Luiz Dal Monte Neto
O alemão Emanuel Lasker é um nome conhecido entre os enxadristas – ele é um dos que compõem a restrita galeria dos campeões mundiais de xadrez. Conquistou o título em 1894, arrebatando-o de Wilherlm Steinitz e o manteve por 27 anos, até perdê-lo para o cubano José Raúl CapaBlanca. Lasker tinha interesses mais variados que a média dos campeões mundiais. Era graduado em Matemática e apreciava ciências e Filosofia. Num pequeno livro intitulado Struggle (Luta), ele procurou estabelecer princípios que fossem úteis para qualquer atividade competitiva, fosse o xadrez, qualquer outro jogo, ou esporte, ou guerra, ou, em última instância, a própria vida. Matéria-prima de suas reflexões, era natural que ele mantivesse uma viva curiosidade pelos mais diversos jogos. Chegou até criar um que se tornou conhecido pelo nome de Lasca, cujo equipamento é originário do jogo de damas, mas cujas regras determinam procedimentos táticos e estratégicos muito diferentes.
Para praticá-lo, o leitor precisará de um tabuleiro de xadrez ou de damas, mas deverá cobrir uma fileira e uma coluna, deixando exposto um quadriculado de 7×7 casas, cujos quatro cantos são casas brancas. O melhor, no entanto, é desenhá-lo sobre uma cartolina ou placa de madeira, ficando com um tabuleiro menos improvisado. As peças, onze de uma cor, onze de outra, podem ser emprestadas de um jogo de damas, mas é fundamental que tenha as duas faces distintas (se não tiverem, pode-se fazer uma marca numa delas – usualmente, um pequeno ponto). A posição inicial é a que se vê na figura 1. A partir dela, os jogadores se alternam, fazendo um lance por vez. As peças movem-se de um em um quadrado, apenas pelas casas brancas, diagonalmente. No princípio, todas elas são denominadas soldados e podem andar e pular só para a frente.
Quando um soldado chega à última fileira, transforma-se em oficial e, para indicar essa promoção, a peça é virada com o ponto para cima. Novo status, novo poder. Os oficiais podem andar e pular para frente e para trás, sempre diagonalmente e uma casa por vez. O leitor deve estar achando que estou vendendo gato por lebre, ou damas por Lasca, mas verá que as semelhanças terminam aqui.
Em Lasca as peças capturadas não são removidas do tabuleiro: todas elas permanecem nele até o final da partida. Quando uma peça pula uma peça adversária adjacente, caindo na casa vaga imediatamente seguinte, ela apenas a aprisiona, ficando empilhada sobre ela. A peça que aprisionou passa a se chamar comandante e continua a se mover normalmente (como soldado ou oficial, conforme o caso). A que ficou aprisionada é carregada junto com ela, como se fossem uma coisa só – seu dono original não tem mais o controle dela, enquanto não for libertada. O aprisionamento é obrigatório, ou seja, se houver essa possibilidade, o jogador é obrigado a fazer a jogada. Se houver vários aprisionamentos possíveis, ele pode escolher entre esses. Se, após um aprisionamento, ainda restarem outros possíveis, estes também serão compulsórios. O conjunto comandante-prisioneira recebe o nome de coluna.
Uma coluna pode aprisionar outras peças, aumentando seu tamanho. Cada nova prisioneira é posta na base da pilha e passa a se mover junto com a coluna, sob o comando do jogador que possuir seu comandante. Todavia, uma coluna pode ser pulada por uma peça isolada ou por outra coluna. Neste caso, quem pulou a coluna aprisiona somente o seu comandante. Com isso, a próxima peça da pilha – que era prisioneira – torna-se o novo comandante da coluna. Isso permite que uma coluna possa ser desmanchada e que as prisioneiras ganhem vida, provocando “viradas” espetaculares na partida.
Alguns detalhes completam as regras: se uma coluna comandada por um soldado atingir a última fileira, ele é promovido a oficial, mas a coluna não se altera. Uma promoção encerra a jogada, ou seja, um soldado não pode ser promovido e, na mesma jogada, pular para trás e fazer uma prisioneira. Um oficial não pode atacar uma coluna mais de uma vez na mesma jogada, pulando-a para a frente e para trás. Em Lasca, o objetivo é deixar o adversário sem nenhuma jogada possível. Isto pode ocorrer porque todas as suas peças se tornaram prisioneiras, ou porque suas peças e colunas ficaram bloqueadas pelas peças oponentes. Assim, o jogo termina e quem fez o último lance é o vencedor.
Luiz Dal Monte Neto é arquiteto e designer de jogos e brinquedos