Lar,soft lar
Seja bem-vindo. E, antes de entrar, nem limpe os pés. A casa cuida disso para você
Eder Santin
Já ouviu dizer que até as paredes têm ouvidos? Pois daqui a alguns anos este ditado vai ser tão verdadeiro quanto o clássico 1984, livro de George Orwell que mostrava um mundo vigiado por câmeras em todos os lugares.
Mas isso não é necessariamente assustador, como no livro. As casas do futuro poderão ser totalmente programáveis, seja por central de radiofreqüência, Internet ou celular. Não importa a tecnologia, você vai poder controlar quase tudo – do porteiro eletrônico ao home theater, da iluminação do jardim às compras de supermercado.
Além da automação, a casa deverá captar e gerar energia, reciclar água e resíduos e oferecer o máximo de conforto a seus moradores sem gastar muito.
Na verdade, parte disso já existe, mas as tecnologias precisam ser integradas e oferecidas ao consumidor a preços acessíveis. Veja o que o espera:
O império dos sentidos
Esqueça as chaves. Para entrar em casa, vá até a porta 1 e aguarde. Uma leitora de íris vai dizer se você tem os olhos do dono. Você também pode recorrer à leitura de impressões digitais ou, ainda, submeter sua voz à identificação. Para garantir, combine tudo isso ou apele para o sentido do tato: tente uma leitora de mão, que emite feixes de luz capazes de mapear o volume de sua mão e representá-la em 3D.
Sorria!
A tendência é clara: câmeras cada vez menores, mais potentes e disfarçadas em plantas no ambiente, como no coqueiro da ilustração 2 . No jardim, compondo o cenário com as câmeras, é possível incluir um sistema de iluminação versátil, que pode fazer luzes ocultas dispararem como um alarme, se houver invasão da casa.
Tudo se recicla
A energia elétrica será cara e os combustíveis minerais, recursos não renováveis, vão se esgotar. A energia da casa do futuro será gerada por coletores de raios solares 3 , por baterias 4 e geradores 5 .
A climatização da casa será a mais natural possível, mas, eventualmente, poderá ter também algum sistema de refrigeração 6, talvez até por acumulação de água gelada. Em vez de coleta seletiva, o lixo doméstico será processado na própria casa, que vai dispor de um sistema de gerenciamento de desperdício 7 .
Até a grama recém-cortada poderá ser reciclada e virar adubo para o jardim.
Novelas com cheiro
Todos os ambientes serão plugue e use. Com o controle remoto e as devidas instalações, você vai levar som e imagem a qualquer parte da casa utilizando uma única fonte emissora. Parte dessa revolução está em curso, caso da HDTV (TV de alta definição) e da nova proporção da tela: 16 x 9 8 em vez de 4 x 3. Os cientistas também estudam a criação da TV com cheiro, o que pode virar realidade daqui a 20 anos. Até lá, TV e Internet estarão juntas, permitindo que você, ao assistir a um programa de gastronomia, por exemplo, participe de bate-papos online, grave receitas e, claro, compre utensílios e ingredientes.
Chão quentinho
A solução não é visível, mas traz conforto. Embutidas no assoalho 9 durante a construção, mantas ou serpentinas alimentadas por corrente elétrica aquecem o piso, mantendo o necessário conforto térmico.
Loft digital
Em vez de salas específicas – para jantar ou estar, por exemplo -, uma grande sala será convertida conforme a necessidade. É o conceito de loft, dos velhos galpões americanos, levado às últimas conseqüências. Em alguns casos, de acordo com a encomenda feita ao arquiteto, os ambientes serão separados por paredes de vidro recheado com uma película de cristal líquido. Submetido à corrente elétrica, o vidro varia de opaco a transparente 10 . Quer privacidade? Parede opaca. Quer vigiar o bebê no quarto ao lado? É só ajustar de novo.
Cadê o pó?
Para aspirar o pó da casa, costumamos pensar naquele robozinho dócil e incansável. Mas é mais provável que o próprio aspirador vire peça de museu.
Uma central de aspiração, instalada na garagem ou na área de serviço, cuida de quase tudo. Ela será ligada a uma rede de tubos de PVC e contará com vários focos de aspiração – um por ambiente 11 .
Cabeça fresca
O teto vai abrigar sensores de umidade, ventilação e condicionamento do ar, além de reguladores ambientais 12 . No alto também ficam as lâmpadas. Mas esqueça os interruptores. Pense em painéis inteligentes, capazes de proporcionar economia de energia e programar a intensidade de luz do ambiente conforme a atividade exercida no local e o grau da luminosidade natural. Considere ainda a possibilidade de usar o teto como tela de projeção para videoconferência.
Bons sonhos
Os quartos, claro, serão pequenos, possivelmente com uma cama dobrável 13 ou embutida na parede. Explica-se: como o ciberespaço será a principal arena para exposição pessoal, espera-se necessitar de menos acessórios para guardar no armário ou no closet. Os futuristas adeptos dessa visão partem da premissa de que o sexo será feito em outras partes da casa.
Tudo em casa
A maior parte do nosso trabalho será feita em casa. Para isso, teremos workstations portáteis 14 , para trabalharmos em qualquer parte. Mas o oposto também é válido. Do escritório será possível visualizar a planta da casa e programar equipamentos, sensores de presença, câmeras de vídeo e alarmes. A temperatura da água da banheira poderá ser controlada pelo celular. Essa é uma novidade que já está bem próxima do cotidiano.
Fecha a conta
O hábito de cozinhar deve diminuir e os serviços de entrega em domicílio tendem a crescer. Logo, a pequena cozinha servirá mais para manusear a comida comprada – abrir a embalagem e preparar o prato que vai à mesa. Claro que os equipamentos não ficarão de fora da revolução tecnológica. Os fabricantes de geladeira 15 já estão prontos para entrar no século XXI com novidades: refrigerador com leitor de código de barras, para controle do estoque residencial, e uma conexão com a Internet – ou melhor, com o supermercado virtual -, para abastecer a casa à medida que a comida vai acabando.
E o banheiro?
Essa vital área da casa deve contar com grandes avanços tecnológicos, como vasos inteligentes com assentos térmicos e limpeza automática após o uso, além de uma ducha embutida na própria bacia, acionada pelo ocupante para sua higiene íntima. O mesmo vaso estará adaptado para colher amostras de – argh! – fezes e urina para exames clínicos. Som ambiente e acesso à Internet também fazem parte do pacote. Você não vai encontrá-lo no desenho – afinal, você sabe bem como é, certo?
Eder Santin é editor do site de Arquitetura & Construção da Abril.com