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Própolis faz bem mesmo? Veja o que a ciência tem a dizer

Pesquisas já comprovaram que essa substância produzida pelas abelhas ajuda o sistema imunológico humano. Mas ela pode ir além disso

Por Sílvia Lisboa e Tatiana Reckziegel, de SAÚDE
Atualizado em 17 jul 2023, 15h14 - Publicado em 27 jul 2017, 15h51

Na rotina agitada de uma colmeia, a saúde é uma das prioridades do grupo. Por isso, as abelhas gastam boa parte da sua energia coletando resinas na vegetação ao redor para produzir um poderoso remédio, a própolis.

As operárias vedam todas as frestas com esse preparado para aproveitar o melhor de suas propriedades físicas e biológicas.

A própolis isola o ambiente interno a fim de manter a temperatura ideal, impedir a entrada de vento e chuva e blindar a área contra bactérias, vírus e fungos capazes de colocar em risco a vida dos insetos.

O ser humano, esperto, notou há séculos que poderia tirar proveito do composto em nome do seu próprio bem-estar. Desde o Egito antigo ele é utilizado como antisséptico, no tratamento de feridas e inclusive na conservação dos corpos.

O famoso ritual de mumificação, aliás, guarda semelhanças com o que é praticado ainda hoje pelos enxames.

“Se não é possível remover uma abelha morta de dentro da colmeia, as outras a embalsamam para preservar a saúde de todas”, revela o biólogo e imunologista José Maurício Sforcin, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Botucatu, no interior de São Paulo.

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Foto close-up de duas abelhas polinizando em flor rosa
(Scott Spakowski/Getty Images)

A ciência da própolis

Mesmo com um histórico respeitável de uso, que lhe rendeu o posto de medicamento natural, a própolis só entrou pra valer na mira da ciência nos últimos 20 e poucos anos – e isso se deve, em parte, ao seu crescente apelo popular.

O consumo mundial gira em torno de 2,3 mil toneladas por ano, de acordo com levantamento feito pela Market Research Future.

O Brasil ocupa um lugar de destaque nessa história. Somos o terceiro maior produtor da resina, atrás apenas da Rússia e da China. Aqui a produção de própolis dura o ano inteiro.

Uma vantagem e tanto, se considerarmos que, em outros climas, as abelhas só fabricam o preparado no verão e na primavera.

Além disso, uma das espécies de abelha mais comuns em terras brasileiras, a Apis mellifera, é uma excelente produtora e, de quebra, super-resistente.

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O Brasil também é a bola da vez por causa das variedades que abriga e coloca no mercado: são 13 já catalogadas, divididas em três categorias até o momento. Além da clássica, de coloração marrom, existem as versões verde e vermelha, exclusivas daqui.

Cada tipo tem uma composição química distinta. “Por definição, própolis é um material que as abelhas produzem usando a própria cera e resinas de diferentes plantas”, descreve o biólogo Masaharu Ikegaki, professor da Universidade Federal de Alfenas, em Minas Gerais.

Ou seja, o que muda na constituição são os ingredientes obtidos na vegetação próxima às colmeias. Desse modo, a diversidade botânica faz com que as propriedades terapêuticas variem de uma versão para outra.

Como a própolis age contra bactérias

Se você já usou própolis alguma vez na vida (seja via spray, seja por gotinhas diluídas em água), é bem provável que tenha sido para aliviar alguma dor ou infecção na garganta. E tem fundamento.

Estudos clássicos da década de 1990 mostraram que a substância combate bactérias responsáveis por doenças nas vias respiratórias. Até as bactérias do estômago saem perdendo.

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Um experimento feito por cientistas turcos ano passado constatou que o extrato de própolis é capaz de inibir o crescimento da Helicobacter pylori, causadora de gastrite, úlcera e câncer de estômago.

O poder antimicrobiano dessa resina brilha também contra a cárie dental. Em alguns trabalhos, ela inclusive superou estratégias convencionais para coibir a reincidência da bactéria.

“A própolis controla o micro-organismo inibindo os chamados fatores de virulência, isto é, os polissacarídeos, que colam a placa bacteriana, e os ácidos, que desmineralizam o dente”, explica o farmacêutico Pedro Luiz Rosalen, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Assim, a prevenção do problema tende a ser mais duradoura.

Site_JuventudePele
(Jonathan Storey/Getty Images)

O efeito da própolis na cicatrização da pele

O uso da própolis sobre a pele é outra aplicação das antigas que deixou de ser considerada mera simpatia de vovó.

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Em estudo realizado com pessoas internadas na Unidade de Queimados do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, no interior paulista, um gel à base da resina se mostrou bastante proveitoso para a recuperação da pele.

Na experiência, o produto desenvolvido pela farmacêutica Andresa Berretta, gerente de Pesquisa e Desenvolvimento da empresa Apis Flora, foi comparado com uma pomada tradicionalmente empregada em queimaduras.

Ao final, o gel de própolis obteve o menor tempo de cicatrização. “Ele apresenta um potente efeito analgésico, anti-inflamatório e cicatrizante”, resume Andresa. A renovação mais rápida da derme é atribuída aos flavonoides do composto, que contraem o espaço da lesão e estimulam a formação de novas células.

Por falar em pele, aqueles hóspedes indesejados que adoram se instalar nela e em outros tecidos do corpo, os fungos, que se cuidem. Surgem novas evidências de que a própolis bota esses micro-organismos para correr.

Em análises de laboratório, pesquisadores do Irã testaram a resina ante outros extratos herbais e antibióticos em amostras de cândida, fungo reconhecido por encrencas na pele, na boca e na vagina.

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O saldo foi positivo para a própolis, embora ainda seja preciso validar os resultados em seres humanos.

Até pouco tempo, os cientistas não sabiam como a própolis derrotava esse bando de micróbios. Mas uma descoberta brasileira esclareceu parte da questão.

Ao colocar o produto das abelhas em contato com exemplares de cândida, um grupo de pesquisadores de várias instituições observou que ele induz a apoptose (uma espécie de suicídio) das células do fungo. Em outras palavras, a própolis ativa uma armadilha para o inimigo não se alastrar.

Os compostos fenólicos presentes na resina, em especial os flavonoides, merecem destaque no papel de prevenção e combate a inflamações e infecções. Isso porque anulam radicais livres, moléculas que, em excesso, fragilizam o organismo.

Todos os tipos de própolis possuem essa ação antioxidante, mas a carga das substâncias pode variar bastante de um tipo de extrato para outro.

No páreo entre as variedades conhecidas, a própolis verde é a que mostrou ter o maior potencial antioxidante até o momento. Talvez isso explique um achado recém-divulgado por estudiosos da Universidade de Kyushu, no Japão, e do Hospital da Província de Qinghai, na China.

A própolis verde brasileira, como é conhecida internacionamente, seria capaz de proteger os neurônios. Ao reduzir o estresse oxidativo no cérebro, levanta-se a hipótese de que ela ajude a nos resguardar de males como o Alzheimer.

Epidemiologista em traje de proteção, máscara e óculos trabalha com cotonetes de pacientes para detectar Covid-19.
(anyaivanova/Getty Images)

A própolis e o sistema imunológico

De fato, uma das proezas mais estudadas das própolis marrom, verde e vermelha é a capacidade de impulsionar o sistema imune. Não existe um consenso sobre qual componente é responsável por isso, mas tudo leva a crer que ocorre uma interação entre um mix de substâncias da resina e dois tipos de células de defesa, os macrófagos e os neutrófilos, que fazem uma faxina pelo organismo.

“As pesquisas mostram que há um aumento na produção de anticorpos e da atividade de células envolvidas na resposta imunológica em animais e seres humanos”, conta o professor Sforcin.

Esse apoio à imunidade tem outra atuação nada desprezível. O extrato de própolis apresenta propriedade anti-inflamatória sem os efeitos colaterais dos medicamentos para essa finalidade. “É uma ação diferente de tudo que está no mercado hoje”, afirma Rosalen.

“Quem tem artrite reumatoide ou lúpus, por exemplo, não pode utilizar anti-inflamatórios por tempo prolongado devido ao risco de problemas renais, gástricos… A própolis poderá ser uma alternativa no futuro.”

É claro que as pesquisas nesse contexto precisam avançar muito antes de o composto virar prescrição médica. Mas os resultados até aqui animam.

Agora, o campo mais promissor de pesquisas com própolis envolve seu poderio anticâncer. Ele é alvo de um número ascendente de estudos feitos com culturas de células em laboratórios de diversos cantos do planeta.

Os experimentos revelam que o produto das abelhas inibe o crescimento de células cancerosas e até ajuda a reduzir a extensão de tumores de mama, fígado, próstata, pulmão, entre outros.

Um dos trabalhos que mais chamam atenção na área foi desenvolvido pela patologista Yahima Frión, da Universidade de Havana, em Cuba, numa parceria com a equipe de Sforcin, da Unesp de Botucatu.

Células de um tipo de câncer de pulmão foram incubadas com a própolis verde brasileira. Nas primeiras 48 horas de contato, o extrato evitou a proliferação e também aumentou a taxa de apoptose das unidades doentes.

Yahima, porém, é cautelosa quanto às conclusões. “A própolis tem potencial para melhorar a qualidade de vida de pessoas com câncer. No entanto, são necessários estudos em pacientes com a condição para comprovar o benefício”, ressalta.

Pelo andar da ciência, é provável que, no futuro, o extrato da substância renda princípios ativos contra a doença e que sirvam de alternativa a agentes quimioterápicos.

Na Universidade Médica da Silésia, na Polônia, estudiosos observaram que amostras de tumor de próstata são sensíveis à ação da própolis verde brasileira – ela estimulou a morte das células defeituosas sem afetar as sadias.

Durante as análises para investigar os ingredientes por trás do benefício, os experts identificaram três substâncias anticâncer mais promissoras: o ácido cafeico, o artepillin C e a galangina, nomes complicados que devem ganhar os holofotes no meio científico daqui em diante.

O próximo passo é isolar cada um deles, testá-los novamente e, se o resultado for positivo, pensar na criação de um fármaco a ser avaliado em gente de verdade.

Embora boa parte das indicações da própolis careça de mais chancela científica e de testes clínicos – a última etapa necessária para uma substância virar um tratamento médico confiável -, muitos países já fazem uso massivo da resina na prevenção de doenças.

“Os japoneses a consomem como profilático diariamente para combater os radicais livres”, ilustra o farmacêutico Jairo Bastos, professor da Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto.

Na Romênia, a apiterapia – uso terapêutico de produtos da abelha – está colada à cultura do país. A capital Bucareste abriga, desde 1984, o primeiro centro clínico de apiterapia do mundo. Lá, o extrato de própolis tem status de medicamento.

Própolis: remédio ou alimento?

No Brasil, o produto é classificado como um alimento funcional. Por isso, não existem dosagens estabelecidas de quanto é indicado consumir. Estudos apontam, porém, que 30 gotas de extrato por dia são o suficiente para fortalecer o organismo e prevenir chabus.

Se uma dor de garganta tomar conta do pedaço, por exemplo, a recomendação seria consumir 30 gotas quatro vezes ao dia.

No caso de crianças, a medida é uma gota por quilo, fracionando a quantidade em três ou quatro vezes ao dia. Para os pequenos, é indicado o extrato aquoso, sem álcool na composição.

Em todas as situações, porém, é prudente consultar o médico antes de incluir a própolisno dia a dia – sobretudo para evitar interação com alimentos e medicamentos.

Outro lembrete: prefira sempre a versão orgânica dos produtos, que é mais segura.

“Ela não está contaminada por metais pesados, originários de pregos usados nas caixas das colmeias, nem apresenta resíduos de agrotóxicos”, justifica o engenheiro agrônomo Severino de Alencar, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da USP, em Piracicaba, no interior paulista.

Selos das agências reguladoras, caso do Ministério da Agricultura, também devem constar no rótulo. São as garantias de que a poderosa mistura vinda das colmeias é a mais natural e vantajosa possível.

Os tipos de própolis

Verde

Aclamada pelo mercado estrangeiro, a própolis verde é típica do Brasil e alvo de inúmeras pesquisas. O sucesso se deve ao seu alto poder antioxidante. Além de regular o sistema imune, tem efeito antimicrobiano e anticâncer.

Vermelha

Comum no Nordeste, é rica em componentes anti-inflamatórios, que ajudam a conter os estragos causados por micróbios. Tem se saído bem em experiências com células cancerosas. Isso já faz dela o tipo mais caro e cobiçado pelo mercado.

Marrom

A própolis com essa tonalidade, mais presente no Sul do Brasil, é semelhante à variedade europeia. É tradicional nas farmácias, embora seja menos estudada entre as três versões aqui. Destaca-se pelas atividades antioxidante e antimicrobiana.

Fábrica de própolis

Depois de coletada nas colmeias, a resina pode demorar até seis meses para virar extrato

1. As abelhas preparam o composto e o usam para tapar as frestas da caixa da colmeia. Assim, o apicultor tem que, periodicamente, remover esse material para que o enxame produza mais.

2. A própolis bruta que foi coletada é macerada em uma solução solvente. Existem variações de empresa para empresa, mas, geralmente, se utiliza álcool de cereais durante essa etapa do processo.

3. O preparado de própolis com solvente fica em repouso de um a seis meses para que os princípios ativos sejam transferidos para aquele líquido.

4. Só então a solução passa por uma centrifugação, que separa o extrato. O resíduo restante é a borra, dispensada. Enfim, a própolis está pronta para embalar.

Outras riquezas da colmeia

Mel

É a substância em maior abundância na colmeia, já que é fabricada para ser o alimento das abelhas operárias. De flor em flor, elas sugam o néctar e transformam isso em um carboidrato, que é sua grande fonte de energia.

Geleia real

No sistema da colmeia, o produto mais nobre é o que alimenta a rainha. Esse é o papel da geleia real. Ela é, na verdade, uma secreção produzida pelas abelhas riquíssima em proteína, capaz de tornar a rainha muito maior e mais resistente que as demais.

Diferentes produtos à base de própolis

Extrato

A versão clássica da própolis ainda tem o melhor custo-benefício. Além da versão em álcool, estão disponíveis extratos secos e em água, boas opções também para crianças.

Cápsulas

Eis uma alternativa para quem não é chegado ao sabor acentuado. Apesar de serem mais caras, concentram altas doses da substância.

Enxaguante bucal

Estudos indicam que produtos com própolis reduzem o risco de cárie e problemas na gengiva. Só veja com o dentista se você pode usar aqueles com álcool na fórmula.

Pasta dental

Mais uma maneira de se valer do composto em prol dos dentes e companhia, os cremes aliam a própolis à ação protetora do flúor.

Gel cicatrizante

É bem-vindo para tratar feridas e queimaduras. De efeito anti–inflamatório, o gel acelera profundamente a cicatrização da pele.

Mel

Outra forma clássica de conciliar dois produtos bacanas das abelhas. Mas há que se prestar atenção na quantidade de própolis no mel. Quem tem diabete ou está acima do peso precisa ficar de olho nos açúcares.

Spray

É o queridinho para combater as dores de garganta. O efeito bactericida da própolis com as propriedades emolientes do mel formam uma dupla e tanto. Se você for diabético, fique esperto com o teor de açúcar.

Manual do bom uso

Ao comprar

Para distinguir um produto de qualidade assegurada daquele de fundo de quintal, o consumidor deve ficar atento ao rótulo. É fundamental constar, na embalagem, o selo de registro do item no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

Ao usar

Em geral, o consumo do extrato deve ser diluído em água para ficar mais palatável. Profissionais sugerem tomar logo pela manhã, ainda em jejum, para evitar a interação dos compostos fenólicos presentes na própolis com outros alimentos.

Para conservar

A própolis deve ser mantida em local fresco e ao abrigo da luz, principalmente na forma de extrato alcoólico. Fique atento também à data de validade caso só faça uso em situações como dor de garganta.

Conteúdo originalmente publicado em SAÚDE

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