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Alexandre Versignassi

Por Alexandre Versignassi Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Blog do diretor de redação da SUPER e autor do livro "Crash - Uma Breve História da Economia", finalista do Prêmio Jabuti.

Como o tomate ficou com preço de ouro

O preço do tomate é um desastre. Um desastre aéreo. Não pela gravidade da coisa, mas pela causa: o responsável foi uma “combinação de fatores” – a explicação clássica para as quedas de avião. O primeiro fator é o mais inusitado: um dos culpados pelo tomate caro demais é o tomate barato demais. Vamos voltar […]

Por Alexandre Versignassi Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 21 dez 2016, 09h49 - Publicado em 9 abr 2013, 17h14

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O preço do tomate é um desastre. Um desastre aéreo. Não pela gravidade da coisa, mas pela causa: o responsável foi uma “combinação de fatores” – a explicação clássica para as quedas de avião.

O primeiro fator é o mais inusitado: um dos culpados pelo tomate caro demais é o tomate barato demais.

Vamos voltar quatro anos no passado, quando o quilo do tomate a R$ 10 ainda era algo tão distante quanto o teletransporte. Uma caixa com 25 quilos estava saindo por R$ 40 nos centros de distribuição. Era um preço do tipo “bom para ambas as partes”: baixo o bastante para ninguém reclamar e alto o suficiente para fomentar a produção. Os agricultores aumentaram as áreas de cultivo de tomate. A oferta bombou. Mas aí veio o primeiro revés: a demanda não acompanhou. E o preço foi pras cucuias: em 2010 já tinha caixa a R$ 8.

Ótimo para uma das partes, a que compra. E péssimo para a outra. Tinha agricultor jogando caixa de tomate fora – se gastassem com o transporte delas ficariam no prejuízo. Era o crash tomateiro. Depois dessa, as fazendas diminuíram as áreas de plantio de tomate. Natural.

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E a oferta minguou. Mas foi bom: com menos tomate no mercado, o preço voltou a um patamar mais aceitável para quem planta – uns R$ 30 a caixa. Só que aí aconteceu algo ruim: uma safra boa. Pois é, a economia agrícola às vezes funciona de cabeça pra baixo.

Uma safra boa pode ser algo ruim quando começa a sobrar produto no mercado. Começou a sobrar tomate. E os preços afundaram – de volta para a faixa dos R$ 10; um valor além da linha vermelha, do ponto de vista dos agricultores. E tome mais prejuízo, mais caixa de tomate abandonada e mais frutos apodrecendo na fazenda, já que nem valia a pena colher.

E o o que aconteceu? Diminuíram mais ainda as áreas de plantio, claro. Pra que gastar dinheiro plantando o que não dá retorno? Em Goiás, por exemplo, reservaram 40% menos terras para o tomate. É do jogo. Isso diminuiria a oferta, faria o preço subir, e o lucro dos produtores voltaria.

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Só que entrou um elemento totalmente inesperado nessa história: um ataque de bactérias.

As bactérias que infestam os tomateiros crescem e se multiplicam quando chove demais. Choveu demais. O índice de mortalidade da tomatada aumentou. E a produção despencou: algumas fazendas colheram só um terço do que esperavam.

Tudo isso numa realidade em que as áreas de plantio já estavam bem menores só podia dar numa coisa: o tomate de ouro. Ele ficou raro a ponto de o preço da caixa bater em R$ 150 nos centros de distribuição (dá R$ 6 o quilo, o que nas feiras e supermercados acaba virando R$ 10 fácil); um aumento de 1.775% comparado com 2010. Foi o que alimentou um momento histórico: a estreia dos hortifrutigranjeiros no mundo dos memes.

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Mas ok. Foi uma situação atípica. E o tomate a preço de ouro é justamente quem vai trazer de volta o tomate a preço de tomate: vai estimular os produtores a aumentar as áreas de cultivo. E a tempestade ficará pra trás.

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Mas não. Isso não vai ser a salvalção da lavoura.

O preço do tomate pode ter sido circunstancial. Mas a inflação dos alimentos – e de todas as outras coisas – não. Ela não tem nada de circunstancial. É generalizada. E contínua. E só existe porque hoje há mais dinheiro em circulação do que o país dá conta. Ou seja: mais do que a nossa capacidade de produzir coisas para serem compradas com esse dinheiro. A culpa, em última instância, não é de quem produz o tomate (ou a pizza, ou as quitinetes de R$ 1 milhão). É de quem produz o dinheiro: o governo.

A verdade é que só políticas econômicas desastradas conseguem causar inflações de dois dígitos – e a inflação dos alimentos fechou 2012 em 14%. Mas não espere que o governo assuma isso. Como escreveu Milton Friedman, meu economista preferido:

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“Nenhum governo aceita que é o responsável por uma inflação. Sempre arranjam alguma desculpa – comerciantes gananciosos, sindicatos turrões, consumidores compulsivos, árabes, a chuva. Sem dúvida que comerciantes são gananciosos, sindicatos são duros, consumidores são compulsivos, árabes aumentam o preço do petróleo e, de vez em quando, chove mesmo. Todos esses agentes têm como produzir preços altos para certos itens; mas não são capazes de fazer isso com tudo o que existe. Eles até podem causar subidas e descidas temporárias na taxa de inflação. Mas não têm como dar início a uma inflação contínua. Por um motivo simples: nenhum desses supostos culpados pela inflação tem as impressoras que produzem aquilo que a gente carrega na carteira.”

Esse texto do Friedman tem quase 40 anos. E continua mais atual do que qualquer meme.

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