Caçar para proteger: como a prática pode ajudar o meio ambiente
Em vez de ameaçar a natureza, a caça pode ser um eficiente instrumento de gestão ambiental.
Numa época em que a conservação da natureza é um tema central em nossas vidas, a caça gera inquietação em muitas pessoas, principalmente naquelas que vivem em centros urbanos. Para essa parcela da população, caçar é sinônimo de destruição da fauna, uma espécie de esporte macabro sem nenhum propósito a não ser o de aniquilar a vida de diversas espécies de animais, contribuindo para destruir o pouco que resta da diversidade de vida no planeta.
O que boa parte dessas pessoas não sabe é que, em vez de ameaçar a natureza, a caça tem servido como um eficiente instrumento de gestão ambiental em diversos países. Desde que regulamentada e fiscalizada pelos órgãos públicos, ela pode garantir o desenvolvimento sustentável de reservas ambientais e controlar populações de diversas espécies animais.
Afinal, a grande ameaça à sobrevivência da fauna silvestre não é a caça amadora, mas a expansão das fronteiras agrícolas. A utilização de reservas naturais para a agricultura tende a destruir os habitats das espécies. Nesse cenário, a caça contribui diretamente para a proteção do meio ambiente, uma vez que representa uma alternativa de uso sustentável da natureza, gerando recursos para sua conservação. Com o pagamento de taxas específicas durante o licenciamento do caçador e com o arrendamento de áreas naturais para essa prática o governo pode investir na proteção ao meio ambiente.
Não é à toa que em regiões com gestão ambiental rígida, como na Europa, a caça vem sendo praticada há centenas de anos, sem ameaçar a extinção das espécies. Na América do Sul, países como Chile, Uruguai e Argentina conseguiram proteger sua fauna ainda que a caça seja praticada desde a colonização. Os chamados cotos de caza argentinos, fazendas de caça, atraem milhares de turistas para o país vizinho.
Nos Estados Unidos, a caça movimenta cerca de 25 bilhões de dólares segundo dados da revista inglesa The Economist. E a arrecadação de impostos incidida sobre os caçadores, a indústria e o comércio associados à caça, é destinada à manutenção e ampliação dos chamados “refúgios naturais de vida selvagem”, de acordo com a lei americana Pitman-Robertson e Ducks Unlimited. No total, caçadores e pescadores americanos contribuem com mais de 75% dos recursos destinados a programas de conservação da vida selvagem.
No Brasil, o Estado do Rio Grande do Sul é um bom exemplo de como a caça organizada pode proteger nossas reservas naturais. No final do século XIX, os solos de várzeas do Estado totalizavam 5,3 milhões de hectares, dos quais não devem restar mais que 40%, seriamente ameaçados. O arrendamento ou aquisição dessas áreas por caçadores tem ajudado a diminuir o ritmo da devastação, tornando-se uma alternativa econômica à agricultura para os proprietários rurais.
Antes de cada temporada de caça amadora, a Fundação Zoobotânica do Estado faz pesquisas sobre a fauna e encaminha os resultados ao Ibama. Com esses dados em mãos, o Ibama tem como dizer quais espécies de animais podem ser liberadas e estabelece as quotas máximas de abate dentro de áreas delimitadas. Além da fiscalização federal exercida pelo Ibama, o Estado criou o Batalhão de Polícia Ambiental e suas unidades municipais, as Patrulhas Ambientais, que garantem que a fauna não será ameaçada. Isso para não falar da fiscalização dos próprios proprietários rurais – que dependem dessa conservação para que suas terras possam, no futuro, continuar recebendo caçadores. Afinal, não existe caça sem fauna protegida.
Infelizmente, o Rio Grande do Sul é uma exceção no Brasil. Nos demais Estados do país, a caça amadora é proibida desde 1981. E, como você já deve ter notado, essa proibição não tem garantido o respeito à fauna silvestre dessas regiões. Se a caça amadora fosse legalizada nesses Estados, poderia ser mais fácil (até financeiramente) manter o que ainda resta da diversidade vegetal e animal brasileira.
Numa sociedade cada vez mais urbana e distante da natureza, poucas pessoas estão tão próximas do nosso patrimônio natural quanto o caçador amador. É essa convivência que o torna um dos mais ferrenhos inimigos da caça clandestina e o primeiro a reivindicar melhor fiscalização e controle da nossa fauna. Afinal, ele sabe que a caça amadora é uma atividade sadia, lucrativa e uma das únicas formas realistas de garantir, a longo prazo, a conservação da biodiversidade do planeta.