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A reinvenção dos notebooks

Está chegando uma onda de laptops equipados com o novo chip Snapdragon X, que adota a arquitetura ARM – e promete dar ao mundo Windows a mesma autonomia de bateria dos MacBooks. Será? Para descobrir, testamos os dois primeiros lançados no Brasil.

Por Bruno Garattoni Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
16 set 2024, 10h00
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Em novembro de 2020, a Apple anunciou que estava abandonando a Intel, cujos processadores usava havia 14 anos, para adotar seu próprio chip, o M1. Ele gastava muito menos energia, e isso permitiu que os MacBooks alcançassem de 14 a 18 horas de autonomia, dependendo do modelo.

Pela primeira vez desde a invenção dos primeiros laptops, nos anos 1980, a duração da bateria deixava de ser um problema. Um avanço revolucionário, que realmente muda o jeito de usar o computador.

Só que os Macs são caros, pouca gente pode – ou quer – pagar o que custam. E até hoje há programas que não rodam no macOS. Por isso a Apple, mesmo com a superioridade tecnológica do M1 e sucessores, ainda detém apenas 10% do mercado global de laptops (nos EUA, 16,1%), segundo dados da consultoria Gartner. Os PCs seguem dominando o mundo. Mas, nos últimos anos, vêm tentando responder ao avanço dos MacBooks.

A Intel fez várias alterações em suas CPUs. Elas passaram a combinar núcleos de alta performance, que só são acionados quando o computador está executando tarefas mais pesadas, e núcleos de economia de energia, que dão conta da maior parte do resto. Melhorou, mas não muito. Os laptops com chips Intel (ou AMD) continuaram com autonomia modesta – no máximo 7 ou 8 horas, e geralmente bem menos.

Então alguns fabricantes de laptops começaram, timidamente, a experimentar outra solução: os processadores da Qualcomm, mais conhecida pelos chips de smartphone. Essas CPUs têm uma arquitetura interna diferente, que se chama ARM – e foi criada pela empresa inglesa Arm Holdings. Os processadores da Apple também adotam essa arquitetura.

Já os chips tradicionais, fabricados pela Intel e pela AMD, seguem a arquitetura x86 (o nome é herdado do processador 8086, que foi lançado pela Intel em 1978, e de seus sucessores 286, 386 e 486, criados ao longo dos anos 1980).

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Essa arquitetura é poderosa, estável e versátil: ela foi sendo aperfeiçoada e permitiu que os computadores dessem um salto avassalador de performance nas últimas décadas. Por isso a x86 é usada até hoje. Mas ela também tem um ponto fraco.

Os chips x86 são capazes de executar mais de 1.500 tipos de instruções matemáticas, o que é ótimo. Só que, por causa disso, eles precisam de circuitos internos mais complexos, que acabam gastando mais energia.

Já os chips ARM entendem um repertório de instruções muito menor, cerca de 230. Mas conseguem se virar perfeitamente bem (são capazes de rodar qualquer software, desde que ele tenha sido convertido para ARM), e sua simplicidade traz uma vantagem: o consumo de energia é muito menor. Por isso todos os smartphones, sejam iPhones ou Androids, usam chips do tipo ARM.

Nos laptops, o cenário é totalmente oposto. Os processadores ARM para notebooks foram evoluindo muito lentamente, sem que a Qualcomm conseguisse encontrar a solução para um problema central: a esmagadora maioria dos programas do Windows foi escrita para rodar em chips x86, e não havia sido portada (convertida) para a arquitetura ARM.

Se você tentasse usar esses aplicativos num laptop ARM, o desempenho ficava ruim – porque o computador precisava traduzir as instruções x86 ao mesmo tempo em que rodava o programa. Além de deixar a máquina lenta, isso consumia bem mais energia – o que drenava a bateria, e anulava a vantagem dos chips ARM.

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Foi assim por uma eternidade. Desde 2012, quando a Microsoft lançou o Windows RT, a primeira versão do sistema operacional compatível com processadores ARM, esses chips nunca conseguiram desafiar a supremacia dos x86 nos laptops. Mas isso finalmente mudou. A Qualcomm lançou um novo chip, o Snapdragon X, e todos os maiores fabricantes de notebooks decidiram apostar nele [veja abaixo algumas das novas máquinas].

Imagem com notebooks Dell Inspiron 14 Plus em um fundo roxo.
Dell Inspiron 14 Plus, com processador Snapdragon X Plus. (Dell/Montagem sobre reprodução)

Nós testamos os dois primeiros modelos com Snapdragon X a chegar ao Brasil: o Dell Inspiron 14 Plus e o Lenovo Yoga Slim 7x. Como você verá a seguir, ambos entregam o que prometem: suas baterias duram muito, no mesmo patamar dos MacBooks, e eles têm desempenho aceitável com programas x86 (embora geralmente isso nem seja necessário, pois uma parcela surpreendente dos softwares mais populares já foi convertida para ARM).

Imagem com notebooks Yoga Slim 7x Gen9 em um fundo roxo.
Lenovo Yoga Slim 7x Gen9, com processador Snapdragon X Elite. (Yoga/Montagem sobre reprodução)

O Snapdragon X não é perfeito, tem seus poréns (mais sobre eles daqui a pouco). Mas é um salto tecnológico notável, que finalmente coloca o mundo ARM em condições de rivalizar com a Intel e a arquitetura x86. E isso tem a ver com a Apple.

A CPU e o processo
Você provavelmente nunca ouviu falar do americano Gerard Williams III. É só mais um dos engenheiros que trabalham em silêncio enquanto os CEOs das empresas de tecnologia ficam sob os holofotes. Williams começou a carreira como estagiário da Intel, trabalhou um ano na Texas Instruments e aí foi para a Arm Holdings, onde passou mais de uma década projetando chips.

Em 2010 se mudou para a Apple, onde desenhou as CPUs dos iPhones e liderou o desenvolvimento do processador M1. Foi seu último projeto por lá. Em 2019, Williams saiu para fundar sua própria empresa de chips, a Nuvia.

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A Apple não gostou e entrou na Justiça dos EUA contra ele, a quem acusou de conspirar contra seu antigo empregador: Williams teria começado a montar a Nuvia enquanto estava na Apple, de onde recrutou alguns colegas. Em 2021, com o processo ainda correndo, a Qualcomm comprou a Nuvia por US$ 1,4 bilhão. Google, Microsoft e até a própria Intel, segundo rumores da época, também teriam tentado adquirir a startup.

É que a Nuvia tinha uma carta na manga. Ela criara um processador ARM, o Oryon, que prometia fazer pelos PCs o mesmo que o M1 havia feito pelos Macs: combinar alta performance e baixo consumo de energia.

A Apple acabou desistindo do processo, sem divulgar as razões, em 2023. E em 2024 a Qualcomm finalmente lançou o Snapdragon X – que utiliza a tecnologia do Oryon. O novo chip tem duas versões: X Plus e X Elite.

Infográfico do processador Snapdragon X.
(Snapdragon X/Montagem sobre reprodução)

 

O Elite possui 12 núcleos de processamento, contra 10 do irmão, trabalha com frequência de operação (clock) um pouco mais alta e, dependendo da versão, pode vir com uma GPU um pouco mais potente [veja quadro acima]. Na prática, isso não faz tanta diferença quanto pode parecer – pois o Plus já tem fôlego de sobra para as tarefas a que se destina.

O primeiro notebook a chegar para teste foi o Dell Inspiron 14 Plus, que usa esse chip. É um laptop do segmento premium, com tela LCD de 14 polegadas (2.560×1.600 pixels), 16 GB de memória RAM, SSD de 512 GB e um ótimo teclado, com leitor de impressões digitais. A máquina tem chassi de alumínio, pesa 1,4 kg e vem com Windows 11 ARM (que é visualmente idêntico à versão tradicional).

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Trata-se de um “Copilot+ PC”, ou seja, cujo teclado tem um botão que serve como atalho para o assistente de IA da Microsoft. Mas, como ela ainda não liberou as funções mais interessantes, por enquanto essa tecla não faz muita coisa – é só um atalho para a versão online do Copilot (copilot.microsoft.com), que você já pode acessar de qualquer PC.

Por outro lado, o Snapdragon X Plus e o X Elite vêm equipados com uma NPU: unidade de processamento neural, dedicada a tarefas de IA, e ela é capaz de executar 45 TOPS (trilhões de operações por segundo). Supera o nível recomendado pela Microsoft, 40 TOPS, para rodar os futuros recursos de IA do Windows.

Comecei a instalar programas no Dell, e tive uma boa surpresa: boa parte dos softwares mais comuns já ganhou versão ARM. Isso inclui os principais navegadores (Chrome, Edge, Firefox), o pacote Microsoft Office, o Dropbox, o Spotify e o Photoshop.

Já outros programas, como o editor de vídeo Adobe Premiere, não; eles ainda são x86, e rodam por meio de um novo emulador, o Prism, desenvolvido pela Microsoft. Nos testes, a emulação deixou o Premiere um pouco mais lento – num grau aceitável, embora indesejável para uso profissional.

Mas esse problema não deve durar muito: a Adobe está prometendo lançar a versão ARM do Premiere até o fim do ano (e terá de fazer isso, já que o editor de vídeo DaVinci Resolve, seu maior concorrente, já foi convertido para ARM).

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Alguns softwares x86, como o Ableton Live (produção musical) e o AutoCAD (engenharia), simplesmente não instalam. O Google Drive também não – só dá para usar a versão web dele. E não consegui rodar o Equalizer APO, um software que uso para corrigir a acústica da minha sala ao ouvir música.

“No momento, aplicativos que precisam de drivers que não foram atualizados para rodar em ARM não funcionarão na emulação do Prism”, explica Everton Caliman, diretor de vendas de devices (dispositivos) da Microsoft Brasil.

 

OUTROS MODELOS
22 laptops com Snapdragon X já foram lançados no exterior. Confira os principais

 

 

Boa parte dos games, incluindo jogos online (cujos sistemas antitrapaça incluem drivers incompatíveis com o Snapdragon X), também não roda. Mas, segundo a Microsoft, o usuário médio de Windows passa 87% do seu tempo – excluindo games – em softwares que já foram convertidos para os chips ARM.

No teste de bateria, foram 100%: só usei softwares ARM. Rodei o Chrome com muitas abas abertas, executando o pacote Google Workspace (textos e planilhas) e o WhatsApp Web enquanto ouvia música pelo Spotify, parando de vez em quando para fazer reuniões pelo Google Meet ou ver algum vídeo no YouTube, com a tela ajustada para 50% de brilho. É meu fluxo de trabalho – com o qual, em máquinas x86, nunca consigo mais do que 6 a 8 horas de bateria.

Os dez núcleos do Snapdragon X Plus tiraram de letra: o Dell em nenhum momento ficou lento, esquentou ou acelerou sua ventoinha interna (que se manteve inaudível o tempo todo). E, o mais importante, entregou a autonomia que se esperava: a bateria do Inspiron durou 14 horas e 7 minutos. É um grande salto para os laptops Windows, que finalmente alcançaram os MacBooks.

Por isso, ao receber para testes o Lenovo Yoga 7x, minha expectativa era alta: ele tem uma bateria bem maior, de 70 Watts-hora, contra 54 Wh do Dell. O Yoga 7x não é um concorrente do Inspiron – ele ocupa outro segmento de mercado, o topo de linha. Pesa 1,28 kg e tem tela OLED de 14,5 polegadas (resolução de 2.944×1.840 pixels), 32 GB de RAM e SSD de 1 terabyte.

Também é um Copilot+ PC, pois tem o botão correspondente no teclado. Sua CPU é o Snapdragon X Elite, de 12 núcleos. Só que a tela OLED e o chip mais potente gastam mais energia. Por isso, mesmo tendo uma bateria maior, o Yoga 7x não disparou na frente em autonomia: alcançou 12h22min. Um resultado também excelente, mais do que suficiente para trabalhar o dia todo sem se preocupar.

Sabe quando o Windows dá aquele alerta de 10% de bateria, e você sai correndo atrás de uma tomada? Com as máquinas Snapdragon X, não é assim – você fica tranquilo, pois sabe que ainda tem de 60 a 90 minutos de autonomia. Se você resolve sua vida com o browser e o pacote Office, e não pretende rodar games ou softwares mais específicos (como ferramentas de engenharia ou produção musical), o Snapdragon X é uma ótima opção.

Com um porém: o preço. O Inspiron 14 Plus custa R$ 8.500, e o Lenovo Yoga 7x sai por R$ 10.560. É menos do que os MacBooks (que começam em R$ 11 mil), mas ainda é bem mais caro do que a média dos laptops tradicionais.

No começo de setembro, a Qualcomm anunciou uma nova versão do Snapdragon X Plus, com 8 núcleos, para laptops que custarão entre 700 e 800 dólares nos EUA. Se essas máquinas vierem a ser fabricadas no Brasil (como o Inspiron 14 Plus é), seus preços poderão ficar em torno de R$ 6 mil.

Ainda não seria o suficiente para matar os chips tradicionais, mas representaria um grande passo nessa direção. Após 40 anos de reinado da arquitetura x86, ela finalmente encara um desafio real.

***

cpu-intel-lunar-lake
(Intel/Divulgação)

A resposta da Intel
Chip de próxima geração terá mais poder de IA – e promete estender a bateria.

A Intel produz 50 milhões de processadores por ano, e detém 78% do mercado de CPUs para computador (desktop e laptop), segundo dados da consultoria Canalys. Ao mesmo tempo, a gigante atravessa um momento difícil, com problemas na fabricação de seus chips Core i7 e i9, o anúncio de que ela irá demitir 15 mil funcionários (15% do total) e, após anos de hesitação, todos os principais fabricantes de laptops finalmente embarcando na onda dos processadores ARM, lançando modelos com o chip Snapdragon X [veja exemplos acima].

Mas a Intel prepara sua reação: uma nova linha de processadores, da série Lunar Lake, que chegará ao mercado até o final do ano, em notebooks de várias marcas. Os chips continuam adotando a tradicional arquitetura x86 (não são ARM), mas prometem levá-la a um novo patamar.

Os Lunar Lake usam memória RAM acoplada ao processador, o que aumenta o desempenho – e é uma novidade no mundo x86. Eles também possuem uma NPU (área de processamento de inteligência artificial) mais poderosa, capaz de executar 48 TOPS (trilhões de operações por segundo), o suficiente para rodar as funções de IA do Windows.

Os Lunar Lake serão assimétricos, ou seja, combinarão núcleos de alta performance (P) e de economia energética (E), um conceito que é utilizado nos chips de celular – e a Intel adotou, nas suas CPUs de computador, há alguns anos. Segundo a empresa, os novos núcleos E gastam bem menos eletricidade – e, por isso, os notebooks com os processadores da linha Lunar Lake terão até 60% mais tempo de bateria. A conferir.

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