Amazônia pode estar emitindo mais gases de efeito estufa do que absorvendo, aponta estudo
Pesquisadores levaram em conta diferentes dinâmicas da floresta. Desmatamento, incêndios e outras interferências humanas aumentam a emissão de metano e óxido nitroso, além de diminuir a absorção de CO2.
A ideia de que a Amazônia é o pulmão do mundo é um dos maiores mal-entendidos sobre a floresta. Sim, ela de fato absorve gás carbônico e libera oxigênio por meio da fotossíntese, mas a Amazônia também consome quase todo o O2 que produz. Seu mérito é conseguir retirar um pouco do CO2 da atmosfera ao transformá-lo em glicose para as folhas e galhos. A novidade de um novo estudo publicado na Frontiers in Forests and Global Change é que agora a floresta pode estar emitindo mais gases poluentes do que absorvendo – graças à ação humana.
A pesquisa contou com a participação de 30 cientistas de todo o mundo, inclusive do Brasil. Enquanto a maioria dos estudos foca apenas no armazenamento e ciclo do carbono na floresta, a equipe internacional se propôs a fazer um balanço de toda a bioquímica da Amazônia, calculando a emissão e absorção de gases do efeito estufa: o gás carbônico (CO2), óxido nitroso (N2O) e gás metano (CH4). Eles concluem que o aumento de emissões de N2O e CH4 na Bacia Amazônica compensa – e provavelmente supera – a absorção do CO2 atmosférico.
A estimativa analisou uma série de dinâmicas do ambiente, e levou em conta fontes antropogênicas (ou seja, emissões causadas por alterações humanas) e fontes naturais. Uma das conclusões mais intuitivas é que, com o desmatamento, a floresta perde parte da sua capacidade de reter CO2 – mas não é só isso que tem acontecido. Os incêndios feitos para limpar as terras para o gado e agricultura também liberam partículas de fuligem conhecidas como carbono negro, que absorvem a luz solar e causam o aquecimento localizado. Só em 2019, cerca de 22 mil quilômetros quadrados de terra foram queimados na floresta amazônica.
E não para por aí. A exploração madeireira leva a secagem de pântanos e compactação do solo, o que aumenta as emissões de óxido nitroso. O desmatamento pode ainda alterar padrões de pluviosidade, fazendo com que ora tenha seca, ora caiam chuvas em excesso. Uma das consequências das inundações e construção de barragens é a maior liberação de gás metano. Ele é produzido por microrganismos que vivem no solo úmido e canalizado para a atmosfera pelas árvores. Para ter ideia do problema, o CH4 é 28 a 86 vezes mais potente como gás de efeito estufa do que o CO2.
Muitas vezes, poucas ações já levam a um efeito cascata na emissão de gases. Se uma área da floresta é desmatada para a criação de gado, as árvores de lá não só deixam de absorver CO2, mas também liberam o carbono armazenado durante a decomposição do tronco. Além disso, o solo compactado pelo gado libera mais óxido nitroso, e você provavelmente sabe que esses animais liberam uma boa quantidade de metano pelos puns.
Em entrevista à National Geographic, os pesquisadores explicam que os danos ainda podem ser revertidos. O mais importante é conter o desmatamento na Amazônia, reduzindo também a construção de barragens e incêndios. A interrupção das emissões globais de carvão, petróleo e gás natural também ajudaria a restaurar o equilíbrio, junto a um aumento dos esforços de reflorestamento. No ano de 2020, no entanto, o desmatamento aumentou 10% em relação ao ano anterior, atingindo a maior média dos últimos 12 anos.
Uma análise de 2018 feita por dois especialistas – incluindo Carlos Nobre, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP) – sugere que o aumento do desmatamento pode alterar o fluxo de umidade da Amazônia, o que transformaria parte da floresta tropical em savanas estéreis. Esse ponto de virada acontecerá quando de 20 a 25% da Amazônia for desmatada. Atualmente, o desmatamento já levou 17% da floresta.