"M.A.S.H."
Robert Altman – 1970
Honra ao mérito: É o mais anárquico dos filmes de guerra.
A sigla que dá nome ao filme vem de Mobile Army Surgical Hospital, um modelo de hospital móvel do Exército americano criado no fim da 2ª Guerra, mas que emplacou mesmo no conflito dos Estados Unidos contra a Coreia do Norte. Com os M.A.S.H., ficou possível ter um complexo médico bem equipado para cirurgias sempre próximo aos locais de combate – um sistema que permaneceu em uso pelos EUA até 2006. Esse ambiente de médicos-militares abrindo o peito de soldados entre a vida e a morte virou o cenário de um romance sobre as aventuras de um cirurgião do Exército na Guerra da Coreia, um livro que a 20th Century Fox resolveu transformar em filme. O problema é que ninguém queria dirigi-lo.
O roteiro passou pelas mãos de 15 diretores até chegar a Robert Altman, mais conhecido na época por seu trabalho em séries de TV. Ao bater os olhos na história, o cineasta viu ali uma oportunidade de expressar sua crítica ao belicismo americano, mostrando o Exército da forma mais anárquica, infame e engraçada possível. Os EUA estavam em guerra contra o Vietnã em 1970, e Altman tirou do filme qualquer referência à Coreia, para confundir propositalmente o público e forçar uma analogia com o Vietnã – o que desagradaria aos chefões conservadores da Fox. Como o estúdio estava ao mesmo tempo ocupado com duas grandes produções de guerra (Patton e Tora! Tora! Tora!), Altman fez de tudo para manter seu filme pequeno, de modo a não chamar a atenção dos produtores e assim preservar sua visão ácida e ter liberdade artística. Deu preferência a atores pouco conhecidos, terminou as filmagens antes do prazo e usou menos dinheiro do que tinha para gastar. Quando o estúdio se deu conta, já era tarde demais.
M.A.S.H. mostra um hospital militar onde os cirurgiões estão sempre bêbados ou transando com as enfermeiras. Um adolescente sul-coreano é requisitado pelos médicos para servir dry martinis, e um oficial linha dura é dopado e exposto em fotos pornográficas com as asiáticas. Em outra sequência, os doutores mimetizam o cenário de A Última Ceia, de Da Vinci, para o suicídio assistido de um médico com problemas de ereção. Quase nada disso estava no roteiro original do veterano Ring Lardner Junior, que se revoltou ao perceber que os atores ainda eram encorajados a improvisar suas falas. Por isso mesmo, muitas vezes os diálogos se embaralham – um toque realista do que seria um ambiente de guerra, intensificado pela fotografia em tom documental.
As sequências não têm uma linearidade aparente, e o trabalho de filmagem foi tão caótico que os atores principais – Donald Sutherland e Elliot Gould – chegaram a pedir a demissão de Robert Altman. Mas estavam errados. M.A.S.H. teve tanto sucesso de bilheteria que virou uma série homônima que fez história na TV americana, ao longo de 11 temporadas.