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Cães de Chernobyl são descendentes dos que sobreviveram ao acidente nuclear

Estudo analisou o DNA de cachorros que vivem ao redor da usina e constatou que eles formam um grupo homogêneo, com características genéticas específicas

Por Luisa Costa
Atualizado em 14 mar 2023, 08h11 - Publicado em 6 mar 2023, 18h14

Depois que explosões abalaram a usina nuclear de Chernobyl, na cidade ucraniana de Pripyat, em 1986, as autoridades soviéticas evacuaram milhares de pessoas que moravam ao redor. O acidente em um dos quatro reatores da usina liberou grandes quantidades de material radioativo, que se deslocou a grandes distâncias pelas correntes de ar.

Em meio ao desastre, as pessoas deixaram muitas coisas para trás – inclusive animais de estimação. Nos dias seguintes ao acidente, equipes responsáveis por esvaziar a área procuraram esses animais abandonados para matá-los, e impedir que a radioatividade se espalhasse levada por eles. Mas alguns cachorros conseguiram escapar. É o que mostra um estudo publicado nesta sexta (3) na revista Science Advances.

Pesquisadores dos Estados Unidos, da Polônia e da Ucrânia analisaram o DNA de 302 cachorros de três populações diferentes: um grupo que vive ao redor da usina; outro que vaga por ruas a 15 quilômetros de distância; e outro a 45 quilômetros, na cidade de Slavutych.

Eles descobriram que o primeiro grupo é geneticamente diferente das outras populações de cães – e seria, portanto, composto por descendentes dos cães que estavam na área no momento do acidente ou que se estabeleceram por lá pouco depois.

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O trabalho começou quando um dos autores, Timothy Mousseau, ecologista evolutivo da Universidade da Carolina do Sul (EUA), se juntou a um grupo de voluntários que forneceria atendimento veterinário a centenas de cães que moram em uma zona de acesso limitado em Chernobyl – uma área de 2,6 quilômetros quadrados ao redor da usina. Ao longo de três anos, antes da invasão da Ucrânia pela Rússia, Mousseau e seus colegas viajaram até o local para coletar amostras de sangue dos animais.

Os pesquisadores compararam o genoma dos 300 cachorros ao material genético de outros 200 que vivem nas ruas da Ucrânia e de 12 países próximos. Assim, a equipe descobriu que os animais que moram nas proximidades da usina têm material genético marcadamente diferente do encontrado nos outros cães – e estiveram isolados de outras populações por décadas. Ou seja: os cachorros da área conseguiram sobreviver e procriar com algum sucesso mesmo expostos à radiação.

Por enquanto, a equipe não sabe se os genomas são diferentes porque foram alterados pela radiação proveniente da usina ou porque os cães ficaram relativamente isolados na área – e indivíduos aparentados, geneticamente semelhantes, cruzaram entre si por décadas.

Outra possível explicação está na sobrevivência de indivíduos com características genéticas que conferem maior resistência à radiação – e na transmissão desses genes para as gerações descendentes.

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Esse é o primeiro estudo genético de qualquer grande mamífero na área ao redor de Chernobyl – e o primeiro passo para entender como os cachorros se adaptaram ao local. “Tivemos que caracterizar essas diferentes populações como o primeiro passo necessário para fazer o experimento que queremos realizar a seguir, que é descobrir como [os cães de Chernobyl] sobreviveram neste ambiente hostil de radiação, temperaturas frias e comida limitada”, disse a geneticista Elaine Ostrander, uma das autoras do estudo, à revista New Scientist.

Os cientistas acreditam que os resultados da investigação poderão ajudar na compreensão dos efeitos da exposição humana à radiação a longo prazo e a identificar variantes genéticas que aumentam a resistência ao câncer, por exemplo.

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