Voltaire: “Se Deus não existisse, seria necessário inventá-lo”
Inimigo das autoridades, ele foi preso várias vezes - e escreveu mais de 2.000 obras, entre livros, peças e panfletos políticos
Corria o ano de 1717 e o reino da França estava sem seu monarca. O extravagante Luís 14 tinha morrido dois anos antes, e o trono ficou vago: seu neto, o futuro Luís 15, ainda era jovem demais para assumir e tinha de esperar a maioridade para ser coroado. O poder passou a ser exercido por um regente, e um ácido escritor parisiense publicou alguns versos satirizando o governo provisório. Mas a arbitrariedade continuava: François-Marie Arouet acabou perseguido e preso na temida fortaleza da Bastilha. Quando recuperou a liberdade, Arouet já havia adotado o pseudônimo que logo ficaria famoso: Voltaire.
Os 11 meses passados na cadeia não foram perdidos. Voltaire dedicou as horas de tédio a trabalhar em Édipo, sua adaptação da obra de Sófocles que viraria um sucesso de crítica nos palcos de Paris. Foi o sinal de que a carreira de escritor e dramaturgo podia ir adiante, apesar do descontentamento que causava nas autoridades. Desde cedo, o pequeno François-Marie apostou na literatura. Escreveu mais de 2 mil livros e panfletos políticos. As opiniões fortes provocaram várias prisões e exílios: em 1726, parou outra vez na Bastilha após brigar com um nobre. Temendo ficar na prisão por tempo indefinido, propôs às autoridades um desterro na Inglaterra como pena alternativa. O período nas ilhas britânicas o colocou em contato com as ideias de John Locke. Voltaire já era um crítico dos reis arbitrários que governavam a França e também da usura da Igreja. Agora, cada vez mais defenderia a liberdade de expressão, o direito a um julgamento justo e a tolerância religiosa — além da separação entre o governo e a Igreja.
Voltaire foi um dos impulsores do chamado “despotismo esclarecido”: sem se opor diretamente aos reis, sustentava que o monarca precisava se cercar de pensadores para governar segundo a razão. Enquanto esteve exilado, chegou a atuar como conselheiro de Frederico 2º, rei da Prússia. Retornou a Paris após duas décadas para a estreia do que viria a ser sua última peça. Morreu logo depois, mas suas ideias duraram o bastante para estar na linha de frente da Revolução Francesa, 11 anos mais tarde.