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“Link Perdido”, nova animação em stop motion, retrata ciência do século 19

No filme, um naturalista inglês pomposo encontra o elo perdido entre humanos e chimpanzés: um pé-grande alfabetizado, que quer voltar para o Himalaia.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 8 nov 2019, 18h18 - Publicado em 8 nov 2019, 18h14

Telégrafo. Metrô. Telefone. Aquários. Ketchup. Fusos horários. O subdesenvolvimento da África. A estética steampunk. O Velho Oeste. Darwin. Exploração da Lua. O que essas coisas têm em comum? Todas datam da segunda metade do século 19 – quando o Império Britânico, sob tutela da Rainha Vitória, dominava 22% dos territórios do mundo; os colonos da costa leste dos EUA rumaram à Califórnia em busca de ouro; e o Brasil agrário era governado por D. Pedro II, um imperador geek que colecionava múmias, batia papo com Vitor Hugo e era fã de meteoritos.

Julio Verne – que em 1865 acertou o local da Lua em que pousaria a Apollo 11 com um século de antecedência – escreveu sua obra em Paris, a alguns quarteirões de Charlie Cros, inventor que propôs um método de comunicação com os marcianos usando espelhos instalados no Campo de Marte – a praça em que seria construída da Torre Eiffel em 1887 (a Estátua da Liberdade também é dessa época).

Os paletós sóbrios e cartolas pretas em fotos amareladas dão uma impressão errada do que foi o século 19 na Europa: uma época colorida e extravagante, de crença inabalável na ciência e tecnologia, cujos erros foram tão influentes e duradouros quanto os acertos: houve o racismo. Houve a desigualdade social e a concentração de renda geradas pela industrialização. Houve as divergências em relação à partilha das colônias que levaram à 1a Guerra Mundial – moldando o mundo contemporâneo. 

Link Perdido – animação em stop motion que estreou no Brasil nesta quinta-feira, 7 de novembro – captura essa atmosfera com precisão. Sr. Lionel Frost é um naturalista londrino jovem e pomposo, seguidor da teoria da evolução de Darwin. Ele se dedica à buscar monstros míticos (como o do lago Ness) cuja existência os naturalistas mais velhos põem em xeque. Frost até tropeça em uns bichões radicais, mas não consegue provar: algo sempre dá errado na coleta de evidências.

Seu sonho é entrar em uma versão de desenho animado da Royal Society – o clubinho de cientistas ricaços que se reúne em Londres desde 1660 para compartilhar causos. Para isso, porém, ele precisa se provar para o presidente: o arrogante lorde Piggot-Dunceby, um velhaco ranzinza com um séquito de seguidores que se humilham de bom grado. Ele não acredita que o ser humano e o chimpanzé compartilham um ancestral comum, e considera Frost um pentelho delirante.

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Certo dia, Frost recebe uma carta em caligrafia infantil: um remetente anônimo informa que, em um cantinho isolado e chuvoso do oeste dos EUA, há uma criatura peluda de três metros de altura e 290 kg, com aparência e trejeitos humanos, esperando para ser descoberta. Ansioso com a oportunidade de finalmente coletar um espécime relevante, Frost parte rumo ao Novo Mundo (a representação do Velho Oeste, diga-se, é inédita: ao invés das cidadezinhas de madeira clichê no meio de um deserto texano, vemos um vilarejo úmido e cheio de lama próximo a onde hoje fica Seattle).

Chegando lá, Frost encontra Sr. Link: um pé-grande solitário que vive em uma caverna repleta de livros, fala inglês fluentemente e tem consciência de que pode ser o elo perdido entre humanos e chimpanzés. Ele é o bicho sorridente que você vê ali na imagem do começo do texto. E tem um pedido a Frost: que o inglês o leve ao Himalaia, onde vivem seus ancestrais, os ietis tibetanos.

A técnica de filmagem em stop motion envolve fotografar os personagens – que são bonecos com rostos removíveis – em poses ligeiramente diferentes 24 vezes para cada segundo do filme. Exemplificando: suponha que Frost dê um sorriso que dura dois segundos. É necessário fotografar o boneco 48 vezes: na primeira foto, a boca está fechada; na última, totalmente aberta. Quando essas imagens são reproduzidas em rápida sucessão, surge a ilusão de movimento.

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Os rostos não eram articulados. Era preciso fazer um rosto novo para cada frame, usando uma impressora 3D extremamente avançada. Assim, um único sorriso de Frost exigia gerar cópias físicas de sua feição 48 vezes, cada uma com a boca só um pouquinho mais aberta que a anterior. Haja paciência. Foram 39 mil fotos de Lionel, 27 mil do Sr. Link e 13 mil de Adelina (outra personagem, que não vamos comentar para não dar spoilers).

Filmar uma cena de 20 segundos dos personagens andando nas costas de um elefante tomou três meses. A renderização levou ao todo 12 mil anos – obviamente divididos entre muitos servidores, caso contrário, o filme nunca teria saído. Depois desse trabalho todo, nada mais justo que escalar um elenco de respeito para a dublagem: a voz do protagonista é de Hugh Jackman, a de Adelina, de Zoe Saldana, o vilão é Stephen Fry. Pena que a adaptação nacional, além de chegar com atraso (o longa estreou em abril nos EUA), não manteve o padrão.

Link Perdido é um alívio diante da barragem de remakes caça-níqueis da Disney. Produzido pelo estúdio Laika – o mesmo responsável por A Noiva Cadáver –, o filme ressignifica personagens clássicos (como o pé-grande e o monstro do lago Ness), e contextualiza o trabalho de Darwin em sua época: para adultos e crianças, é uma aula sobre como era o mundo que recebeu a teoria da evolução.

 

 

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