Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana
Continua após publicidade

A espada de Bolívar: como funcionam as forças armadas venezuelanas

A vizinha Venezuela tem uma doutrina completamente diferente da nossa para tudo – inclusive quando o assunto é exército.

Por Fábio Marton
Atualizado em 13 set 2019, 16h17 - Publicado em 5 ago 2019, 18h49

Como tudo na Venezuela, as forças armadas também são “bolivarianas”. O nome foi mudado de Forças Armadas Nacionais para Forças Armadas Nacionais Bolivarianas com a Lei Orgânica, de 31 de julho de 2008, então sob o falecido presidente Hugo Chávez (1954-2013). Não foi (só) propaganda. Há diferenças entre o papel de um exército comum e a força bolivariana.

SI_Exércitos_Venezuela_Index

Além das funções básicas de defesa das fronteiras e da ordem – que costumam guiar tudo quanto é exército – as forças bolivarianas têm no seu descritivo um adendo: a “participação ativa no desenvolvimento social”.

A Constituição venezuelana de 1999 previa que fossem as forças armadas fossem apartidárias. As bolivarianas não são – na mudança  de nome, também foram definidas como “humanistas e socialistas”.

Continua após a publicidade

Por fim, foi introduzido o termo “Novo Pensamento Militar”, que removeu as estratégias inspirada nos EUA e outros países ocidentais e colocou Cuba como inspiração em seu lugar.

A Venezuela é, definitivamente, um país altamente militarizado. Clubes militares são abertos ao público, paradas são uma visão frequente, escolas militares admitem civis – e isso é só o mais obviamente visível. Chávez veio ele próprio da carreira militar, um tenente-coronel do Exército que se lançou à política após liderar uma tentativa de golpe em 1992. Por várias vezes, ele afirmou que o regime bolivariano era uma “aliança civil-militar”.

SI_Exércitos_Venezuela_Soldado

Continua após a publicidade

A coluna do regime

Em 2008, com a mesma lei que mudou o nome do exército, também foi criada a Milícia Nacional Bolivariana – um grupo voluntário, que funciona como exército de reserva.

Na prática, ele é bem mais ativo do que isso. Entre as várias funções da milícia, estão “estabelecer vínculos permanentes entre a Força Armada Nacional Bolivariana e o povo venezuelano”, “Orientar, coordenar e apoiar em suas áreas de competência os conselhos comunitários a fim do cumprimento das políticas públicas” e “Receber, processar e difundir a informação e consolidação dos conselhos comunitários”.

Não é muito difícil entender como a milícia foi vista de fora como um exército de controle político. Assim anunciou o site de oposição La Patilla em 2017: “Num país sem remédio nem comida… Maduro aprova recursos para ‘garantir um fuzil para cada miliciano’”.

Continua após a publicidade
SI_Exércitos_Venezuela_Sukhoi
É um sucesso garantido em espetáculos aéreos. O caça pós-soviético, criado a partir das lições da malfadada Guerra Afegã-Soviética (1979-1989), é supermanobrável. Quer dizer que pode fazer muita coisa impossível aos outros e continuar no ar. Para que serve isso? É parte da doutrina militar soviética-russa, de criar caças capazes de atuar em baixa velocidade e alta proximidade, o que facilita tanto ataques a solo quanto travar em um caça inimigo para disparar seus mísseis, enquanto torna difícil a eles atingir o mesmo resultado. Em contraste, os americanos favorecem a velocidade. O Su-30 é muito superior a qualquer caça brasileiro – ao menos até a chegada dos Gripen suecos, que seguem a filosofia americana. (Reprodução/Divulgação)

As milícias foram força ativa na repressão dos protestos após a tentativa de levante militar fracassada de 30 de abril de 2019. Ainda que, em caso de guerra, os mal treinados e mal armados civis, descritos por um diplomata anônimo ao New Yorker como “exército de cadeira de rodas”, não teriam realmente muita chance. Mas não estão sozinhas: é preciso mencionar também os collectivos – forças de civis armados, sem ligação direta com o Estado, que impõem também a vontade do regime.

Mas a maior parte da repressão ficou por conta da Guarda Nacional, que, com funções de defesa civil, é um dos cinco ramos das Forças Armadas Nacionais Bolivarianas, junto às já citadas milícias e as três forças regulares, Exército, Força Aérea e Marinha Bolivarianos.

Continua após a publicidade
SI_Exércitos_Venezuela_Mísseis
O codinome da Otan para ele é “gigante”. Não é difícil ver por quê: o colossal sistema antimísseis russo é páreo para a maioria das ameaças aéreas. Mísseis de cruzeiro, mísseis balísticos (médios), aviões drones e bombas guiadas. É um raro privilégio: além da própria Rússia, que levou vários deles para a Síria para se proteger dos mísseis e aviões israelenses, os únicos a operá-lo são o Egito e a Venezuela, que os têm desde 2014. O S-300 VM é capaz de ignorar contramedidas de ataque eletrônicas, feitas para fazer equipamentos desse tipo errarem o alvo e desperdiçarem munição. (Xavier Granja Cedeño/Getty Images)

Para nossos propósitos aqui, no que implica a capacidade de lutar, o que faz um exército ser “bolivariano”? Em bastante coisa, provavelmente: desde 2002, quando um primeiro golpe militar-civil fracassou em derrubar Hugo Chávez, um expurgo constante das Forças Armadas começou e continua em progresso. Crer ou parecer crer na ideologia do regime é a diferença entre exoneração ou promoção. Em outras palavras, militares são promovidos por fidelidade, não desempenho.

A mudança também foi de estratégia. As Forças Armadas venezuelanas, como as brasileiras e de quase todo o continente, eram preparadas para a guerra convencional e contrainsurgência. Isto é, de estar numa posição de vantagem ou igualdade. Mas com o realinhamento diplomático, a doutrina mudou para o que Chavez batizou de “guerra popular de resistência”. A partir de 2005, o Exército Venezuelano passou a treinar manobras de guerrilha.

Continua após a publicidade
SI_Exércitos_Venezuela_RPG7
Tão icônico quanto o AK-47 é o lança-foguetes padrão da insurgência pelo mundo, de radicais islâmicos a piratas somalis. E, como no caso do fuzil de assalto, isso tem sua razão: leve, básico, barato e confiável, o lançador de granadas propulsionadas por foguete entrega o que promete. Se o projeto é da União Soviética de 1961, diferentes tipos de munição – antipessoal, antitanque, antibunker – garantem que continue a ser relevante, mesmo se tanques modernos, como o Abrams americano, só sejam vencidos com múltiplos disparos. (Yuri Smityuk/Getty Images)

As Forças Bolivarianas têm um espaço privilegiado no regime, mas não são à prova de crise. Segundo o SIPRI (Instituto Internacional para Pesquisas da Paz de Estocolmo, na sigla em original), os gastos militares da Venezuela caíram 70% entre 2013 e 2018. Quase todos os equipamentos russos listados ao longo da matéria foram adquiridos antes disso, nos tempos de Hugo. Enquanto os oficiais têm alguns privilégios, como importar comida a uma taxa de câmbio generosa (para depois vender no mercado negro, acusa o oposição), a baixa patente tem que lidar com as mesmas agruras que o venezuelano comum.

E isso tem causado o que pode se revelar um sério problema: desertores das Forças Bolivarianas atravessam a fronteira com a arquirrival Colômbia, prometendo voltar para “liberar” a Venezuela. Só entre janeiro e abril, de acordo com autoridades de imigração colombianas, foram 1.400 deles. Vários acabaram arranjando emprego em grupos radicais colombianos, os paramilitares de ultradireita, mas também, ironicamente, guerrilheiros marxistas-leninistas, como o Exército de Liberação Nacional e dissidências das FARC que não aceitaram o cessar-fogo de 2016. É um tonel de pólvora cada dia mais perto de explodir.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY
Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Super impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 10,99/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.