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O notebook do Google

Ele é imune a vírus, nunca fica lento, sua bateria dura o dia inteiro. Mas isso tem um preço: a máquina tem apenas um software, o Chrome. Será que basta?

Por Bruno Garattoni Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 Maio 2019, 17h32 - Publicado em 15 jan 2019, 15h08

Quem mora no campo precisa de um jipe 4×4 para se locomover. Quando alguém muda da fazenda para a cidade, o natural é trocar o jipe por um carro. O computador tradicional é como o jipe. Ele vai continuar a existir, mas só para usos específicos (ou para aficionados). O mundo vai migrar para outro tipo de dispositivo, mais simples.

Quem disse isso foi Steve Jobs, em 2010, numa das últimas entrevistas antes de morrer. Jobs chamava esse cenário de “o futuro pós-PC”. Faz sentido, parece inevitável, mas, quase uma década depois, ainda não chegamos lá. Ok, hoje é possível resolver muita coisa só com o smartphone – mas ainda não dá para dispensar um desktop ou notebook tradicional, rodando Windows, Linux ou macOS.

Ou será que dá? O Google acredita que sim, e propõe um novo conceito de computador: o Chromebook. É um laptop que roda o Chrome OS, um sistema operacional hipersimplificado. Ele é extremamente pé-de-boi, tanto que só roda um programa, o navegador Chrome. Você tem que se virar com isso. Em compensação, o Chromebook promete vantagens incríveis: liga em 15 segundos, não pega vírus, não fica lento e sua bateria dura 10 horas.

Nos Estados Unidos, os Chromebooks (fabricados pelo próprio Google e por outras empresas, como Acer e Samsung) estão varrendo o Windows das escolas: já detêm 60% do mercado educacional, contra 25% do sistema da Microsoft. Mas dá para viver só com um Chromebook? Para descobrir, passamos um mês tentando fazer isso, sem usar nenhum outro computador.

Testamos dois Chromebooks, com algumas diferenças entre si. O primeiro é o Acer 11N7. Ele é leve, tem pouco mais de 1 kg, mas parece feito de granito: todas as peças, da dobradiça da tela aos botões do teclado, impressionam pela solidez. Lendo o manual do aparelho, logo descubro o porquê. Ele possui a certificação militar STD-810G, ou seja, é à prova de líquidos e quedas de 1,2 metro.

Sua configuração, por outro lado, não é nada demais: CPU Intel Celeron de 1,6 GHz e 4 GB de memória RAM. Parece um daqueles notebooks ruinzinhos, de mil e poucos reais, que sobram nas lojas por aí (e passam sufoco para rodar o Windows). Será que 4 GB são suficientes para saciar o Chrome – conhecido por devorar memória RAM como um alcoólatra bebe pinga?

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Ligo a máquina pela primeira vez. Dez segundos depois, ela pede meu nome de usuário e senha do Google. Pronto. Meus emails do Gmail, vídeos e canais do YouTube, documentos do GDocs, bookmarks, senhas e extensões do Chrome… está tudo ali. 90% da minha vida digital acaba de ser transplantada, em poucos segundos e sem nenhum problema, para a máquina.

Começo a abrir um montão de abas, para tentar fazer o Chrome engasgar (o que sempre acaba acontecendo nos computadores comuns). Edito uma planilha pesada no Google Docs enquanto rodo um vídeo do YouTube, com mais 20 abas abertas na tela, e o computadorzinho – mesmo com seu processador modesto e pouca memória – nem se abala. Como pode?

O Windows é formado por 60 milhões de linhas de código de computador, que foram sendo adicionadas ao longo dos últimos 30 anos. Ele é um emaranhado tão denso que os programadores costumam compará-lo a um prato de espaguete, impossível de desembaraçar: se você tentar, os fios de macarrão se partem. O Chrome OS tem 20 milhões de linhas. É menor e menos tortuoso, e por isso exige menos poder de processamento.

O notebook do Google também não precisa de antivírus (elemento que é essencial no mundo Windows, mas rouba velocidade do computador) e vem com solid state disk, um tipo de memória que substitui o tradicional HD – e é centenas de vezes mais rápido. Por tudo isso, a máquina também gasta menos energia, e a bateria dura muito: no computadorzinho da Acer, 10 horas de uso intenso.

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Ele só não é perfeito por causa da tela, que poderia ser maior e melhor (mede 11 polegadas e tem resolução 720p). Esses dois problemas são corrigidos por outro Chromebook: o Samsung XE521. Sua configuração é similar à do Acer, mas a tela é bem superior (12,2”, Full HD). Já a bateria dura menos, 5 a 6h. Tirando essas diferenças, os dois notebooks funcionam do mesmo jeito: rodam o Chrome incrivelmente bem. E só. Mas é o suficiente?

Os poréns

Para ouvir música, editar textos e planilhas, navegar e usar email, os Chromebooks dão e sobram. O Google Docs funciona até sem conexão à internet (ele salva os arquivos para que você possa trabalhar offline, e depois sincroniza automaticamente as alterações). Já se você quiser editar fotos ou vídeos, complica um pouco. Até dá para fazer isso com ferramentas online, mas elas são limitadas (como o Google Fotos) ou pagas e lentas (WeVideo). Outro senão é que os Chromebooks têm  pouca capacidade de armazenamento, 16 a 32 GB, pois a ideia é que você guarde seus arquivos na nuvem. Só que isso custa. O Google dá 100 GB de espaço grátis por dois anos, mas depois cobra R$ 7 mensais.   

O Netflix funciona perfeitamente, com um porém: não dá para salvar vídeos para ver offline (no macOS, a bem da verdade, também não dá). Quer baixar um torrent? Existe um único programa, o JS Torrent, que funciona. Ele é meio chato de configurar – pois trata-se de uma gambiarra dentro do Chrome –, e também é pago (US$ 7). O site do meu banco (Itaú) rodou normalmente, mas o programa do Imposto de Renda não. Para fazer a declaração, só recorrendo a um segredinho do Chromebook: você pode instalar aplicativos de Android nele. Os apps rodam dentro de um smartphone virtual,  com a telinha pequena. O aplicativo Meu Imposto de Renda, da Receita Federal, aparentemente funciona.  

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Apesar dos senões, a conclusão é: sim, dá para viver só com um Chromebook. Ele tem limitações, mas as vantagens compensam. Mas tome cuidado com o preço. A máquina da Acer custa R$ 2.000, e a da Samsung sai por R$ 3.500. Não valem tudo isso (se você quiser um Chromebook, opte pelo XE500, da própria Samsung, de R$ 1.200).

O grande desafio à popularização dos Chromebooks é que as pessoas gostam de coisas potentes: tanto que ainda compram jipes para rodar nas cidades. E o sonho de consumo de muita gente é um Macbook Pro capaz de projetar foguetes – mesmo nos casos em que ele, na prática, só será usado em tarefas tão triviais quanto acessar o Facebook e o YouTube. 

***

Como fazer o seu próprio Chromebook

Você tem um notebook velho e encostado, que mal liga? Veja como ressuscitá-lo.

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1. Usando outro computador, entre no site neverware.com/freedownload e baixe o programa USB Maker. Conecte um pendrive de 8 GB e rode esse programa. Ele irá baixar o CloudReady OS (uma versão de código aberto do Chrome OS, produzida pela empresa americana Neverware).

2. Quando o processo terminar, pegue o pendrive e conecte no notebook velho. Ligue a máquina e pressione a tecla F11 ou F12 para entrar nas Opções de Boot. Na listinha que será exibida, selecione o pendrive e dê Enter.

3. O notebook vai executar o CloudReady direto do pendrive. Experimente o sistema e veja se ele está funcionando direitinho. Se estiver, clique em Install CloudReady. Isso irá formatar o notebook, e instalar o sistema no disco rígido.

4. O CloudReady é praticamente idêntico ao Chrome OS, com uma diferença: não roda aplicativos do Android. Mas é uma ótima pedida para revitalizar um computador antigo.

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