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Temer é o sétimo ex-presidente brasileiro preso

Uma carta falsa, uma tentativa de revolução, uma greve de pescadores e outras histórias mirabolantes por trás das prisões dos presidas.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Guilherme Eler
Atualizado em 12 mar 2024, 12h06 - Publicado em 21 mar 2019, 17h42

O ex-presidente Michel Temer foi preso nesta quinta (21) pela força-tarefa da Lava Jato do Rio de Janeiro – ele estava em São Paulo. Um avião decolou do Aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, para o Rio por volta das 16h30, para levá-lo à sede da Polícia Federal, onde ele provavelmente terá uma sala especial, conforme proposto por seus advogados. O mandado de prisão foi expedido pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio.

Temer responde a dez inquéritos na Justiça. Cinco deles tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF) – pois foram abertos na época em que ele era presidente da República e tinha foro privilegiado. Esses cinco processos foram encaminhados à primeira instância depois que ele deixou o cargo.

Temer engrossa o caldo de presidentes e ex-presidentes presos ou detidos: é o sétimo. Conheça os demais:

1. Hermes da Fonseca

Tudo começou com Hermes da Fonseca, o marechal que assumiu a presidência em 1910. Ele era sobrinho de Deodoro da Fonseca, também marechal e também presidente – e terminou seu mandato invicto em 1914.

Só seria preso oito anos depois, em 1922, graças a um barraco que teve muito pouco a ver com seu tempo no cargo mais importante do País.

Tudo aconteceu graças às eleições de 1º de março daquele ano. Elas foram disputadas entre o oposicionista Nilo Peçanha – que era o favorito de estados como Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Bahia – e Artur Bernardes, o mineiro de situação carinhosamente apelidado de “Seu Mé” e “Rolinha”. O país, como de hábito, estava dividido ao meio. 

Na época, Hermes da Fonseca era presidente do Clube Militar, e ficou do lado de Peçanha, assim como boa parte do exército. Os militares estavam insatisfeitos com o rumo do País, e Artur Bernardes seria essencialmente a mesma coisa que o presidente que estava em exercício na época, Epitácio Pessoa. Era uma troca de seis por meia dúzia. 

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Hermes, então, organizou uma reunião no Clube Militar para debater a situação. Ele e os demais oficiais descascaram Pessoa e Bernardes sem dó. Só não sabiam que a notícia da reunião chegaria aos ouvidos do presidente e o candidato que deveria sucedê-lo. Em outubro de 1922, na capa do jornal Correio da Manhã, apareceu uma carta atribuída a Bernardes:

“Estou informado do ridículo e acintoso banquete dado pelo Hermes, esse sargentão sem compostura, aos seus apaniguados, e de tudo que nessa orgia se passou… esse canalha precisa de uma reprimenda para entrar na disciplina. Veja se o Epitácio mostra agora sua apregoada energia, punindo severamente esses ousados…”

Só tinha um problema: a carta era falsa. Ou pelo menos foi o que afirmou Bernardes, que correu para desmentir a situação. Não adiantou: falsa ou não, todo mundo sabia carta expressava bem a opinião do candidato e seus aliados sobre os militares (“Se não escreveu, foi o que disse. E se não disse, é o que pensa”).

As eleições a aconteceram, a apuração foi feita, Bernardes ganhou de Peçanha e a chapa esquentou. O clube foi fechado, o Marechal, preso – e o descontentamento dos militares desencadeou a famosa Revolta dos 18 do Forte de Copacabana. Bernardes passou o resto do mandato sob ameaça.

2. Artur Bernardes

A dita “república do café com leite” – em que São Paulo e Minas Gerais se alternavam no poder – continuou firme e forte nas mãos de Bernardes e seus aliados. Após completar o mandato iniciado em 1922, o ex-presidente assumiu o cargo de senador – do qual só sairia com a Revolução de 1930 e a ascensão de Getúlio Vargas.

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Bernardes não sossegou: apesar de mineiro, aliou-se à Revolução Constitucionalista de 1932, em que os paulistas se levantaram contra o governo provisório de Vargas. “Quanto a mim, fico com São Paulo, porque para lá se transportou hoje a alma cívica do Brasil.” Tentou sublevar as forças armadas de seu próprio estado para ajudar, mas não deu certo.

Os constitucionalistas foram derrotados no dia 2 de outubro de 1932. Em 23 de setembro, Bernardes foi preso em Araponga, município próximo de Viçosa, sua cidade natal. Foi conduzido à ilha do Rijo, na baía de Guanabara, e confirmou no depoimento que havia tentado, sem sucesso, promover um movimento armado de apoio a São Paulo.

Foi transferido em 1º de novembro para o forte do Vigia, no bairro carioca do Leme – e lá aguardou o embarque para o exílio, em Portugal, onde passaria dois anos.

3. Washington Luís

Outro que passou uma temporada vendo o Sol nascer quadrado graças a Getúlio Vargas foi o presidente que ele derrubou, Washington Luís. A história da Revolução de 1930 é manjada, mas não custa relembrar:

Washington Luís era paulista, e, pela lógica vigente na época, deveria indicar um candidato mineiro para a eleição seguinte, que definiria o empossado a partir de 1931. Ele não deu a mínima e indicou Júlio Prestes, que também era paulista. Os mineiros não deixaram barato e fecharam uma aliança com o Rio Grande do Sul para oferecer outro candidato – Getúlio, com João Pessoa de vice (sim, o que dá nome à capital de Paraíba, seu estado de origem). Começou a campanha, que não acabou bem, é claro.

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Júlio Prestes ganhou a eleição, realizada em 1º de março de 1930. A tensão cresceu, e em julho, João Pessoa foi assassinado em Recife. A Revolução eclodiu às 17:30h do dia 3 de outubro, e tomou conta do País rapidamente. Em 24 de outubro, a cúpula militar exigiu a renúncia de Washington Luís. Ele disse não, o palácio Guanabara foi cercado e o presidente, preso. Assegurada vitória no Rio, Vargas chegou de trem no dia 31 – e lá ficaria pelos próximos 15 anos. 

4. Café Filho

Café Filho entende de ser preso: o político potiguar visitou sua primeira cela muito antes de chegar à presidência, em 1923. Na época, ele era razoavelmente conhecido no Nordeste como um advogado dos pobres – e quando percebeu que não conseguiria se eleger vereador e viabilizar bons projetos de lei no jogo de cartas marcadas da política da época, apelou para saída informal e começou a acompanhar grevistas em manifestações. Foi pego pela polícia como um dos líderes de uma revolta de pescadores do bairro da Rocas, em Natal.

O xilindró fez mais bem do que mal: daí em diante, Café Filho teve uma carreira próspera como jornalista e político. Ele fez oposição ao Estado Novo de Vargas na década de 1930 – denunciando o Plano Cohen como um embuste para justificar a implantação do governo autoritário.

Foi tanta denúncia que a cúpula de Vargas se incomodou. Café deu bobeira no Rio e quase se deu mal: no dia 14 de outubro, sua residência foi invadida pela polícia e seu cunhado Raimundo Fernandes foi preso em seu lugar. Dois dias depois, saiu do esconderijo e conseguiu asilo político na embaixada da Argentina. Chegou a Buenos Aires no início de novembro.

O tempo passou e veio a ironia do destino: nas eleições de 1950, o então governador de São Paulo, Ademar de Barros, sugeriu o nome de Café Filho à vice-presidência como condição de apoiar a candidatura de Getúlio Vargas. Getúlio resistiu pois o nome de Café Filho desagradava os militares e a igreja católica, mas ele assumiu do mesmo jeito – e acabou se tornando presidente quando Getúlio se suicidou, em 1954. O mundo dá voltas.

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Ele teve que entregar o cargo no ano seguinte após sofrer um ataque cardíaco. Assim que teve alta, em novembro de 1955, Café Filho chegou ao seu apartamento e foi detido por um grupo de militares à mando do General Lott. Já estava acostumado. 

5. Juscelino Kubitschek

Os primeiros anos da Ditadura Militar, sob o comando de Castelo Branco, tentaram passar uma aura de legitimidade: o militar planejava uma rápida limpeza para retirar da política os que considerava “subversivos” ou “corruptos”. Em seguida, convocaria eleições diretas e devolveria o País aos civis. O AI-5, já sob Costa e Silva, foi o “golpe dentro do golpe” – a consagração da truculência militar no poder, por tempo indeterminado. 

Juscelino, junto de muitos outros artistas, políticos e intelectuais, foi detido em 13 de dezembro de 1968, quando o AI-5 foi decretado. Naquela noite, Kubitschek era paraninfo de uma turma engenharia no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Foi preso por um oficial à paisana quando saia do evento e levado para um quartel em Niterói, onde foi mantido por alguns dias sob vigilância constante, sem muda de roupa. Quando saiu, foi levado para o seu apartamento no Rio, e ali viveu durante um mês em regime de prisão domiciliar.

6. Lula

Iniciada em março de 2014, a Operação Lava Jato já é a maior investigação anticorrupção realizada no Brasil. Além de trazer à luz esquemas envolvendo a Petrobras e grandes obras de infraestrutura, foi responsável por colocar importantes nomes da política nacional atrás das grades. Entre eles estão dois ex-presidentes: Michel Temer e Luís Inácio Lula da Silva, que governou o país entre 2003 e 2011.

Em março de 2018, Lula foi condenado a 12 anos e 1 mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ele teria recebido propina da empreiteira OAS na forma de um apartamento triplex em Guarujá (SP), em troca do favorecimento da empresa em contratos da Petrobras. Neste ano, o ex-presidente foi condenado novamente, por outra ação da Lava Jato – desta vez, a 12 anos e 11 meses de prisão. O caso envolvia o recebimento de propina em uma reforma em um sítio em Atibaia, no interior de São Paulo.

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A defesa recorreu da decisão e o caso permanece sem uma sentença definitiva. Lula segue preso na carceragem da Polícia Federal em Curitiba, no Paraná, desde abril de 2018. Ele é réu em outros cinco processos, acusado de crimes como organização criminosa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

 

 

 

 

 

 

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