Os Beatles não tivessem se separado?
O caminho mais provável do quarteto nos anos 70 seria o rock progressivo, odiado tanto pela crítica quanto pelos punks.
Ricardo Alexandre
A música pop provavelmente teria tomado outros rumos, evoluindo mais na harmonia do que na base rítmica. “Da disco ao techno, todas as ondas que surgiram a partir dos anos 70 dão total ênfase ao ritmo”, diz o maestro e produtor musical Ruriá Duprat. “Mas, se os Beatles tivessem continuado tocando, talvez sobrasse espaço para um desenvolvimento harmônico mais complexo no rock.” De fato, depois de instituírem o mercado pop como o conhecemos hoje, John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr passaram a flertar com a arte de vanguarda de seu tempo, sem nunca abandonar sua marca registrada: canções irretocáveis, harmonias perfeitas, melodias inesquecíveis. Abbey Road, o último disco gravado pela banda, em 1969, no entanto, foi ainda mais fundo em arranjos intrincados e virtuosismo instrumental.
Duprat – que hoje organiza um tributo de artistas brasileiros ao quarteto de Liverpool – levanta a suspeita de que o grupo poderia ter se envolvido com o chamado rock progressivo, que, mesmo detestado pela crítica e pela geração punk, deu a tônica da cena musical na primeira metade dos 70. “Com certeza, eles caminhariam para as vertentes mais progressistas do rock, mas não estagnariam esteticamente. Dali a pouco, mudariam de novo.” O próprio John Lennon foi indagado sobre como os Beatles soariam após 1970. Sem muita paciência, ele declarou que bastava aos fãs pinçar as melhores músicas de cada um dos discos solo anuais dos quatro cavalheiros e montar seu próprio “novo” disco dos Beatles. Rita Lee, que também prepara um álbum de versões de clássicos do grupo, acha que essa sugestão “não daria nem para o cheiro”. “O barato musical dos Beatles, sem dúvida, eram as parcerias e competições ególatras entre Lennon e McCartney.
As carreiras solos de ambos diluíram-se pra caramba com as parceiras/esposas Yoko e Linda”, diz ela. Quanto à possibilidade de os Beatles migrarem para o progressivo, Rita lembra que foi o mesmo caminho tomado pelos Mutantes, numa manobra tão radical que incluiu até a sua própria demissão da banda. Por fim, Duprat diz que, inquietos como eram, dificilmente os Beatles durariam muito mais tempo: “Todo mundo tem um certo material intelectual para mostrar e, depois, tende a se repetir. Como eles nunca se repetiram em sua carreira, acho que não seguiriam adiante”. Talvez seja isso mesmo: o que é bom dura pouco.
O caminho mais provável do quarteto nos anos 70 seria o rock progressivo, odiado tanto pela crítica quanto pelos punks