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Qual é o problema em mudar a embaixada para Jerusalém?

Aceitar a cidade bíblica como capital de Israel significa escolher um lado num conflito que não nos diz respeito

Por Alexandre Versignassi Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 13 nov 2018, 11h40 - Publicado em 12 nov 2018, 17h58

Começou quando a região que hoje abriga Israel era só uma colônia Britânica, no início do século 20 – a colônia da Palestina. Por questões religiosas, judeus do mundo todo queriam transformar o lugar num país independente, recriando a Israel bíblica. E foram comprando terras na região até formar uma população razoável, alimentada por imigrantes.

A Inglaterra ia empurrando o assunto com a barriga, até porque essas ondas de imigração estavam incomodando a população local, os palestinos. Não pegaria bem na comunidade internacional dar tudo de mão beijada para os sionistas – os judeus que buscavam um território para chamar de seu.

Mas veio o Holocausto, e, finda a Segunda Guerra, a questão de criar um país para os judeus deixou de ser um assunto de nicho, e entrou para o centro da pauta global. Agora, a Inglaterra não criaria obstáculo algum.  

Mas faltava combinar com os russos. Mais precisamente, com os palestinos, que queriam a mesmíssima região para construir seu próprio país – e com a justificativa de que, caramba, já moravam lá, além do apoio de todos os vizinhos, que eram, e ainda são, países árabes. Pior: os palestinos também queriam que Jerusalém fosse sua capital – natural, já que a cidade não é sagrada só para os judeus, também é para os árabes (e para os cristãos, claro).   

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A ONU ficou encarregada de encontrar uma solução russomânica – “boa para ambas as partes”. E em 1947 veio com um plano: metade do território ficaria com os judeus e a outra metade com os palestinos. Jerusalém? Surpresa: não ficaria com ninguém. Se tornaria uma “ciadade internacional”, administrada e policiada pela ONU. Árabes e judeus deveriam conviver ali, sem que nenhum nem outro tivesse poder sobre a cidade. Se você quisesse visitar Jerusalém nesse realidade, passaria por um alfândega da ONU no aeroporto.

Mas não rolou. Palestinos e judeus não chegaram a um acordo. Em 1948, Israel declarou independência dentro das fronteiras definidas pela ONU. Mas sabendo muito bem o que aconteceria em seguida. “Aceitamos a resolução das Nações Unidas. Os árabes não. Eles estão preparando uma guerra contra a gente”, disse David Ben Gurion, futuro chefe de Estado israelense. “Se nós vencermos, as terras que conquistarmos serão nossas também”.

Foi precisamente o que aconteceu. Em 1948, Síria, Líbano, Iraque, Egito, Jordânia, Arábia Saudita, Iêmen e os palestinos declararam guerra contra Israel. Israel ganhou. Pegou territórios além daqueles que a ONU tinha determinado (como a Galileia) mais metade de Jerusalém. A outra metade da cidade, ficou com os árabes, sob administração da Jordânia, enquanto alguém não criasse um Estado Palestino. Esse também foi o destino de outros territórios, como a Cisjordânia, que também ficou sob a lei do governo jordaniano e a Faixa de Gaza, um enclave do tamanho da Grande São Paulo ocupado pelo Egito e cercado por terras israelenses.

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Em 1967 veio outro conflito entre árabes e israelenses, a Guerra dos Seis Dias. Israel ganhou de novo. Tomou a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, mais a outra metade de Jerusalém. A ONU, porém, nunca aceitou a soberania de Israel sobre esses territórios. Cisjordânia e Faixa de Gaza, então, permaneceram num limbo: não eram nem parte de Israel nem parte de um Estado Palestino, já que tal Estado não tinha se formado.

Em 1993, Israel concordou em ceder a administração da Cisjordânia e da Faixa de Gaza. Em tese, estava criado o Estado da Palestina. Mas só em tese. Apesar de existir uma polícia palestina, prefeituras palestinas e até dois governos federais palestinos (um para Gaza, outro para a Cisjordânia), Israel é quem manda.

O país controla todas as entradas e saídas de Gaza, e mantém tropas em toda a Cisjordânia. Existem até cidades 100% israelenses, com Universidades e condomínios de alto padrão, encravadas lá dentro – é como se houvessem cidades brasileiras dentro do Uruguai. Aí complica.

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Se você quiser ir para o Estado Palestino, precisa passar pela alfândega israelense – não existem voos para a Cisjordânia ou para a Faixa de Gaza. Se você quiser entrar por terra, mesma coisa: a “Polícia Federal” nas fronteiras deles não é palestina. É israelense.

Quem pegar um barco no Mediterrâneo e tentar atracar num porto da Faixa de Gaza será parado pela Marinha de Israel  – ou abatido, já que, para todos os efeitos, é como se a região vivesse em guerra permanente. Nem moeda o Estado Palestino tem: usam o sheckel israelense.

No fim das contas, não há um Estado soberano da Palestina. Ele só vai existir quando Israel liberar as fronteiras da Faixa de Gaza e retirar todos os seus soldados e civis da Cisjordania. E nada indica que isso vá acontecer neste século, ou nessa Era Geológica – Istael teme que uma Palestina livre se torne um Estado com um único objetivo: remover Israel do mapa.

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Jerusalém? Bom, aí nem teve conversa: Israel decidiu ficar com a cidade toda. Mesmo assim, o lugar segue dividido.

Jerusalém? Bom, aí nem teve conversa: Israel decidiu ficar com a cidade toda.

Mesmo assim, o lugar segue dividido. Na parte oeste, que Israel dominou em 1948, praticamente não existem árabes na rua. Na parte leste, aquela que ficou com os árabes até 1967, não há judeus – com a exceção da área onde fica o Muro das Lamentações, que por questões religiosas se tornou um bairro 100% judeu encravado na parte árabe de Jerusalém. Não há prefeitura ou polícia palestina nessas “partes árabes”. Em Jerusalém, é tudo Israel.

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As lideranças palestinas dizem que topariam ficar “só” com a parte árabe de Jerusalém, e instituir a capital de seu Estado soberano ali. A decisão Israelense de não abrir mão de parte da cidade de jeito nenhum basicamente impede qualquer acordo para a criação de um Estado Palestino de verdade.  

A comunidade internacional sempre reprovou a postura israelense. Todas as embaixadas, então, ficavam em Tel Aviv, a maior cidade de Israel. Movê-las para Jerusalém significaria aceitar uma decisão unilateral do governo israelense. Donald Trump, você sabe, veio e quebrou essa regra. Agora, Bolsonaro prometeu que o Brasil seria a segunda nação relevante a fazer o mesmo (dos 193 países membros da ONU, só a Guatemala seguiu o caminho dos EUA). Depois, o Presidente eleito voltou atrás, dizendo que “nada estava decidido”.

Que a decisão, quando vier, seja menos obtusa que a de Trump. Há décadas que o consenso para a solução do caso Israel X Palestina é a criação de dois Estados independentes. E se ambos fazem questão de que a sagrada Jerusalém seja sua capital, que a parte judaica abrigue a sede do governo israelense e a parte árabe, a do governo palestino. Acatar o que Israel quer sem levar em conta os anseios palestinos significar escolher um lado num conflito que não nos diz respeito, e jogar décadas de diplomacia no lixo. 

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