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Vida de inseto

Sabe aquele estado de zumbi depois de trabalhar o dia inteiro? Kafka já sentia isso e falava a respeito no começo do século 20.

Por Alexandre de Santi (edição: Bruno Garattoni)
Atualizado em 23 out 2020, 11h01 - Publicado em 19 nov 2015, 15h45

Livro: A Metamorfose
Autor: Franz Kafka
Ano: 1912
Por que ler? Sabe aquele estado de zumbi depois de trabalhar o dia inteiro? Kafka já sentia isso e falava a respeito no começo do século 20.

No final do dia, durante o engarrafamento na volta para casa, você só quer se jogar na cama e ver a novela? O trabalho, o trânsito e a necessidade de ir ao supermercado fazem você deixar de lado os pequenos prazeres da vida? E isso tudo não parece cada vez pior, cada vez mais rápido, mais massacrante? Poucas sensações são mais contemporâneas, certo? Mais ou menos. Franz Kafka já passava por essas crises existenciais em 1912, dois anos antes da 1ª Guerra Mundial, quando escreveu A Metamorfose.

No livro, o personagem Gregor Samsa trabalha como caixeiro-viajante para quitar a dívida do pai com o chefe. Após pesadelos, acorda transformado em um inseto gigante de dorso duro e inúmeras patas. A mudança o impede de ir trabalhar e agita a monotonia da família, formada pelos pais velhos e pela jovem irmã. Quem vai sustentar a casa a partir de agora? A preocupação em faltar ao trabalho atormenta Gregor mais do que o próprio fato de ter se transformado num bicho asqueroso.

Submetendo seu personagem ao medo de decepcionar a família e o chefe, Kafka critica a rotina maçante, os horários regrados e as inúmeras obrigações do cotidiano. Lembre-se de que ainda não existia jornada máxima de oito horas diárias nem leis trabalhistas. Naquele tempo, a vida era muito mais dura. A mente girava em torno do trabalho, e a única ambição que sobrava era a cama quentinha no final do dia. Ou seja, se você já se sente esmagado pela rotina hoje, imagine viver como os Gregor Samsas da época. Considerado inútil por não sustentar mais a casa, o jovem passa a viver isolado e deprimido no quarto, perdendo a cada dia um pouco da sua  humanidade.

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Quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranquilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso.

A história do jovem que se transforma em um inseto foi a forma surpreendente e absurda de criticar o estado de inércia na qual às vezes nos enfiamos e capaz de nos deixar imunes às belezas do cotidiano, como um lindo dia de sol. O clima de agonia do livro brota de uma época particularmente pessimista na Europa. Kafka, nascido em Praga – naquela época pertencente ao Império Áustro-Húngaro – fez parte de uma geração que via tudo cair por terra.

A Revolução Industrial transformava as pessoas em máquinas de bater prego, as cidades ficavam cada vez mais sujas e doenças se alastravam. E ainda era um tempo em que o evolucionismo de Darwin, lançado décadas antes, havia ganhado força, colocando o homem apenas como mais um dentre os animais. Talvez Kafka nunca tenha ficado trancado no trânsito perdendo um pouco da humanidade a cada buzina. Mas foi preciso ao descrever como uma rotina tediosa pode roubar a vida que resta em nós.

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