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O último dia de Pompeia

Asfixia no banheiro. Loucos por joias. Sexo com gladiadores. Histórias reais de vidas destruídas por um vulcão

Por Giselle Hirata
Atualizado em 31 out 2016, 18h25 - Publicado em 31 jul 2014, 22h00

Se o mundo fosse acabar, me diz, o que você faria? Quando o monte Vesúvio explodiu na manhã de 24 de agosto do ano 74, cada um em Pompeia reagiu de uma maneira. Enquanto chovia fogo sobre a cidade romana, houve quem se apressasse para salvar seus bens. Gases venenosos dobravam as esquinas e encontravam gente que preferiu se abraçar a correr. Quando a lava cobriu as ruas, sepultou o cadáver de uma dama na casa dos gladiadores.

Uma coisa é certa: ninguém ali nunca havia visto nada parecido. Literalmente. A última erupção no que hoje é a Europa tinha ocorrido 1.700 anos antes, na ilha grega de Santorini. Nem existia palavra para descrever vulcão em latim. Nas primeiras horas, as pessoas ficaram escondidas, esperando que tudo se acalmasse e fosse possível curtir o resto do verão no próspero balneário. Como o Vesúvio não dava trégua, cuspindo fumaça e pedras em seguidas explosões, alguns quiseram fugir. Tarde demais: os portões da cidade já estavam bloqueados e o mar revolto pela erupção. Ao final do dia, 80% dos 20 mil habitantes estavam mortos.

A partir das posições em que os mortos foram encontrados, das roupas que vestiam e do que traziam consigo, é possível reconstituir seus últimos momentos. Saiba o que eles fizeram quando o mundo acabou.

CHUVA DE PEDRA

No alto do Vesúvio surgiram nuvens que pareciam fogueiras. Logo o chão tremeu e o topo do vulcão explodiu feito uma tampa de panela de pressão. A cidade foi bombardeada por uma chuva de pedras. Sem noção do que fazer, as pessoas foram para casa esperando passar.

CORRER OU MORRER

Poucas vezes dá para escrever isso literalmente: foi um salve-se quem puder. Num instante, as praças e as ruas esvaziaram. Quem não morava por ali, tentou se abrigar como pôde – debaixo de arcos e cúpulas, dentro de bares e lojas no centro. Os mais espertos ou apavorados trataram de deixar a cidade.

SEM SAÍDA

Uma multidão tentou deixar Pompeia pela Porta Stábia, principal passagem na muralha da cidade, no lado sul. Se depararam com uma saída bloqueada por escombros. Morreram ali, soterrados e aglomerados.

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DINHEIRO NA MÃO É FUNERAL

Muitos cadáveres foram encontrados carregando dinheiro, relíquias e prataria. Uma mulher morreu do lado de fora de um hotel levando uma pilha de joias, incluindo um bracelete de ouro com a inscrição: “do mestre para sua escrava”.

CASAL SEPARADO

Um homem e uma mulher tentaram fugir juntos pela rua principal. Mais frágil, ela caiu primeiro. Sem forças, talvez envenenado pelo gás, o rapaz também desabou. Apesar do esforço, não conseguiu tocar a mão dela pela última vez.

FAMÍLIA E PROPRIEDADE

Pompeia era uma cidade próspera, residência de muitos romanos ricos. Estes se recusaram a abandonar suas casas – permaneceram ao lado da família e de seus bens, aguardando que tudo voltasse ao normal. Em uma mansão, uma mulher colocou suas melhores joias, abraçou duas crianças e esperou pelo pior.

RUMO AO MAR

Alguns atravessaram a Porta Marina para chegar ao mar aberto e, quem sabe, à salvação. Mas o tremor de terra que acompanha toda erupção deixou o mar extremamente revolto. O porto e os barcos foram destruídos pela força das ondas, que atingiam alturas impressionantes. O jeito era retornar à cidade ou morrer na praia – onde foram encontrados vários corpos.

LAVA DEVAGAR

A lava do Vesúvio não matou ninguém. Quando o magma chegou à cidade, a população já havia sido vítima de pedras voadoras, gases venenosos, incêndios, desabamentos e asfixia.

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UMA ÚLTIMA AVENTURA

Uma fofoca com 1.940 anos de idade: sabe a caserna dos gladiadores, atrás do teatro? Nem te conto o que acharam ali: o corpo de uma mulher rica e elegante. Tudo leva a crer que a nobre dama procurava uma aventura clandestina e foi surpreendida pela erupção.

MORTE NA LATRINA

O Vesúvio surpreendeu peões de uma obra em plena jornada de trabalho. Os pedreiros correram para um banheiro público e lá se trancaram. Vez ou outra abriam a porta para salvar a vida de um colega. Encheram o pequeno espaço e não deixaram mais ninguém entrar. A latrina os livrou dos bombardeios de pedras flamejantes, mas não foi capaz de salvá-los da asfixia.

UM DE CADA CINCO

Não deve ter sido fácil deixar a cidade: no meio de fumaça densa e chuva de cinzas, as pessoas correram sufocadas e cegas, tropeçando sobre mortos ou pisoteando vivos, que agonizavam e pediam ajuda inutilmente. Cerca de 20% da população conseguiu escapar.

CEMITÉRIO

Em meio ao pânico generalizado, alguns buscaram abrigo em jazigos e mausoléus de um cemitério ali perto. Uma mãe e uma filha tentaram se proteger em uma cova e acabaram morrendo soterradas. Famílias inteiras morreram ali, ao lado dos que há muito já tinham partido.

AJUDA DIVINA

Não é comum pensar nos antigos romanos como um povo muito religioso. No entanto, em vez de tentar fugir, muitas famílias preferiram ficar e rezar. Acabaram morrendo abraçados ou ajoelhados, em posição de reza, talvez pedindo clemência.

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DE CENÁRIO DE TRAGÉDIA A MUSEU EM CÉU ABERTO

As lavas do Vesúvio cobriram Pompeia de uma maneira que após um tempo as pessoas nem conseguiam mais saber onde ela ficava. Os habitantes do vilarejo medieval que surgiu no local não faziam ideia de que viviam sobre um tesouro arqueológico. As ruínas foram reencontradas por acidente em 1599. Foram séculos de escavação até que a cidade viesse à tona, conservada pela ação das cinzas e da lava. Ironicamente, a tragédia que matou Pompeia permitiu que ela vivesse para sempre, congelada no tempo.

 

 

FONTES: Pedro Paulo Funari, professor do Departamento de História e do Laboratório de Arqueologia Pública da Unicamp e autor do livro A Vida Cotidiana na Roma Antiga e Grécia e Roma; Pompéia – Através dos Tempos, de Richard Platt; Life and Death in Pompeii and Herculaneum, de Paul Roberts.

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