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Superprofissional

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h46 - Publicado em 30 set 2000, 22h00

Rafael Kenski

Esta é para você que está achando a vida dura: para impressionar um headhunter daqui a 50 anos, seu neto terá que ser sensível como um artista e exato como um engenheiro. Além disso, precisará ser muito bom em alguma coisa sem deixar de entender um pouco de tudo

Em 1986, depois de atuar por 11 anos como especialista em cirurgia pediátrica, Fábio Gandour achou que sabia menos do que desejava. Já havia trabalhado em vários hospitais e participado de pesquisas que revelaram a causa de diversas deformidades congênitas. Mesmo assim, percebeu que os seus conhecimentos de Medicina seriam melhor aproveitados se aprendesse outra coisa: computação. Loucura? Gandour especializou-se em informática médica – uma formação que, na época, soava absolutamente exótica. “Eu era considerado louco por ser médico e me dedicar ao estudo dos computadores”, diz Gandour.

Hoje, obviamente, os computadores são ferramentas banais no dia-a-dia de qualquer médico que se preze. Gandour, por exemplo, na posição de diretor executivo da IBM para a indústria de saúde na América Latina, recebe de todo o mundo diagnósticos de tumores apoiados em animações, som, links e outros badulaques digitais que transformaram para sempre a sua profissão. A história de Gandour é exemplar: dentro de 30 ou 40 anos, as carreiras isoladas deixarão definitivamente de existir e os cargos realmente quentes serão ocupados por profissionais que dominem áreas tão distantes entre si quanto o Direito e a Biologia, as Artes Plásticas e a Matemática. “Os profissionais de sucesso num futuro muito próximo serão aqueles que conseguirem reunir em si as habilidades de uma equipe inteira”, diz Oscar Motomura, diretor geral da Amana-Key, consultoria especializada em gestão empresarial, baseada em São Paulo. “O motivo é que as tecnologias vão incorporar os mais variados tipos de conhecimento”, diz, em consonância, Ted Selker, professor do Medialab do Instituto de Tecnologia de Massachusets (o famoso MIT), Estados Unidos. “Haverá uma demanda enorme por gente eclética, que saiba o suficiente de cada área para orientar especialistas reunidos em grandes equipes de trabalho.” A fusão de campos de conhecimento e a mistura de tecnologias, responsáveis por essa revolução, já estão, segundo Selker, nas lojas.

Pelo menos em parte. Pense um pouco: um celular pode parecer apenas um telefone portátil, mas não é. Ele acessa a Internet, recebe e-mails, toca música e ainda tem agenda, relógio e jogos (sem contar os que também combinam com a roupa do dono). Tudo isso faz com que o seu projeto não possa mais ser assinado por um simples engenheiro elétrico, como até há bem pouco tempo. A construção de um celular exige, no mínimo, um engenheiro eletrônico, um designer e um especialista em Internet.

Tente agora imaginar o que vai acontecer dentro de 40 ou 50 anos, quando os carros saberão, sozinhos, achar o caminho de casa e entrar na garagem. E a geladeira estiver conectada à Internet (para registrar o que falta e mandar vir as compras do supermercado). E os animais de estimação forem uma mistura de gato angorá com buldogue, ou de gato siamês com chiuaua, todos criados em laboratórios de engenharia genética. Tudo isso está às vésperas de acontecer: “Depois de 2050, talvez viajemos em naves com forma de inseto, totalmente robotizadas. Elas se deslocarão com a rapidez de um foguete mas, ao chegar ao destino, pousarão com a graça de uma borboleta”, diz o físico americano Freeman Dyson, da Universidade Princeton e consultor da Nasa. “É o que se pode esperar da união futura entre a Genética e a Robótica.”

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Atento às novas tendências tecnológicas, Ted Selker já rabiscou o projeto de uma cama que será uma verdadeira cápsula, com ambiente multimídia completo, capaz de simular a alvorada e o céu estrelado, ou de tocar música, projetar livros digitalizados e e-mails no seu teto. “Para desenhá-la, vamos precisar de uma equipe que tenha até editores de literatura e músicos”, afirma Selker.

Que nome terão os superprofissionais que tomarão a Terra daqui a duas gerações? Analistas de biomecânica? Farmaquiadores estatísticos? Psicoengenheiros? Seja qual for, a receita do seu êxito será simples: bastará reunir as informações que julgarem relevantes, chacoalhá-las na cabeça e relacioná-las de forma criativa. “Não será tão difícil quanto parece porque redes inteligentíssimas de computador facilitarão incrivelmente o acesso a todos os dados necessários”, diz Randy Bryant, diretor da Faculdade de Ciências da Computação de Carnegie Mellon, em Nova Jersey, Estados Unidos.

“O desafio real estará em reunir todas as tecnologias disponíveis para criar o inédito”, diz Motomura. “Eu apostaria que a habilidade para isso virá do campo das artes, onde a intuição é valorizada e o espírito está conectado com a essência criativa.” “Também pode ser crucial a formação crítica e humanista de historiadores e filósofos”, afirma o sociólogo Glauco Arbix, da Universidade de São Paulo. “Ela dará orientação dentro da enxurrada de informações.” Nas duas páginas seguintes, você conhecerá algumas das profissões que, em 2050, serão as mais quentes do mercado, na opinião dos especialistas. Eles delineiam os horizontes que a ciência e a tecnologia estão abrindo para o mercado de trabalho dos nossos netos.

Médico-estatístico-informaticista

Em 2050, quando os computadores serão 200 milhões de vezes mais rápidos que os de hoje, será possível reunir conhecimentos da Medicina, da Estatística e da Informática em uma única carreira. O profissional capaz de fazer essa ponte poderá analisar a probabilidade de uma epidemia explodir em uma comunidade e prever as formas de controlá-la a tempo. “As redes de computadores coletarão informações detalhadas de pacientes de todo o mundo e identificarão padrões nunca antes percebidos nas enfermidades”, afirma Randy Bryant. No mundo densamente povoado do futuro (a Terra terá então 8,6 bilhões de habitantes), será crucial esse tipo de ação preventiva. Mas o médico-estatístico-informaticista também atuará dentro do corpo. Aí, simulará a ação de diversas drogas no corpo humano e selecionará a mais eficaz. “Outra possibilidade é a de vasculhar os genes com rapidez, em busca de mutações potencialmente perigosas”, diz Gandour.

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Educador 3D

Não espere que os professores continuem iguais aos que se vêem hoje em colégios ou cursinhos. “Eles farão parte de comunidades virtuais, nas quais irão se misturar a cientistas, jornalistas, designers e programadores de computador”, afirma Howard Rheingold, presidente da Rheingold Associates – uma empresa de consultoria –, primeiro editor da revista eletrônica HotWired e inventor do termo “comunidade virtual”. Nessas escolas sem endereço físico, a troca de dados será maciça e as informações terão altíssima qualidade. O cargo fundamental, aí dentro, será o educador 3D, que somará as habilidades de todos os profissionais acima, com o objetivo de dar ao ensino a maior eficiência possível. Mas não apenas isso: a sua habilidade em selecionar as informações e em torná-las mais acessíveis poderá ser útil de diversas formas. Até os cientistas recorrerão ao educador 3D quando tiverem necessidade de um dado. “O professor 3D construirá espaços virtuais nos quais os alunos usarão todos os seus sentidos para aprender”, diz Rheingold.

Advogado-filósofo-antropólogo

“Daqui por diante, as empresas precisarão de consultores em questões éticas para criar códigos de conduta em relação aos empregados e aos recursos naturais”, diz Oscar Motomura. “Os consumidores do século XXI exigirão que as empresas cumpram o que prometem.” À medida que os recursos ficarem escassos, será preciso atacar os problemas ecológicos de vários ângulos ao mesmo tempo: legais, filosóficos, administrativos e antropológicos. Harmonizar todos esses aspectos será função do advogado-filósofo-antropólogo. Já existem “livros de boas maneiras” para pautar a ação das corporações, como a I 14000 – um certificado de que as operações da empresa não degradam o ambiente. “No futuro, esse tipo de atestado será muitíssimo mais complexo”, afirma Motomura. “Ao compromisso de não poluir o ambiente, se juntará também o de pagar bons salários e o de garantir condições de trabalho saudáveis.”

Engenheiro-clínico-estilista

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“Levando ao extremo uma tendência já existente, os aparelhos eletrônicos não serão mais transportados e sim vestidos”, afirma Gandour. “Profissionais que entendam tanto de moda quanto de eletrônica transformarão as roupas em objetos funcionais e, ao mesmo tempo, de grande plasticidade.” Os celulares e pagers que já são parte da indumentária vão se reduzir a menos que um botão de casaco. “Um telefone será apenas um chip”, afirma Mark Pinto, diretor técnico do Grupo de Microeletrônica da Lucent. Nossas roupas vão falar com outros sistemas da casa: o ar condicionado será automaticamente acionado quando a temperatura do seu corpo exceder certo limite, você poderá mudar o canal da televisão esticando um dedo, abrir portas fechando a mão ou trazer o carro até você com o som da voz. Sensores tricotados entre os fios de tecido fornecerão dados instantâneos sobre sua saúde e diagnósticos rápidos, avisando-o se é o caso de ver um médico.

Sócio-demo-historiador

“Para ocupar esse cargo será preciso conhecer História, Ciência Política, Demografia, Saúde, Transportes Públicos, Assuntos Cívicos e Serviço Social”, diz Joseph Chamie, diretor da ONU. “Precisaremos de profissionais altamente capacitados para organizar a população urbana no futuro.” Segundo o Instituto Internacional Worldwatch, em 2050 as cidades vão acomodar 6,5 bilhões de pessoas (elas hoje abrigam 2,9 bilhões). E o número não é o único problema. Países tecnologicamente avançados terão uma população cada vez mais idosa e grande necessidade de mão-de-obra jovem, que terá que sair das nações menos desenvolvidas, responsáveis por 97% do crescimento populacional. Como equacionar esse vaivém? “Precisaremos de um profissional capaz de administrar padrões de comportamento complexos”, afirma Chamie. “Será o papel do sócio-demo-historiador.”

Designer de materiais e tecidos vivos

“Uma atividade muito valorizada, dentro de mais duas ou três décadas, será a dos engenheiros de átomos”, afirma o empresário americano Peter Schwartz, presidente da Global Business Network, um think-tank americano baseado em San Francisco. “Sua função será montar materiais átomo a átomo e dar a eles a propriedade que se queira.” O designer de materiais e tecidos vivos fará borrachas-metais, vidros-ossos, madeiras-plásticas e assim por diante. Ele poderá montar carrocerias de automóveis que desamassam sozinhas ou criar rins, fígados ou corações artificiais. Para isso, também terá de dominar a nanotecnologia – ciência que lida com objetos que medem bilionésimos de metro. Essa área de estudo começou para valer em 1990: pesquisadores da IBM escreveram o nome da companhia em uma placa microscópica de metal onde as letras I, B e M tinham apenas 35 átomos. Daqui a 50 anos, mesmo objetos grandes como um carro terão detalhes projetados com essa mesma precisão submolecular.

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Para saber mais

Na livraria: Profissões do Futuro

Gilson Schwartz, Publifolha, São Paulo, 2000

Na Internet:

Hot Jobs For The 21st. Century

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https://www.usnews.com/usnews/nycu/work/wohotjob.htm

Futurework Report – Trends and Challenges for Work in the 21st Century

https://www.dol.gov/dol/asp/public/futurework/report.htm

Você S.A. – Seu Emprego no Futuro

https://www2.uol.com.br/vocesa/edi26/capa.shl

rkenski@abril.com.br

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