O modelo perfeito do Renascimento
Leonardo da Vinci, 1452-1519, Serge Bramly, Imago Editora, Rio, 1989
Toda biografia veicula modelos, sonhos, experiências. O exemplo de Da Vinci, retratado por Serge Bramly. é muito adequado para o nosso tempo. Sua vida é quase um balanço do que a humanidade já havia feito e uma sutil avaliação do que havia por fazer. Como nós, vive na encruzilhada de dois séculos. Dos anos 400 para os 500, o mundo viveu transformações tão radicais como o nosso. Atravessou-se o Atlântico, descortinando para a Europa um Novo Mundo, ampliaram-se a proporções desconhecidas as possibilidades de comunicação, graças ao texto impresso. Às universidades, grandes centros formadores de intelectuais, juntaram-se as botteghe dos mestres da arte de pintar, cinzelar, esculpir, planejar o crescimento urbano. Era assim a oficina de Andrea del Verrocchio (1435-1488) em Florença, onde Da Vinci fez seu aprendizado em artes múltiplas.
São tempos atormentados como os nossos. Aos primeiros passos da ciência moderna opõem-se superstições de toda ordem. O homem deve marcar sua existência com uma obra, que pode ser até a própria vida, pensam os renascentistas. Num mundo tão sedutor, tão cheio de percalços e contradições, Leonardo aconselha a trabalhar com obstinato rigore (um rigor obstinado). O rigor pressupõe observar, analisar, deduzir, experimentar – bases de seu método de trabalho. Não será este um modelo apropriado para nosso tempo?
Leonardo, esse gigante que seu século forjou, esculpe-nos agora. Seus limites e grandezas são também os nossos, mas sua singularidade inscreve-se acima de todos nós.
Seria injusto, contudo, atribuir o sucesso da obra de Bramly apenas aos campos de significação que o modelo oferece ao nosso mundo. O livro dá um belo painel da vida nas grandes cidades italianas renascentistas (Florença, Milão, Roma), caracterizando muito bem essa riquíssima vertente do Renascimento. O autor constrói a biografia em boa parte a partir de textos de época. Utiliza-se fartamente dos manuscritos que Da Vinci deixou, num total de quase 7 mil folhas, hoje arrumadas em coleções (códices) em bibliotecas e museus. No último capítulo do livro, intitulado “A marca de sua mão”, Bramly faz um balanço do destino dessa documentação.
Além de trabalhar com fontes primárias, usa também os mais importantes estudos existentes sobre Da Vinci – o de Valéry, por exemplo, e o de Freud, que lança grandes polêmicas sobre a questão da homossexualidade do artista, a partir da análise de alguns de seus manuscritos e de sua pintura. Onde há polêmicas, lacunas, Bramly esclarece ou aponta soluções. Do ponto de vista do indivíduo, procura mostrar um espírito angustiado, com lembranças de uma infância semimarginalizada em que o filho bastardo de um notário é acolhido pela família, mas lhe é sempre lembrado o lugar da ilegitimidade.
No plano de sua existência social, o autor mostra um Da Vinci modelo perfeito do Renasci mento – bom, belo e sábio. Julgado por seu tempo, tem papel importante na sua transformação.
Atravessa os séculos ao lado de outros gênios, seus contemporâneos – Verrocchio, Botticelli, Michelangelo -, que Bramly toma como parâmetros, únicos possíveis para situar Da Vinci em seu tempo. Assim, entre Florença dos Medici e Milão dos Sforza, entre o papa e o rei francês, desfilam as grandes obras que a mão de Da Vinci legou para sempre à humanidade – lá e aqui estão a Mona Lisa, a Virgem dos Rochedos e a Santa Ceia. Lá e aqui está Leonardo Da Vinci.
Vânia Leite Froes
Doutora em História e professora do curso de pós-graduação de História da Universidade Federal Fluminense
Para que 1789?
Cidadãos, Simon Schama, Companhia da Letras, São Paulo, 1989
A democratização do regime político francês poderia ter se dado sem a Revolução de 1789. Essa é a tese central da mais polêmica obra sobre o assunto a surgir por ocasião do bicentenário. O autor, historiador inglês, sustenta também que o Terror foi o motor da Revolução e não um excesso acidental. Leitura obrigatória.
Uma nova tecnologia
Supercondutividade, Jonathan L. Mayo, McGraw-Hill, São Paulo, 1989
Resumo didático para leigos do impacto causado pela descoberta dos materiais supercondutores, que transportam eletricidade sem perdas, a temperaturas cada vez mais altas. Os avanços das pesquisas e o futuro da nova tecnologia.
A agonia de Roma
Declínio e queda do império romano, Edward Gibbon, Companhia das Letras, São Paulo, 1989
Versão condensada da célebre obra do historiador inglês Edward Gibbon (1737-1794), publicada originalmente em seis volumes. Do século II até a tomada de Constantinopla pelos turcos em 1453, Gibbon não apenas analisa as causas da destruição do maior império da Antiguidade, como também conta sua história desde o princípio.
Viagem ao passado
Convite à Arqueologia, Philip Rahtz. Imago, Rio de Janeiro, 1989
Para quem quer saber um pouco mais sobre o tema, o presidente do Conselho Britânico de Arqueologia mostra que, além de escavar a terra em busca de vestígios do passado, seus colegas também estudam a luta do homem para sobreviver.