Mapas , mercator
Mercator teve a ideia depois de ler a Geografia de Ptolomeu, um livro que começou a circular na Europa no século XVI.
Voltaire Schilling
Foi pensando no titã grego condenado por Zeus a carregar a abóbada celeste nas costas que Gerhard Kremer, o Mercator, chamou de atlas o conjunto de lâminas cartográficas que fez editar em 1569. Desde aqueles tempos, qualquer série de mapas passou a receber esse nome. Mercator teve a idéia depois de ler a Geografia de Ptolomeu, um livro grego do século II que começou a circular na Europa no século XVI. Por que, pensou, não se dedicar a projetar um supermapa que abarcasse tudo o que se sabia do mundo (o que era muito mais do que o que sabia Ptolomeu)? As notícias de novas rotas marítimas chegavam a toda hora aos portos da Europa. Depois das viagens de Colombo e de Vasco da Gama, o mundo conhecido se dilatara enormemente. Amsterdã, o maior ancoradouro da Holanda, não demorou a se tornar um notável centro de impressão de mapas. O país, tomado pelo dinamismo das navegações, logo assumiu a vanguarda daquelas edições.
Mercator viria a dar forma cartográfica àqueles achados. Se a natureza tinha lhe dado pais pobres – o pai granjeiro era também um sapateiro remendão da pequena Rupelmonde, na Bélgica de hoje –, o destino aproximou-o de um tio acadêmico bem-sucedido. Foi pelas mãos dele que ele conseguiu, com o nome latino Gerardus Mercator Rupelmundanus, o feito de graduar-se na Universidade de Lovaine.
Hábil em lidar e construir compassos, réguas e esquadros, Mercator logo guindou à posição de assistente do grande matemático Gemma Frisius. Sua consagração definitiva veio com o fornecimento de um conjunto de mapas terrestres e celeste ao imperador Carlos V, detentor do trono da Espanha e de boa parte da Europa.
Acusações de heresia, de ter simpatias pelo Protestantismo nascente, levaram Mercator à prisão em 1544. Ele foi posto em liberdade no mesmo ano, graças à ingerência dos colegas. Mas, sofrendo pressões da Inquisição, decidiu exilar-se na cidade alemã de Duisburg, em 1552. Foi lá que encontrou a paz necessária para levar adiante o que chamou-se de Projeção Mercator, uma autêntica revolução no campo da cartografia, apresentada em 1569.
A projeção realizava nada menos que a quadratura do círculo, isto é, transformava a esfera terrestre num plano retangular. No mapa-múndi, todos os oceanos e continentes se alinhavam, a partir do Equador, divididos em quadriculados com 24 traçados verticais e 12 paralelos. Hoje parece óbvio: nossos mapas são retangulares. Mas, na época, imagine a dificuldade de navegar num planeta esférico tendo como guia um mapa plano. As cartas de Mercator permitiram aos pilotos de mar alto fixar uma rota entre dois pontos com pequena margem de erro. Essa margem crescia nas proximidades dos pólos, pois a distorção é inevitável quando se converte uma esfera em retângulo (reparem que, nos mapas retangulares, a Groenlândia parece maior que o Brasil, o que não é verdade).
Encontrado o caminho das pedras para as novas cartas náuticas, os antigos mapas de navegação foram aposentados pelos capitães de alto curso e o método estabelecido por Mercator ganhou justa fama, facilitando como nunca a expansão ocidental. O cartógrafo morreu em 1594, sem usufruir dos lucros do seu trabalho. Quem realmente conseguiu ganhar dinheiro com o primeiro atlas foi um certo Jodocus Hondius, que adquiriu as lâminas dos herdeiros do autor e publicou 30 edições dele entre 1606 a 1640.