Dia das Mães: Assine a partir de 10,99/mês

Uma breve história do estrogonofe

Com um toque francês, o prato surgiu para alimentar a aristocracia russa e, do ketchup à batata palha, ganhou variações por onde passou.

Por Rafael Battaglia
Atualizado em 8 mar 2022, 14h11 - Publicado em 20 jul 2020, 19h46

Existem diversas maneiras de se referir ao bom e velho estrogonofe: “strogonoff”, “stroganov” ou, se você é versado em russo (e no alfabeto cirílico), “бефстроганов”. Quase tantos jeitos quanto variações do prato: frango, carne, camarão, palmito.

Mas afinal, como uma receita da Rússia veio parar no Brasil, onde, ao contrário da original, leva ingredientes como ketchup e cogumelos e é servida com arroz? E como ela ganhou tantas variações pelo mundo? Abra seu saco da batata palha e vamos lá.

A história do prato

O nome da comida vem de uma antiga e tradicional família da Rússia, os Stroganov (em francês, a grafia mudava para “Stroganoff”). No século 16, durante o reinado de Ivan, o Terrível (1530-1584), eles eram extremamente influentes, atuando como comerciantes, donos de terra e membros da política. Nessa época, os Stroganov foram um dos financiadores da conquista da Sibéria, no período de maior expansão territorial russa.

Apesar da fama, traçar a origem exata do prato (e a qual membro da família ele se refere) é uma tarefa mais complicada. Alguns a atribuem ao conde e diplomata Pavel Stroganov – que teve importante atuação política no reinado de Alexandre I (1777-1825) – ou a um de seus cozinheiros franceses. As lendas dizem, inclusive, que o corte da carne do estrogonofe, em tiras finas, foi inventado porque o conde era velho e tinha dentes ruins.

É uma história divertida, mas pouco provável que seja verdade: quando o prato foi criado para um de seus descendentes, o conde já tinha batido as botas. Uma das hipóteses mais aceitas é a de que o inventor seja Charles Briere, um cozinheiro francês que trabalhava para os Stroganov em São Petersburgo – hoje, inclusive, é possível visitar o palácio da família por lá. O estrogonofe, em sua origem, era comida de rico.

A história envolvendo Briere é bastante plausível, já que o estrogonofe é uma amálgama da culinária francesa com a russa. O cozinheiro teria misturado um jeito clássico francês de preparar a carne (dourada e flambada, com mostarda) com smetana – creme azedo, um dos ingredientes mais importantes da terra da vodca. Ele vai em tudo (sopas, saladas e até em sobremesas), chegando a aparecer em livros de Liev Tolstói em algumas descrições de banquetes.

Continua após a publicidade

A enciclopédia culinária Larousse Gastronomique considera Briere o inventor da receita – ele teria apresentado o prato beef stroganov em uma competição promovida por uma revista francesa de gastronomia em 1891.

No entanto, alguns anos antes, em 1871, a obra  A Gift to Young Housewives (“Um Presente para Jovens Donas de Casa”, em português), um clássico livro de receitas russo escrito por Elena Molokhovets, já trazia uma versão do “Govjadina po-strogonovski, s gorchitseju” – algo como “carne à la Stroganov, com mostarda” – o que coloca a história toda de Briere em questão.

A anatomia do prato

Seja qual for sua origem exata, o prato reflete o intercâmbio cultural que existia entre os aristocratas russos e a França – mais especificamente, Paris, onde muitos iam estudar. Os palácios russos mantinham empregados franceses, e o idioma era usado em casa e durante reuniões sociais. Toda essa mistura só poderia dar em pizza – ou melhor, em estrogonofe.

Os outros componentes da receita vieram com a sua internacionalização. No início do século 20, muitos russos emigraram – em parte, aristocratas, que queriam fugir da revolução instaurada no país. Com isso, o prato se espalhou.

Continua após a publicidade

Nos Estados Unidos, a receita se tornou popular graças a restaurantes abertos pelos imigrantes, como o Russian Tea Room, aberto em 1927 em Nova York por antigos membros do Ballet Imperial Russo. Ali, o estrogonofe encontrou outros parceiros, como os cogumelos e o molho de tomate (ou, em alguns casos, o ketchup – afinal, estamos falando dos EUA).

Foi na terra do tio Sam que as batatas cozidas à moda russa foram trocadas por outro acompanhamento que hoje, para muitos, é indispensável: batatas fritas, cortadas em palitos finos. Nessa época, o estrogonofe fazia sucesso também na França. Reza a lenda que a versão do restaurante Maxim’s, em Paris, era o prato preferido de Charles Chaplin.

Depois da Segunda Guerra Mundial, a popularidade do estrogonofe deslanchou. Em regiões da China, como Hong Kong, o prato passou a ser servido em restaurantes e hotéis, acompanhado de arroz, ingrediente básico da dieta chinesa. Vale dizer que a proximidade com a Rússia já vinha contribuindo há algum tempo com a fama da receita por lá.

No Brasil, o prato era extremamente popular nas décadas de 1960 e 1970. Nessa época, era chique preparar jantares e receber convidados com estrogonofe. Por aqui, o creme azedo, pouco popular, foi substituído por outro laticínio bem mais acessível: o creme de leite.

Continua após a publicidade

Naquela época, era comum servir estrogonofe com arroz e batata sauté. A batata palha de saquinho surgiu nos anos 1980 e, graças a uma inteligente campanha de divulgação da sua fabricante, a Crac, enraizamos o costume de comê-la com diversos pratos: cachorro-quente, fricassé, salpicão e estrogonofe. A praticidade falou mais alto.

Hoje, o prato é onipresente em restaurantes, cardápios de PF, praças de alimentação – convenhamos, é tão versátil que serve até para jantares românticos. Pelo mundo, há versões com macarrão (Reino Unido e Austrália) e até com salsicha e conservas (países nórdicos, como Finlândia e Suécia). Você comeria?

Compartilhe essa matéria via:
Publicidade


Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
Apenas 5,99/mês
DIA DAS MÃES

Revista em Casa + Digital Completo

Receba Super impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
A partir de 10,99/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a R$ 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.