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Esse cara pode ter sido o ancestral da humanidade inteira

O Homo naledi encaixa-se perfeitamente como um elo entre o australopiteco e o Homo erectus. E isso é mais importante do que parece.

Por Alexandre Versignassi
Atualizado em 31 out 2016, 19h02 - Publicado em 10 set 2015, 12h30

A história da nossa espécie tem um buraco. A teoria mais aceita é a de que somos descendentes dos australopitecos – macaquinhos bípedes e frágeis, que na fase adulta tinham a compleição física de uma criança de 5 anos. Eles viveram há 3 milhões de anos, e, ao que tudo indica, não eram muito mais brilhantes que um chimpanzé. O marco seguinte da evolução é o Homo erectus, de 1,8 milhão de anos atrás. Ele já é praticamente um Homo sapiens, um homem moderno. Chegava a 1,70 m e tinha feições humanas o bastante para passar despercebido se botasse um terno e fosse passear na Avenida Paulista. Além disso, era um gênio: dominava o fogo melhor do que você (já que sabia acender churrasqueira sem fósforo, coisa que você não faz), e desenvolvia armas que, para a realidade da época, equivaliam a caças stealth – pontas de lança capazes perfurar o couro de uma gazela das savanas africanas, seu habitat natural. E ele gostava de viajar também. Muitos erectus saíram da África. Os que foram para a Europa e fincaram raízes por lá evoluíram até se tornar uma versão alternativa de sapiens: o neandertal – que tinha até um cérebro maior que o nosso, ainda que não soubesse usá-lo tão bem. Outros erectus popularam a Ásia, dando origem a vários tipos de hominídeo que não vingaram, e acabaram extintos – como também aconteceria com o neandertais. Os erectus que se deram bem mesmo foram os que ficaram na África, porque há 200 mil anos eles originaram você, o Homo sapiens

Bom, o fato é que que tem alguma coisa faltando nessa história: como é que um macaquinho de um metro como o australopiteco deu um salto evolutivo e virou, de cara, um glorioso erectus?

O único primata prós-australopiteco que a ciência considerava como ancestral direto do erectus (e de nós) era o Homo habilis, de mais ou menos 2,5 milhões de anos atrás. Só tem um problema: o habilis (que ganhou esse nome porque, aparentemente, fabricava ferramentas) sempre esteve muito mais para australopiteco do que para erectus. O buraco, na prática, continuava basicamente o mesmo. Faltava um elo melhor ali.

Mas só até agora, porque na última quarta-feira os paleontólogos Lee Berger e Paul Dirks, que trabalham em universidades da África do Sul, descobriram fósseis de uma nova espécie do gênero Homo, o nosso gênero. Batizado de Homo naledi (pronuncia-se “naledí”), ele é basicamente um híbrido de habilis com erectus – com feições que mesclam características de primatas mais antigos com traços definitivamente humanos, como mostra a concepção artística lá em cima, feita com base em um crânio quase completo. E viveu há 2 milhões de anos, justamente no vácuo temporal que separa o habilis do erectus. Ou seja: ele pode ser um dos elos perdidos que faltavam à nossa evolução. “Pode ser” porque nada impede que o naledi seja só uma linhagem paralela (como é o caso dos próprios neandertais, que não são nossos ascendentes, mas meros primos).

De qualquer forma, a aparência desse hominídeo, encontrado numa rede de cavernas perto de Joanesburgo, indica que, sim, a possibilidade de ele ser nosso ancestral direto é grande. Se for isso mesmo, vale lembrar uma curiosidade matemática. Os geneticistas sabem que, se você voltar no tempo o bastante (alguns milhares de anos), todos os seres humanos vivos naquela época, e cujos descendentes chegaram até aqui, sem quebra na linhagem, pode ser considerado como ancestral comum da humanidade inteira – um único sujeito que é tatata(…)tataravô ao mesmo tempo de você, da Angela Merkel, de Jesus Cristo, enfim, de todos os humanos que passaram pela Terra alguns milhares de anos depois dele. Essa regra naturalmente, se estende até os hominídeos (e até as bactérias de 3 bilhões de anos atrás, se você puxar a árvore genealógica o bastante). Sendo assim, o dono do crânio ali em cima pode ser do próprio Adão em pessoa (ou “em hominídeo”, se preferir). Mais especificamente, de um dos muitos adões que construíram a história do gênero Homo na face da Terra. Uma história que continua sendo escrita. Agora, por você.

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