Hitler proibiu alemães de receber o Nobel – e criou uma alternativa nazista ao prêmio
O jornalista alemão Carl von Ossietzky ganhou a medalha da Paz enquanto estava preso num campo de concentração, mas morreu sem tocar no prêmio.

Adolf Hitler chegou ao poder na Alemanha, em 1933. Nos próximos anos, os nazistas passaram a controlar imprensa, universidades e instituições culturais, impondo censura rígida e perseguindo opositores. Para o Führer, qualquer órgão ou premiação internacional que não estivesse alinhado com o Reich era visto como uma afronta ao regime – e nem mesmo o Nobel, o prêmio mais famoso e prestigiado do mundo, escapou dessa lógica.
Em 1935, a Fundação Nobel premiou o jornalista alemão Carl von Ossietzky com a medalha da Paz. Ex-militar e pacifista, ele havia denunciado que a Alemanha estava reconstruindo em segredo seu poderio militar – uma violação ao Tratado de Versalhes (1919), o acordo de paz assinado após a Primeira Guerra Mundial que proibia o país de possuir aviões de combate e armamentos pesados.
As reportagens de Ossietzky revelaram acordos com fábricas de armas e treinamentos militares ocultos, o que lhe rendeu um processo por traição à pátria. O jornalista foi preso, enviado a campos de concentração e submetido a torturas que agravaram sua saúde já frágil.
Ao receber o anúncio de que havia ganhado o Nobel da Paz, Ossietzky já estava debilitado pela tuberculose na prisão. Hitler reagiu com fúria: proibiu que o jornalista deixasse a Alemanha para receber o Nobel (a maioria dos prêmios é entregue na Suécia; já a cerimônia para o da Paz é na Noruega). Ele também determinou que nenhum cidadão alemão poderia aceitar um Nobel dali em diante. Como alternativa, criou o Prêmio Nacional Alemão de Arte e Ciência, destinado a laurear feitos que servissem aos interesses do regime e reforçassem a propaganda do Reich.
O caso Ossietzky provocou mobilização internacional. Figuras como o físico Albert Einstein e os escritores H. G. Wells e Aldous Huxley apelaram por sua libertação, mas o governo nazista ignorou os protestos. Em 1936, o jornalista recebeu autorização excepcional para sair da prisão e se tratar em um hospital, mas continuou sob vigilância da Gestapo (a polícia secreta nazista). Ossietzky morreu em 1938, sem jamais ter tido permissão para comparecer à cerimônia em Oslo, tornando-se símbolo da perseguição intelectual promovida pelo nazismo.
A proibição teve impacto direto sobre o reconhecimento internacional da ciência alemã. Entre 1938 e 1939, três pesquisadores do país chegaram a ser premiados pela Fundação Nobel, mas foram impedidos de aceitar as medalhas.
Richard Kuhn recebeu o Nobel de Química em 1938 por suas descobertas sobre carotenoides e vitaminas. No ano seguinte, Adolf Butenandt venceu na mesma categoria pelo isolamento de hormônios sexuais como o estrogênio e a androsterona. Em 1939, Gerhard Domagk ganhou o Nobel de Medicina por demonstrar a ação antibacteriana das sulfonamidas, que abriram caminho para o desenvolvimento dos antibióticos modernos.
Eles só receberam as suas medalhas e diplomas após a Segunda Guerra. Ficaram, porém, sem o prêmio em dinheiro, que daria R$ 3 milhões em valores atuais.