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Covid-19: vacina Sputnik V tem 91,6% de eficácia, apontam testes de fase 3

Resultados mostram boa proteção em idosos mesmo após a primeira dose. Por aqui, laboratório busca aprovação da Anvisa para produzir imunizante.

Por Bruno Carbinatto
Atualizado em 2 fev 2021, 19h27 - Publicado em 2 fev 2021, 18h14

O Instituto Gamaleya de Pesquisa, da Rússia, divulgou nesta terça-feira (2) os resultados parciais da fase três de testes da sua candidata a vacina contra Covid-19, a Sputnik V. Os dados foram publicados no periódico científico The Lancet e mostram uma taxa de eficácia de 91,6%.

Participaram da análise quase 20 mil voluntários recrutados em Moscou, Rússia, entre os quais 14.964 tomaram a vacina e 4.902, um placebo. Houve 78 casos de Covid-19 identificados entre os participantes: 62 no grupo placebo e 16 no grupo dos imunizados, o que equivale a uma eficácia de 91,6%. Além disso, não houve nenhum caso grave da doença em quem recebeu a vacina, o que confirma a tendência de termos vacinas que previnem a progressão da doença para casos mais sérios, como acontece com a Coronavac, por exemplo.

Um dos pontos mais positivos do estudo é que ele incluiu um subgrupo de mais de 2 mil idosos (pessoas com mais de 60 anos) e a eficácia se manteve alta, na casa dos 90%. Uma das preocupações sobre as vacinas já aprovadas e usadas é quanto elas podem fornecer proteção em pessoas mais velhas, cujos sistemas imunológicos não são tão fortes quanto o de pessoas jovens.

O regime de doses testado foi de duas aplicações, separadas por um intervalo de 21 dias – é nesse cenário em que a eficácia foi calculada. Mas os dados também indicam que a proteção pode ser satisfatória 20 dias depois da primeira aplicação, embora próximos estudos vão confirmar ou não se apenas uma dose é realmente eficaz. Além disso, não houve efeitos colaterais graves identificados, apenas leves, como sintomas gripais, dor de cabeça e dor no local de aplicação.

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A análise é interina (parcial), e o monitoramento de segurança e eficácia da vacina continua. Espera-se que, no final, os números contem com dados de mais de 40 mil pessoas.

A eficácia da Sputnik V chama atenção principalmente por se aproximar dos resultados dos imunizantes da Pfizer e da Moderna (ambos com mais de 90%), que são vacinas de mRNA, uma tecnologia recente e, aparentemente, bastante eficaz de produzir vacinas. A vacina do instituto russo, no entanto, utiliza uma outra tecnologia, a de vetores virais. É a mesma técnica empregada nos produtos da Universidade de Oxford/Astrazeneca e na vacina da Johnson&Johnson, que apresentaram eficácias menores, apesar de bastante satisfatórias, em seus testes finais: 70% e 66%, respectivamente.

A tecnologia de vetor viral se baseia em utilizar um outro vírus inofensivo em humanos como matéria prima do imunizante. Esse vírus é geneticamente modificado para carregar um pedacinho do Sars-Cov-2 consigo, estimulando uma resposta imunológica que se lembrará daquela proteína em caso de uma infecção pelo coronavírus real. As vacinas testadas que utilizam essa tecnologia empregam vírus do tipo adenovírus, que causam resfriado comum em chimpanzés ou humanos.

Mas a Sputnik V tem uma diferença se comparada a outras vacinas que utilizam essa tecnologia: as duas doses carregam adenovírus diferentes uma da outra. Essa estratégia busca driblar um possível problema das vacinas de vetor viral: como os adenovírus circulam entre humanos e causam resfriado comum, é possível que pessoas já tenham tido contato com esses vírus (ou “primos” parecidos) e criado imunidade prévia contra eles.

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Nesse caso, o sistema imunológico do vacina pode atacar o vetor e diminuir a eficácia geral da vacina; usando dois adenovírus diferentes, reduz-se as chances de isso acontecer. Acredita-se, embora ainda seja uma hipótese, que esse fator possa explicar a eficácia mais alta.

A Sputnik V já foi aprovada para uso em diversos países, incluindo não só a Rússia, que já aplicava o imunizante antes dos resultados publicados em parcelas específicas da população, mas também diversas nações latino-americanas, como a Argentina, Paraguai, Bolívia e Venezuela. No Brasil, o laboratório União Química busca a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para fazer testes de fase 3 no país. Essa etapa é necessária porque, segundo as regras atuais da Anvisa, só se pode aprovar uma vacina se ela incluir em seus testes voluntários brasileiros, o que não ocorreu com a Sputnik V (os voluntários foram todos russos). A empresa tem um acordo com o Instituto Gamaleya para transferência de tecnologia e poderá produzir a vacina em território nacional se ela eventualmente for aprovada.

Diferentemente das vacinas de mRNA, a Sputnik V pode ser conservada em temperatura de geladeira, o que a torna uma candidata mais adequada para o Brasil, que possui uma rede de frio no sistema público de saúde capaz de armazenar suas doses.

Os resultados foram recebidos satisfatoriamente bem entre a comunidade científica, especialmente porque foram publicados em um periódico prestigiado e revisado por outros pesquisadores antes de se tornar público. Anteriormente, no entanto, a vacina vinha sido vista com desconfiança, especialmente porque havia poucos dados divulgados sobre sua eficácia e efeitos colaterais. Em um comentário a parte publicado na The Lancet, os pesquisadores Ian Jones, da  Universidade de Reading (Reino Unido) e Polly Roy, da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, que não participaram da equipe da Sputnik, elogiaram os resultados do instituto russo.

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“O desenvolvimento da vacina Sputnik V foi criticado por pressa inapropriada, pela busca de ‘atalhos’ e pela falta de transparência. Mas os resultados relatados aqui são claros e o princípio científico da vacinação foi demonstrado, o que significa que outra vacina pode agora se juntar à luta para reduzir a incidência da Covid-19”, escrevem.

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