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Tecido humano preservado da Primeira Guerra pode dar pistas sobre pandemia de 1918

Pesquisadores da Alemanha sequenciaram o genoma do vírus causador da gripe espanhola, o que deve ajudar a elucidar questões sobre sua origem e evolução.

Por Carolina Fioratti
Atualizado em 21 Maio 2021, 18h23 - Publicado em 21 Maio 2021, 18h11

Até a chegada da pandemia de Covid-19, o sequenciamento de genomas era um tema pouco citado fora do meio científico. Agora, muito se fala sobre esse método que frequentemente ajuda os cientistas a revelar uma nova variante do vírus Sars-CoV-2. O sequenciamento não só permite que os pesquisadores acompanhem a evolução do patógeno como também traz pistas sobre seu surgimento e até mesmo quando e como ele começou a infectar humanos.

Fazer esse acompanhamento é tarefa diária para os pesquisadores de 2021. Entretanto, não se pode dizer o mesmo sobre os que viveram a gripe espanhola, entre 1918 e 1920. Pelas condições da época, o vírus influenza A (subtipo H1N1) – o mesmo que assustou o planeta em 2009 – não pôde ser tão bem explorado.

Por sorte, restos mortais de pessoas que faleceram em decorrência da doença foram bem conservados. Isso permitiu que, hoje, cientistas conseguissem sequenciar o genoma do vírus – juntando, assim, pistas sobre a pandemia que matou cerca de 50 milhões de pessoas no passado. 

Pesquisadores do Instituto Robert Koch, na Alemanha, analisaram 13 amostras de tecido humano preservadas de pessoas que viveram entre 1900 e 1931. Duas delas eram soldados alemães na faixa dos 18 anos que morreram em Berlim, vítimas de uma até então nova cepa de Influenza, que apareceu em 1918.

Os jovens faleceram na mesma época. Durante todos estes anos, seus pulmões foram guardados em formalina (um tipo de conservante) no Museu de História da Medicina de Berlim. A partir disso, os cientistas puderam sequenciar parte do genoma do vírus que os matou. O estudo, que ainda não foi revisado por pares (ou seja, por outros cientistas), está disponível no repositório bioRxiv.

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Os pesquisadores também encontraram sinais do patógeno em uma mulher que morreu em Munique em algum momento de 1918. O vírus teve seu genoma inteiramente sequenciado – foi o terceiro do tipo, e o primeiro genoma completo a ser obtido fora da América do Norte.

Antes de saber quais dados os genomas nos trazem, é importante relembrar rapidamente sobre casos de sequenciamento genético do H1N1 que ocorreram no passado. Um deles foi feito por cientistas americanos no início da década de 2000, que retiraram amostras do corpo de uma mulher que ficou conservado sob o solo congelado do Alasca. O segundo foi feito em 2013, graças a um tecido de autópsia guardado no Instituto de Patologia das Forças Armadas, nos EUA.

Por muito tempo, os cientistas especularam se o vírus causador da gripe de 1918 teria se originado em pássaros e, a partir daí, adaptado-se para atingir humanos de forma mais severa entre a primeira e a segunda onda da pandemia. Nesse caso, teria ocorrido uma mutação em um gene específico do vírus que trocaria a proteína glicina (comumente vista em vírus de gripe aviária) por ácido aspártico (característico de humanos).

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Contudo, essa teoria pode ter caído por terra. Acontece que os jovens alemães analisados recentemente morreram durante a primeira onda da doença, mais fraca. Mas, mesmo assim, foi detectado ácido aspártico em seus genomas, sugerindo que a mutação pode ter ocorrido mais cedo do que se pensava. 

Enquanto isso, as cepas relatadas em 2000 e 2013 parecem ter matado suas vítimas em um estágio avançado da pandemia. Nelas, os cientistas encontraram mutações capazes de driblar as defesas antivirais inatas do corpo humano, o que permitiu uma ação mais potente do vírus. Já os jovens alemães, apesar dos sinais de ácido aspártico no genoma do H1N1, ainda carregavam um patógeno mais similar àquele encontrado em aves. Esses dados podem ajudam a traçar a evolução do vírus.

Quanto aos genomas das mulheres congeladas, os cientistas perceberam que a cepa do Alasca era muito mais ativa na função de replicar o seu genoma in vitro (em laboratório). Para chegar a isso, os pesquisadores usaram os genes preservados para ressuscitar o complexo de polimerase do vírus.

Isso significa, basicamente, que eles fizeram o Influenza voltar a ativa. Calma, não se assuste: eles não reconstituíram o vírus inteiro, então não há risco do Influenza escapar do laboratório e iniciar uma nova pandemia.

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