“No Other Land”, documentário favorito ao Oscar, foi dirigido por coletivo palestino-israelense
O filme documenta a expulsão forçada de palestinos em área da Cisjordânia ocupada pelo exército de Israel. Saiba mais sobre os bastidores da obra.

Apesar de não ter uma distribuidora nos Estados Unidos nem o apoio de grandes estúdios, No Other Land (em português, “Nenhuma Outra Terra”) é o favorito para levar a estatueta de Melhor Documentário de Longa-metragem no 97º Oscar, que acontece no próximo domingo (2).
O motivo para a falta de distribuição, apesar do sucesso de crítica, é o tema polêmico do filme: ele foi dirigido por um coletivo de ativistas palestinos e israelenses sobre a violência do exército de Israel na comunidade de Masafer Yatta, na Cisjordânia – região da Palestina que tem sido ocupada pelos israelenses de forma ilegal, de acordo com o direito internacional.
As forças armadas israelenses demolem casas e expulsam famílias que vivem em Masafer Yatta há gerações, reivindicando que a região precisa ser usada como área de treinamento militar. Trata-se da maior transferência forçada já feita na Cisjordânia sob ocupação israelense, que começou em 1967. Tudo isso é reportado em No Other Land, que estreou (e ganhou o prêmio de melhor documentário) no Festival Internacional de Cinema de Berlim em fevereiro de 2024. Assista ao trailer do filme:
Quem assina a direção são os palestinos Basel Adra e Hamdan Ballal e os israelenses Yuval Abraham e Rachel Szor. Adra e Abraham também são os protagonistas do documentário. O palestino de 28 anos documenta a destruição de casas e expulsão forçada de moradores de sua comunidade desde a adolescência. O israelense é um jornalista que viaja com frequência para a Cisjordânia ocupada para escrever sobre Masafer Yatta. O filme mostra a construção de uma difícil amizade entre os dois, apesar da liberdade de Abraham e da vida sitiada de Adra.
Perigo para gravar
O filme, uma coprodução da Palestina com a Noruega, foi filmado entre 2019 e 2023. Os jornalistas israelenses Abraham e Szor se uniram aos palestinos em sua causa para escrever sobre a violência e as remoções forçadas em Masafer Yatta durante quase cinco anos. Para o documentário, imagens filmadas nessa época são misturadas com vídeos de um período de 20 anos, retirados dos arquivos da comunidade, mostrando a transformação da região.
Durante a produção, o exército entrou duas vezes na casa de Adra e confiscou computadores e câmeras. Em entrevista ao New York Times, Abraham disse que viu Adra quase levar um tiro duas ou três vezes. Quando o documentarista palestino tentou documentar a casa de um vizinho sendo demolida, ele foi arrastado e espancado por soldados israelenses.
A maior parte do documentário foi filmada antes do ataque do Hamas a Israel, em 7 de outubro de 2023, e da subsequente resposta do exército israelense na Faixa de Gaza, que matou mais de 48 mil palestinos, segundo a ONU. Segundo os cineastas, o novo conflito tornou o filme ainda mais urgente para mostrar como a situação de opressão nos territórios ocupados é insustentável.
Para que esse filme pudesse concorrer a um Oscar, ele precisava seguir as regras da premiação e ser exibido em uma das seis maiores cidades dos Estados Unidos, ficando em cartaz por pelo menos sete dias, com pelo menos três sessões diárias – uma necessariamente no horário nobre entre 18h e 22h. Sem distribuição cinematográfica nos Estados Unidos, aliado histórico de Israel, No Other Land precisou seguir um caminho independente, conseguindo negociar exibições em quase cem cinemas diferentes e lotar várias sessões.
Apesar da indicação ao Oscar, alguns dos documentaristas nem sabem se vão conseguir ir até a premiação: a casa de Hamdan Ballal está com uma ordem de demolição, e os Estados Unidos não tem um protocolo para que habitantes da Cisjordânia tirem vistos para o país, fazendo com que esses cidadãos sob lei militar de Israel precisem viajar para a Jordânia para conseguir o visto.
O documentário foi exibido durante a 48ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e conseguiu distribuição cinematográfica em 24 países. Porém, ainda não há nenhum canal oficial para assistir ao filme no Brasil.