um problema de confiança, já que não dava para saber se as moedas tinham realmente a quantidade de ouro que elas prometiam ter. Isso mudou com o rei Creso, que adotou a padronização do peso. As moedas passaram a ser feitas apenas de prata e ouro puros, com desenhos de partes do corpo de um leão indicando seu peso e valor. Finalmente o dinheiro seguia algum padrão. Foi uma revolução.

A capital Sárdis se tornou zona de conforto para mercadores rapidamente conquistou grande poder financeiro. Ela se tornou um paraíso de estabilidade no mundo antigo. Estava definido o padrão ouro versão 1.0. O comércio fluía de maneira tão espetacular que permitiu a construção de um dos maiores monumentos do mundo antigo, o Templo de Ártemis, a deusa grega da caça.

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Questão de fé

Assim como na Lídia do rei Creso, a economia atual também é movida pela confiança. Em 1999, quando você ainda se conectava à internet com o barulhento fax-modem e esperava dar meia-noite para pagar só um pulso telefônico, o ouro caminhava a passos lentos, como quem carregava nas costas o peso de milhares de anos como instrumento para acumular riqueza. Muito antes da febre do Facebook, empreendedores faziam dinheiro da noite para o dia às custas de planos de negócios mirabolantes. Usuários iniciantes ainda criavam suas primeiras contas de e-mail quando a bolha estourou logo após a Nasdaq, bolsa onde se negociam ações de tecnologia, atingir 5.048,62 (feito que não repetiu até hoje). O investidor levava um belo tombo e via o ouro despertar atenção novamente. Naquele momento, o ouro ressurgiu e relembrou um velho padrão: quando as coisas vão mal, o ouro vai bem.

Em Como Lucrar com Ouro, Jonathan Spall, um ex-operador financeiro com passagem pelo banco alemão Deutsche Bank e pelo britânico Barclays, explica que a cotação do ouro tende a subir quando o dólar cai –e vice-versa. Quando investidores internacionais compram ouro, o dólar é vendido e isso leva à diminuição do valor da moeda americana. Como consequência, a demanda pelo metal faz seu preço subir. Se a inflação sobe, porque tem muito dinheiro no mercado, o ouro naturalmente a acompanha. Logo, é uma boa proteção contra o efeito corrosivo da inflação em tempos incertos. Segundo Spall, quando você acredita que os governos têm controle da situação, existem poucas justificativas para investir em ouro. Quando a maré muda, é hora de apostar nele. Foi isso que aconteceu em 2008. Se você tivesse percebido que algo ia mal no mundo em 2007, um ano antes da quebra do banco Lehman Brothers, teria tido um senhor lucro.

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Em agosto de 2007, a cotação estava em US$ 660 dólares. Em dezembro de 2009, ela bateu em US$ 1.210. Na Europa, o valor também disparou, tamanho era o medo do contágio da crise financeira. Meio ano depois, durante a explosão da crise da dívida de países europeus como Portugal, Espanha, Itália e Irlanda, a cotação ainda avançaria mais. O ouro é a última reserva confiável quando tudo fica instável.

Quem decide quanto vale

Quase todo ouro extraído na história continua por aí na forma de moedas, de barras, de dentes, de joias. A soma de todo o ouro que já foi extraído alcança 177.200 toneladas, uma quantidade que, se reunida, preencheria a Torre Eiffel ou formaria um cubo de 21 metros de lado, segundo dados do World Gold Council (Conselho Mundial do Ouro). Mesmo assim, segundo o conselho, essa quantidade seria insuficiente para financiar o comércio mundial, a não ser que pequenos grãos do metal passassem a valer altas cifras.

Desde 1919, após a Primeira Guerra Mundial, o preço do ouro é definido pela London Gold Market Fixing, em Londres. Os maiores intermediários de ouro do mundo, os bancos Barclays, HSBC, Nova Scotia e Société Générale, informam duas vezes ao dia, por meio de uma conferência privada, de cerca de 10 minutos, a que taxa pretendem comprar ou vender para clientes ou adquirir para suas próprias contas.

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Após 95 anos em funcionamento, o sistema que movimenta bilhões de dólares todos os dias está na berlinda. O britânico Barclays foi multado em US$ 45 milhões (R$ 100 milhões) após um ex-operador ter admitido a manipulação da taxa do ouro, que cabe apenas aos quatro bancos (o alemão Deutsche Bank pulou do barco quando surgiram as primeiras suspeitas no começo do ano). A London Gold Market Fixing tenta contornar o caso e já se propôs a adotar um novo código de conduta. Tudo para que a confiança no ouro, herança de tantos séculos, não seja abalada.

Como eu uso

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Depois de se informar sobre EUA e Europa, talvez você decida comprar ouro e virar um aspirante a Tio Patinhas. Mas como fazer isso? “O investidor deve ficar atento a notícias sobre a economia de grandes centros, como EUA e Europa, especialmente os dados sobre emprego e de crescimento”, aconselha Maurício Gaioti, especialista da corretora Ourominas. E depois? Primeiro, é bom saber que não adianta correr para a joalheria, porque nem sempre o brinco, colar ou anel que você adquirir terá 24 quilates (999 partes de ouro fino para cada 1.000 partes de metal). Além disso, o preço da joia não tem tanta ligação assim com o praticado no mercado. Joia opera em outra faixa de valor. Seu anel de casamento não tem preço…

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Para investir em ouro, é preciso sair do shopping e ir a outros lugares. Um deles é a bolsa brasileira, a BM&FBovespa. Lá, você compra contratos do metal precioso. Como o mais negociado é o de 250 gramas, serão necessários mais de R$ 20 mil para entrar no jogo.

Os bancos também criaram fundos que investem em ouro. Lembre-se que aqui você deve tomar cuidado tanto com as rentabilidades do passado quanto com as taxas de administração. Um bom passado não é garantia de bom futuro. Além disso, taxas altas podem fazer com que você perca boa parte da sua rentabilidade.

“Em 2008, o ouro tinha cotação de R$ 40 a grama e, em 2012, foi para R$ 118, uma rentabilidade de 66%. Agora, a economia americana e a europeia estão mais tranquilas e o preço recuou um pouco”, explica Gaioti.

Para quem quer aplicar em quantidades menores, a alternativa é o chamado “mercado de balcão”. É bem fácil, funciona pela internet e você consegue negociar com a corretora a compra de pequenas barras (também chamadas de lingotes). Como acontece quando você compra dólar, corretoras cobram um ágio e, por motivos de segurança, é recomendável deixar seu tesouro em custódia e levar para casa apenas o certificado.

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Na maior parte das vezes, o ouro é para o investidor conservador, que busca uma diversificação à moda antiga. Porém, ele não gera renda, não paga juros e não tem o potencial de produzir lucros mensais ou trimestrais. Quem possui pouco dinheiro para aplicar pode ganhar mais de outros jeitos. Nos impostos, os investimentos em ouro seguem as regras para ações. Vendas mensais de até 20 mil reais são isentas do Imposto de Renda. Para operações iniciadas e encerradas no mesmo dia, a taxação é de 20%. O ouro é sedutor, mas é preciso ter o coração duro para resistir aos seus encantos.

*O texto foi originalmente publicado no Dossiê SUPER Como plantar, regar e colher dinheiro

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