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Parte 1: Das cantadas na Roma Antiga aos dilemas contemporâneos

A jornada do homem em busca do prazer começa no instinto de autopreservação dos genes. Mas no meio tem a aventura do descobrimento do próprio corpo e as vontades não ditas de experimentar novas formas de dar vazão ao desejo.

Texto: Marcia Kedouk | Edição de Arte: Fernando Pires | Design: Andy Faria | Ilustrações: Espaço Ilusório

E

stamos na Pré-História. Numa caverna, vemos objetos com desenhos e percebemos que, opa, eles estão transando. Papai-e-mamãe? Ela de quatro? Nada disso: ela por cima. Tem também uma escultura de pedra de uma mulher se masturbando, um vaso com a cena de um homem fazendo o cinco-contra-um. Ou seja: não tem nada de moderno na ideia de tirar o máximo possível de prazer durante o sexo. Fazemos isso basicamente desde os tempos em que a nossa espécie surgiu – e, provavelmente, antes, já que chimpanzés também são craques em posições sexuais e técnicas masturbatórias.

Mas vamos pular um pouco para a frente na história. Na Roma e na Grécia antigas, a masturbação era aceitável, como última alternativa de um leque de opções que começava em manter relações com a esposa e terminava em procurar alívio em escravos, mulheres de classes inferiores e prostitutas. Quem não era capaz de conseguir nenhuma das alternativas virava motivo de piada.

Fazer justiça com as próprias mãos só virou pecado na Idade Média, quando surgiu a crença de que o sêmen era esgotável. Portanto, os homens não deveriam desperdiçá-lo em ocasiões que não fossem para a procriação. Sexo solo atrás da moita? Nem em pensamento. Sobre o prazer feminino, então, ninguém falava.

Aí chegou o século 18, o Iluminismo, a era da razão. Quem apostou que fazer amor consigo mesmo seria, enfim, considerado um ato digno, ficou na mão. Sexo deixou de ser domínio público e virou assunto de doutores – e eles passaram a ditar as regras.

Para os médicos, gastar fluidos à toa era como deixar escapar a “energia vital”, o que tornava o corpo fraco e suscetível a uma série de males, de anemia a epilepsia, de tuberculose a cegueira e loucura. Como não se conheciam as causas de muitas doenças, a masturbação era a “virose” da vez. Está meio cansadão, indisposto, infeliz ou nervoso? Culpa dos seus dedos, que vivem se metendo onde são chamados.

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<strong>No dia em que a humanidade passou a pedir permissão para fazer o que os macacos faziam, a culpa bateu à porta do quarto.</strong>
No dia em que a humanidade passou a pedir permissão para fazer o que os macacos faziam, a culpa bateu à porta do quarto. (Espaço Ilusório/Superinteressante)

Para alguns filósofos, entregar-se completamente aos instintos sexuais, fosse a dois, fosse a um, era passar atestado de animalidade, de falta de domínio da razão. Só quando um médico austríaco chamado Sigmund Freud entrou na história é que ela voltou a se virar a favor da sexualidade. Já era século 20. Os gatilhos de muitas doenças tinham sido descobertos e não dava mais para colocar a culpa no desejo. Mas o estrago na mente das pessoas estava feito: as crenças arraigadas viraram bloqueios na cama.

E, como falar mais abertamente de coisas que fazemos na intimidade é algo relativamente recente – vem dos anos 50 para cá –, sentir-se à vontade com o corpo e os pensamentos mais libidinosos ainda não é uma tarefa fácil para todo mundo. Mas ler a respeito já é um bom começo. Veja a seguir.

Cinquenta tons de pinga

Fantasias sexuais podem funcionar como álcool e drogas, estimulando o cérebro a liberar dopamina, o hormônio do prazer, como acontece durante o ato sexual.

Imaginar uma cena equivale a fazê-la. Pelo menos para o cérebro. Um estudo da Universidade Emory, nos Estados Unidos, mostrou que a leitura de um romance ativa o lobo temporal esquerdo, envolvido no processamento das atividades motoras e sensoriais.

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Quanto mais intensa a imaginação, mais reações físicas e químicas, como a estimulação da produção de hormônios. Não é à toa que o livro Cinquenta Tons de Cinza levou muitas leitoras a buscarem na vida real mais experiências parecidas com aquelas descritas nas páginas.

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Como a trama conta a relação entre uma jovem submissa e um milionário dominador, as vendas de acessórios sadomasoquistas – para homens e mulheres – aumentaram em 35% nas sex shops em 2012, quando o livro foi lançado, de acordo com a Associação Brasileira das Empresas dos Mercados Erótico e Sensual. O sucesso motivou a criação de novas linhas de algemas, vendas, chicotes e lingeries de couro.

Pensar em amor e sexo ajuda a resolver problemas

Funciona assim: quando você imagina que está fazendo sexo, apenas uma região específica do cérebro, ligada ao prazer, é ativada. Quando pensa em amor – por exemplo, um jantar romântico –, as células fazem várias conexões diferentes, porque outras emoções estão envolvidas. Cientistas de duas universidades holandesas e uma alemã comprovaram a tese pedindo a 30 voluntários que imaginassem uma longa caminhada ao lado da pessoa amada. Outros 30 participantes deveriam pensar em sexo com alguém com quem não tivessem envolvimento.

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Em seguida, todos responderam a um teste cognitivo. O grupo dos românticos se saiu melhor nas questões criativas do que nas analíticas, enquanto a turma do encontro casual teve desempenho oposto: pontuou bem nas analíticas e mal nas criativas. Para os pesquisadores, os resultados mostram que treinar a atividade cerebral focada (como acontece quando pensamos em sexo) favorece a atenção aos detalhes, o que é uma boa quando surge a necessidade de encontrar soluções práticas para um problema. Já a cena amorosa completa ajuda na hora em que é preciso ter uma visão global e achar saídas criativas.

Como enlouquecer seu romano (ou romana) na cama

Confira as táticas sexuais da Roma Antiga – os versos a seguir foram escritos pelo poeta romano Ovídio, no século I d.C.

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1 • Não façais amor quando não tiverdes vontade
“O prazer que me é concedido por dever não me agrada; eu não quero que uma mulher me deva prazer. Quero ouvir palavras que traduzam a alegria que ela sente, me pedindo para ir mais devagar e me conter. Gosto de ver o olhar lânguido de uma amante que desfalece e que, esgotada, não quer ser tocada por um bom tempo.”

2 • Não vos apresseis
“Creia-me, não devemos apressar o fim da volúpia, mas alcançá-la aos poucos, por uma excitação progressiva.”

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3 • Aprendei, de uma vez por todas, onde fica o clitóris
“Quando encontrares o lugar onde ela gosta de ser tocada, que o pudor não te impeça de acariciá-la. Verás os olhos da tua amiga brilharem com um trêmulo fulgor, como o de raios de sol refletidos na água límpida. Seguir-se-ão os queixumes, um delicado murmúrio, doces gemidos e palavras próprias do amor.”

4 • Não chegueis primeiro
“Jamais queira, ao desdobrar mais tuas velas, deixar ficar para trás tua amiga, nem que te tome a dianteira. Deveis alcançar juntos a meta. A plenitude da volúpia é quando, vencidos os dois, homem e mulher jazem extenuados.”

5 • Conhece-te a ti mesmo
“Que cada mulher se conheça bem, que adote esta ou aquela posição conforme o seu corpo, pois a mesma postura não convém a todas. É de bruços que se devem mostrar as que estão satisfeitas com suas costas. A mulher pequena deve adotar a posição do cavaleiro. Se tuas coxas têm a beleza da juventude e tens seios impecáveis, o homem ficará de pé e tu, estendida no leito, perpendicularmente a ele. Há mil maneiras de provar os prazeres de Vênus; a mais simples e menos fatigante é ficar reclinada sobre o lado esquerdo.”

6 • Apagai algumas luzes
“Não deixe que a luz inunde de todo teu quarto: há muitas partes do teu corpo que são favorecidas pela meia-luz.”

Kama Sutra

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Para muitas filosofias orientais, o sexo é considerado um ritual sagrado. E conhecer diferentes posições sexuais não tem nada de sacana – é pura ciência. Veja algumas que oferecem maior controle dos movimentos e as que exigem maior esforço.

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Ela de quatro
Homens gostam de admirar o visual e de sentir que estão no comando. Além disso, nessa posição, a penetração pode ser mais profunda.

Na parede
O homem fica em pé, encostado na parede e com as pernas levemente flexionadas. Ela se encaixa no quadril dele, que a segura pelo bumbum.
A dificuldade aqui é sustentar o peso da mulher e ainda fazer os movimentos da penetração de forma digna.

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Cow Girl
Quando a mulher está por cima, pode controlar o ritmo e a profundidade da penetração. Quanto mais ela se inclina para a frente, maiores as chances de o púbis do homem roçar o clitóris, aumentando o prazer.

Contorcionista
Qualquer posição que exija preparo físico de bailarina, com a necessidade de estender bastante os músculos das pernas, cria dificuldades. Nesta, o homem deita de costas, a mulher agacha sobre ele e, com os joelhos e o dorso do pé apoiados na cama, deita totalmente para trás.

Ver vídeos eróticos pode interferir na sua vida sexual

O pornô mexe com a vida real por vários motivos. Um deles está relacionado aos neurônios-espelho, que fazem a gente sentir no corpo o que capta com o olhar. A ação deles fica mais evidente quando sentimos vontade de bocejar só de ver outra pessoa fazendo isso. Voltando aos neurônios-espelho: quando você assiste a muitos filmes eróticos, seu cérebro pode induzi-lo a se identificar com as estripulias na cama. Isso pode ser ruim ou bom.

O ruim é quando aparece a frustração ao perceber que não consegue reproduzir as ereções e as posições, os gritos e as encenações exageradas dos atores em cena (sem contar a comparação muitas vezes desleal de tamanhos de pênis, seios e bundas). Bom, frustração é sinônimo de esfriamento da libido. Para as mulheres, o efeito é ainda mais intenso.

<strong>A pornografia tem sua utilidade no relacionamento. Mas pode virar um adversário de peso quando você passa a achar mais excitante o que vê na tela do computador do que na cama. </strong>
A pornografia tem sua utilidade no relacionamento. Mas pode virar um adversário de peso quando você passa a achar mais excitante o que vê na tela do computador do que na cama. (Jan Stromme/Getty Images)

Um estudo das universidades da Califórnia e do Tennessee com 308 participantes entre 18 e 29 anos concluiu que quanto mais filmes desse tipo o namorado ou marido via, mais baixa era a autoestima da parceira. Tem a ver com o que concluíram cientistas da Universidade de Denver. Eles avaliaram a vida de 2.291 casais, sendo que 45% assistiam a filmes eróticos com o parceiro e 77% dos homens e 32% das mulheres viam pornografia sozinhos.

Quem nunca optava pelo cine privê estava mais feliz no relacionamento e se sentia sexualmente mais satisfeito do que o restante. O grupo que via esses filmes a dois apresentava mais predisposição para trair. Mas também era mais dedicado ao outro e tinha uma vida sexual mais ativa. E aí vem a parte boa.

Recorrer aos vídeos vez ou outra pode, sim, funcionar como pimenta no arroz com feijão. Uma pesquisa do IFOP (Instituto Francês de Opinião Pública) mostrou que, dos mil entrevistados, 90% dos homens e 60% das mulheres assistem a vídeos pornôs frequentemente. Os fãs do erotismo faziam mais sexo do que o restante dos avaliados.

Tocar o próprio corpo ainda é tabu para as mulheres

Dados da Pesquisa Nacional de Saúde e Comportamento Sexual, da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, mostram que 83% dos homens e 64% das mulheres com idades entre 20 e 24 anos se masturbam. Na faixa etária entre 30 e 39 anos, os números são parecidos: 80% do time masculino e 63% do feminino são adeptos do sexo solo. Entre os 25 e os 29 anos, mais mulheres tocam o próprio corpo regularmente.

<strong>Eles se masturbam mais. Elas, quando se dedicam ao sexo solo, sentem culpa ou vergonha.</strong>
Eles se masturbam mais. Elas, quando se dedicam ao sexo solo, sentem culpa ou vergonha. (Espaço Ilusório/Superinteressante)

As porcentagens ficam em 84% e 72%, o que não significa que o assunto deixa de ser tabu para elas. Entre 17 e 36 anos, até 25% das que relatam se masturbar sentem culpa ou vergonha ou acham que estão fazendo algo idiota. Além disso, 34% têm prazer sozinhas menos de uma vez por mês e 12,2% não encostam o dedo lá há mais de um ano. “Desde pequenos, os homens são incentivados a tocar o próprio corpo. Já as meninas aprendem que isso é feio e sujo”, diz o sexólogo e ginecologista Amaury Mendes Júnior, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

PERGUNTAS & RESPOSTAS

A masturbação pode ser considerada um vício?
Se ela impede que você faça uma atividade corriqueira, como se relacionar, trabalhar ou estudar, sim. “O compulsivo não necessariamente sente satisfação com a masturbação. Ele repete a prática várias vezes ao dia para tentar se livrar de uma emoção negativa, como angústia ou tensão.

E, depois do orgasmo, percebe que aquilo foi momentâneo e não resolveu o problema dele. Então, recorre ao ato novamente”, afirma o ginecologista e sexólogo Amaury Mendes Júnior, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Estudos apontam também que a tendência ao vício pode ser genética, o que explicaria por que alguns desenvolvem dependência (de sexo, masturbação, comida, álcool, drogas) e outros não. Pesquisadores acreditam que há menos receptores de dopamina no cérebro dos viciados ou que desequilíbrios químicos inibam a comunicação entre os neurônios envolvidos no processo.

O fato é que vício e prazer estão intimamente ligados, porque nascem em uma região cerebral chamada centro de recompensa: quando acionada – com sexo, masturbação, comida, álcool, drogas –, essa área libera a produção de dopamina, fazendo você querer mais e mais.
Seja como for, tocar os genitais traz benefícios extras, já que outros hormônios são produzidos. Com o estímulo, o hipotálamo mobiliza a glândula hipófise, que estimula testículos e ovários a produzirem testosterona. Ela desencadeia o desejo e estimula a produção de espermatozoides e sêmen. Na mulher, a hipófise comanda a produção de estrógeno e progesterona – moduladores da vontade de fazer sexo.

A ativação das glândulas faz crescer também a presença de cortisol, que acelera o metabolismo, e a adrenalina, que turbina os batimentos cardíacos, a temperatura, a respiração, a produção de suor e a vasodilatação. A coisa vai esquentando até aparecer o orgasmo, que é uma descarga da tensão. As taxas dos hormônios voltam aos padrões normais, mas as endorfinas são aumentadas e geram a sensação de bem-estar.

Quais as fantasias sexuais mais bizarras?

A capacidade humana de se excitar é infinita, mas alguns objetos do desejo chamam mais a atenção. Como estes três:

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Balão sexy
Os adeptos da tara por infláveis (inflatofilia) se dividem em dois tipos: os que estouram e os que deixam as bexigas intactas depois do “sexo”.

Carro safadinho
Existem pessoas que se excitam com automóveis, motos, robôs. O americano Edward Smith afirmou em 2008 que já fez sexo com mil carros.

Estátua caliente
Agalmatofilia é o termoque define quem tem tesão por estátuas, bonecos ou manequins de vitrine.

Por que fantasiamos sexo com estranhos?

Novidade. Seu cérebro gosta de novidade. E um novo parceiro sexual – ou a fantasia de que se está com um – é tudo de que ele precisa para se manter animado. Graças a um mecanismo que os cientistas chamam de Efeito Coolidge: quando um rato macho copula com a mesma fêmea, ele perde o interesse nela depois de um tempo.

Se a ratinha é substituída por outra, o bicho fica excitado novamente e volta ao sexo. Com os humanos, isso também acontece. As mulheres experimentam esse desejo, mas ele acomete mais os homens. Culpa do instinto ancestral de espalhar os genes entre o maior número possível de parceiras.

Como ter certeza absoluta de que uma mulher está fingindo orgasmo?

Não dá para saber ao certo, mas você pode ficar atento a algumas pistas. Tremores, por exemplo, são indícios de que o orgasmo chegou – para ambos os sexos. Como o ápice do prazer vem com uma carga máxima de adrenalina e, logo depois, uma de endorfina, que acalma os ânimos, os nervos e os músculos chegam a apresentar espasmos – como acontece quando você faz uma atividade física muito intensa sem ter condicionamento para isso e para de repente. As mulheres costumam ter contrações em toda a região pélvica, principalmente na vagina.

A lubrificação também ajuda a saber: se a área estiver seca, é provável que ela não esteja nem excitada. Bom, na falta da certeza do gozo alheio, vale lembrar que o fingimento pode ser uma demonstração de amor. É o que descobriu o economista Hugo Mialon, da Universidade Emory, nos Estados Unidos.

Ele analisou uma pesquisa inglesa com 16 mil pessoas sexualmente ativas e observou que, quanto maior o comprometimento entre o casal, mais chances de elas simularem que ficaram satisfeitas – tudo para não deixar o parceiro triste ou inseguro. Um estudo da Universidade de Missouri mostrou que uma em cada cinco mulheres que não têm orgasmo finge ter. Entre os homens, apenas um em cada 20 faz o mesmo.

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