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A pílula anticoncepcional

Combatido a princípio até a prisão, o controle da natalidade acabou se impondo como uma das marcas registrada deste século. E um invento contribuiu decisivamente hora essa fantástica revolução no comportamento humano

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h11 - Publicado em 30 set 1987, 22h00

O nome de Malthus é muito conhecido em relação às controvérsias sobre a população terrestre que se iniciaram em fins do século XVIII; não o é tanto, porém, o de Joseph Towsend, que, alguns anos antes, a partir de uma viagem à Espanha, havia publicado um livro (A Journey Through Spain in the Years 1786 and 1787) em que reprodução humana e fome são apresentados como termos de um dilema insolúvel. ” Um apetite tem que regular o outro “, dizia.

A questão estava no ar, quando o clérigo inglês Thomas Robert Malthus (1766-1834) publicou, em 1798, seu ensaio sobre o princípio da população, nem que desenvolvia a célebre tese de que a humanidade se multiplica segundo uma progressão geométrica ( 1, 2, 4, 8, 16…), enquanto a produção de alimentos segue uma progressão aritmética ( 1,2,3,4,5…); uma crise alimentar global seria inexorável.

Malthus, que anos depois foi nomeado professor de economia política do colégio da companhia das Índias, não via saída para o dilema, pois a idéia de controlar os nascimentos era repugnante para suas crenças. O matrimônio tardio para os pobres ou a voluntária a abstenção do contato sexual eram seus únicos métodos aceitáveis. Sua aversão era compartilhada por uma grande maioria e não apenas de crentes, mas também dos que consideravam que sexualidade sem procriação era uma prostituição da mulher. Entre eles se encontravam as primeiras sufragistas e feministas. Outros, porém, inspirados por Malthus, advogava o controle da maternidade para as massas. Ficaram conhecidos com nome de neomaltusianos.

Em todo caso, até o fim do século XIX, a obscura e paciente promoção de alguns médicos e higienistas iniciou a popularização de certos métodos simples de contracepção. O mais conhecido foi o preservativo ou camisinha, concebido antes como um profilático contra a infecção do que como barreira contra a fecundação. Incômodo a princípio – era feito com tecido, pele ou tripas de animais – , o descobrimento do processo de vulcanização da borracha, em 1843, tornou-o mais sutil e barat. Em 1870, já era industrializado para venda.

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O método de obstruir o acesso ou ter é conhecido desde a Antiguidade egípcia, quando se empregavam excrementos de crocodilo e, posteriormente, compressas vegetais, emplastros de linho etc, tão inconvenientes quanto perigosos. Friedrich Adolph Wilde, um alemão, sugeriu, em 1833, fazer um molde descera do colo do útero, do qual se poderia obter uma espécie de preservativo de borracha que aderiria perfeitamente. A idéia desta capa cervical não teve muito êxito inicialmente, porém, em 1870, outro alemão, o Dr. Mensiga, inventou o diafragma, uma lâmina elástica que, ao cobrir a maior parte da parede vaginal, não precisava de ajuste prévio individual, o que contribuiu para sua rápida popularização.

Este e outros métodos incipientes seriam reclamados pela agitação social e demográfico que caracterizou as últimas décadas do século passado, devido à imigração, à industrialização e às colonizações, que se acentuam e se estendem prodigiosamente nos primeiros anos do século XX, agravadas de imediato pela Primeira Guerra Mundial.

O indubitável é que, desde o começo de nosso século, se vai plasmando uma preocupação universal pelos problemas do sexo e da população. No que se refere ao controle da natalidade, duas figuras femininas se destacam desde o início do século.

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Nascida em Edimburgo, Escócia, doutorado na universidade de Munique, Alemanha, Marie Charlotte Carmichael Stopes ( 1880-1958 ) era, aos 24 anos, uma reputada especialista em paleobotânica, graduada para investigar fósseis no Japão. Atraente e apaixonada, casou-se com um colega de profissão que se descobriu ser impotente. As ansiedades, ignorâncias e decepções daquela experiência – o matrimônio não consumado foi anulado depois – a levaram a investigar e logo escrever, embora ainda virgem e inexperiente, o que seria considerado um dos grandes manuais conjugais do século XX. A primeira edição de seu livro Married Love ( amor conjugal) vendeu imediatamente.

A autora recebeu uma infinidade de cartas solicitando ajuda e conselho. Aos 37 anos, voltou a contrair matrimônio com um aviador de 40 anos, Humphrey Verdon Roe, com quem publicou em 1918 seu segundo livro,Wise Parenthood ( paternidade Prudente) e a um guia prático de contracepção que foi recebido com fortes críticas. Apesar delas, Marie e seu marido fundaram, três anos mais tarde, a primeira clínica de controle da natalidade, em Londres. Ela dedicou o resto de sua vida a divulgar e lutar por suas idéias.

Menos literária mas não menos combativa e tenaz foi a norte-americana Margaret Higgins Sanger ( 1833-1966), que, em 1914, fundou a National Birth Control League dos Estados Unidos e, em 1916, abria em Brooklyn, Nova York, a primeira clínica para o controle da natalidade. A clínica foi fechada e sua fundadora presa por trinta dias. Margareth não se acovardou por isso: em 1921, fundava a American Birth Control League , sob cujo patrocínio se inaugurou o Sanger , uma nova clínica de Nova York, que não só sobreviveu como induziu o presidente da nova liga, James F. Cooper, a fundar uma companhia dedicada a fabricar diafragmas para mulheres, tornand-as independentes do fato de os homens usarem ou não preservativos.

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Uma nova incursão da polícia fechou a clínica em 1929, o que não fez mais do que aguçar a tenacidade de , que prosseguiu com suas campanhas e fundações. Sua incansável atividade a levou, em 1951, a visitar o renomado biólogo da Fundação Worcester de Biologia Experimental, para pedir-lhe que investigasse as possibilidades de um contraceptivo para, efetivo e seguro, para liberar as mulheres e as conseqüências da maternidade desordenada e irregular. Ele se chamava Gregory Goodwin Pincus ( 1903-1967), e tinha estudos e de agricultura, completados com genética e fisiologia da reprodução na Universidade de Harvard. Havia conseguido induzia a primeira parte no gênese, em coelhos da Índia, isto é, a reprodução sem concurso direto do macho.

A visita de Margareth Sanger, argumentando com cifras de sua larga experiência, causou tão profunda impressão em Gregory Pincus que este mudou radicalmente a orientação de seus estudos biológicos e,2 anos depois, investigava os efeitos esterilizadores dos hormônios esteróides nos mamíferos.

A busca de um contraceptivo oral remonta, antes de Pincus, a ensaios com um hormônio feminino chamado progesterona e aos procedimentos sobre sua obtenção. Um dos avanços biológicos do século havia levado justamente a um melhor entendimento do processo de fecundação, de seu mecanismo bioquímico. Dito simplesmente, uma mulher grávida não pode engravidar de novo porque o óvulo fecundado se rodeia de hormônios inibidores que impedem uma nova ovulação. Portanto, se fosse possível produzir algum tipo de gravidez falsa da mulher, mediante a ingestão de hormônios e inibidores, por exemplo, se evitaria a fecundação.

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A progesterona vinha sendo usado para desordens menstruais e a prevenção de certas formas de aborto, porém sua obtenção era muito trabalhosa e cara. Um professor de química do Instituto Rockefeller da Pensilvânia, Russel E. Marker, estudando um grupo de esteróides, descobriu um processo de obtenção da progesterona. Marker verificou também que esses esteróides existiam em grande quantidade em algumas variantes dos e antes yams, fruta de uma árvore silvestre mexicana. Vencendo não poucos obstáculos financeiros, Marker recolheu umas dez toneladas de yams e sintetizou 2.000 g de progesterona, que então custava US$80 o grama.

Com os doutores Chang e Rock na Fundação Worcester, Pincus descobriu os estrógenos e progestágenos , derivados da progesterona que mais inibiam a ovulação, e deles saiu a pílula anticoncepcional. Os primeiros ensaios, realizados em Porto Rico e Haiti, demonstraram sua eficácia. Uma larga série de modificações ocorreu desde então com sucessivos aperfeiçoamentos e correções dos efeitos secundários. O século XX havia reencontrado sua pílula reguladora da maternidade como uma de suas mais transcendentais invenções.

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