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Pimp my Olimpíada

Hockey sobre a grama e pentatlo moderno estão dentro. Surfe e beisebol estão fora, mesmo sendo muito mais populares. Conheça a falta de critérios do Comitê Olímpico - e veja os esportes que merecem entrar

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h08 - Publicado em 1 out 2012, 22h00

Cristine Kist

Kelly Slater é um atleta de ponta. O americano começou a competir ainda criança. Aos 20 anos, foi o mais novo a ganhar um campeonato mundial de surfe, e aos 39, o mais velho. Acumulou 11 títulos. Já participou de inúmeros filmes e seriados, estampou capas de revistas e deu nome a um videogame. Publicou duas autobiografias e namorou Pamela Anderson e Gisele Bündchen. Mas o obscuro Govinda Billimogaputtaswamy tem uma coisa que Slater jamais terá: uma medalha olímpica. Billimogaputtaswamy ganhou um bronze com o time indiano de hockey sobre a grama de 1972 e, portanto, já faz parte da história olímpica. Slater, não.

Mas, afinal, por que alguns esportes obscuros fazem parte da Olimpíada e outros muito mais populares vivem às margens dos Jogos? A resposta está numa soma de fatores: regras do Comitê Olímpico Internacional (COI), que podem mudar a cada edição; pressões políticas; dificuldades técnicas nas cidades-sede – não há praia para surfar em Londres, por exemplo -; e influência do marketing esportivo.

Não é por falta de vontade que o surfe nunca esteve nos Jogos. Há quase um século, em 1920, o havaiano Duke Kahanamoku, pai do surfe moderno, já defendia sua inclusão no programa olímpico. Além de surfar, Kahanamoku também ganhou 5 medalhas olímpicas em natação. Foi um Michael Phelps do início do século 20, só que mais versátil. Era empresário, ator e foi um dos precursores do vôlei de praia. E aparecia em fotos com roupas de banho provocativas para a época. Mas sua popularidade não bastou para levar o surfe às Olimpíadas.

No início dos anos 90, a Associação Internacional de Surfe (ISA, na sigla inglesa) criou um Comitê do Surfe Olímpico. O lobby foi tamanho que o octagenário João Havelange, então membro do COI e presidente da Fifa, recebeu o inusitado título de “embaixador do surfe”. Explica-se: embora não fosse surfista, Havelange participara de duas Olímpiadas como jogador de polo aquático nos anos 50. “Contatamos o senhor Havelange, e ele foi muito gentil ao escrever uma carta defendendo com firmeza a inclusão do surfe nos Jogos. Mas o processo para inclusão é complicado, longo e muito frustrante às vezes”, conta o argentino Fernando Aguerre, presidente da ISA desde 1994.

Como o COI decide
Das modalidades que serão disputadas em Londres, apenas 4 sempre fizeram parte das Olimpíadas: atletismo, natação, esgrima e ginástica artística. Algumas saíram e voltaram, como o tênis e agora o golfe, e outros saíram para nunca mais voltar, como o cabo de guerra e o tiro ao pombo.

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Para esporte entrar para os Jogos, o primeiro passo é ter uma federação internacional reconhecida pelo COI. Mas isso não garante nada: até a sinuca e o bridge (sim, o jogo de cartas) têm federações reconhecidas e, teoricamente, podem se candidatar a uma vaga.

A decisão do COI acontece 7 anos antes de cada edição dos Jogos, quando seus 115 membros se reúnem em alguma parte do mundo para votar pela retirada e inclusão de esportes. Os votos são dados com base num relatório preparado pelo próprio Comitê, que leva em consideração a história olímpica do esporte, sua universalidade, sua popularidade entre os telespectadores, suas restrições logísticas, sua ética, seu trabalho no combate ao doping… Ou seja, como quase tudo conta, deixa de haver parâmetros claros.

“A escolha é mesmo subjetiva. No fim das contas, os votos dos membros são guiados por um relatório escrito pela Comissão do Programa Olímpico sob influência do presidente do COI”, diz Jean-Loup Chappelet, autor do livro The International Olympic Committee and the Olympic System (“O COI e o Sistema Olímpico”, sem versão brasileira).

Há alguns anos, o COI estabeleceu um limite máximo de 28 esportes por Olimpíada com a justificativa de que seria inviável organizar mais que 28 eventos e hospedar mais que 10 mil atletas na vila olímpica. Mas Chappelet questiona esse critério. “Na verdade o tamanho dos jogos – número de atletas, comitês olímpicos nacionais, profissionais da imprensa – não depende diretamente do número de esportes, já que alguns esportes têm poucos atletas e não precisam de instalações muito caras, como o taekwondo”, diz Chappelet. Um dos poucos critérios objetivos é o que exclui todos os esportes a motor. Mas até para isso já houve exceção: em 1908, 3 corridas de motonáutica fizeram parte dos Jogos.

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Competição desleal
Você provavelmente nunca ouviu falar do cróquete – que não tem nada a ver com o críquete. Foi exatamente sua obscuridade a razão para que essa espécie de minigolfe com arcos no lugar de buraco fosse excluída dos Jogos após sua única participação, na Olimpiada de Paris, em 1900. Sua bilheteria foi de um único ingresso vendido.

Olimpíada é audiência. Quanto mais visibilidade tiver um esporte, mais popular ele ficará. E, quanto mais popular ficar, mais dinheiro receberão as federações. “Governos tendem a incentivar com mais recursos as modalidades olímpicas. A visibilidade dos Jogos também é importante para atrair patrocinadores para as modalidades e seus atletas”, diz Thiago Mansur, presidente do Instituto Brasileiro de Marketing Esportivo. Isso cria uma disputa fora de campo entre os esportes que disputam uma vaga.

Se popularidade fosse tudo, o Wii Sports seria modalidade certa nas próximas Olimpíadas, com seus quase 70 milhões de praticantes. Mas o fato é que isso não basta. Vejamos o caso do pentatlo moderno. Na reunião do COI em 2005, ele esteve na lista de possíveis cortes. Afinal, não é dos esportes mais populares. Mas ele foi salvo por duas razões que pouco têm a ver com mérito ou com o potencial de marketing. Quanto menos atletas uma modalidade envolver, mais barata será sua organização. E mais. Foi inventado pelo barão de Coubertin, o pai das Olimpíadas Modernas. E isso lhe dá status. Quem foi então rebaixado? O softbol e o popular beisebol – um dos termos esportivos mais buscados no Google de 2004 a 2010.

Já o rugby passou 92 anos longe das Olimpíadas, mesmo sendo um dos esportes mais populares do mundo. São 3,7 milhões de jogadores, e a Copa mundial de 2011 teve mais de 4 bilhões de telespectadores, somando audiência de todas suas partidas. Sua federação precisou de 4 décadas para convencer o COI a ressuscitá-lo. O retorno será no Rio. “Sem dúvida alguma, a partir de agora, teremos uma divulgação muito mais ampla, muito maior. Muda também a maneira como é encarado o rugby. O público passa a aceitar mais o esporte, que ainda sofre o preconceito de ser violento”, diz Virgílio Neto, gerente de seleções da Confederação Brasileira de Rugby.

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Justo? Não é o que acha a Federação Internacional de Patinação (Firs, da sigla francesa). “O COI havia divulgado a intenção de introduzir novas modalidades de caráter universal, praticadas igualmente por homens e mulheres e com apelo ao público jovem”, diz Simona Mercuri, porta-voz da Firs. “A patinação de alta velocidade tem mais de 15 milhões de fãs, campeonatos mundiais femininos e masculinos em mais de 50 países. Sua exclusão em favor de esportes como golfe e rugby nos deixou chocados.”

Podia ser pior. A patinação ao menos está na lista de candidatos a entrar para os Jogos de 2020, junto ao caratê, squash, kung fu, wakeboard e escalada.

Quanto ao surfe, nem isso. Se algum dia tiver chance, será só a partir de 2024. Contra ele há um evidente problema logístico. Não bastaria as cidades-sede estarem próximas ao mar. O mar precisaria de ter boas ondas. Que tal ondas artificiais? O COI não gosta. Por mais popular que seja e por mais apelo que tenha entre jovens, o surfe está longe de vencer a disputa olímpica. Enquanto isso, Kelly Slater terá de se contentar com suas modelos internacionais.

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Os injustiçados
As modalidades que poderiam entrar para os jogos

Skate
Federações nacionais: 134

Por que merece entrar: há cerca de 40 milhões de skatistas no mundo, e o apelo entre jovens é enorme. No ano passado, 37 milhões de americanos assistiram aos X Games, maior evento de esportes radicais do mundo e cujo carro-chefe é o skate. A transmissão ao vivo foi para outros 192 países.

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Automobilismo
Federações nacionais: 133

Por que merece entrar: Porque automobilismo também é esporte. Que o diga os gregos: assim como o lançamento de dardo e a luta greco-romana, o automobilismo estava nas Olimpíadas da Grécia Antiga. As provas eram disputadas num circuito oval de 780 metros – a diferença é que se usavam cavalos no lugar do motor. Para a máquina não definir as provas, basta todos usarem carros (ou karts) iguais.

Beisebol
Federações nacionais: 119

Por que merece entrar: Ele nunca deveria ter saído. O beisebol esteve presente nos Jogos de Pequim, em 2008, e em outras 6 ocasiões. Tem 35 milhões de praticantes no mundo e ele é extremamente popular em 3 potências olímpicas: Cuba, Japão e EUA. Ainda assim, acabou afastado de Londres.

Futebol Americano
Federações nacionais: 182

Por que merece entrar: É o esporte mais popular dos EUA, a maior potência olímpica. E é também o mais rico: 12 equipes da Liga Nacional Americana estão entre os 50 times mais valiosos do mundo – de todos os esportes. A final do SuperBowl teve 111,3 milhões de espectadores neste ano.

Para saber mais
The International Olympic Committee and the Olympic System
Jean-Loup Chappelet, Routledge, 2008.

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