Inteligência artificial não vai mais defender um réu em julgamento nos EUA
Empresa americana diz ter recebido "ameaças" e desiste da experiência - que provavelmente era só uma jogada de marketing. Veja por quê.
Empresa americana diz ter recebido “ameaças” e desiste da experiência – que provavelmente era só uma jogada de marketing. Veja por quê.
No começo de janeiro, a empresa DoNotPay ganhou as manchetes do mundo com uma promessa: ela iria usar uma inteligência artificial para defender um réu no tribunal, em um processo por multa de trânsito. Essa pessoa, cliente da DoNotPay, receberia instruções da IA por meio de fones de ouvido – que então repetiria ipsis litteris no julgamento, marcado para o dia 22 de fevereiro.
Mas agora, três semanas depois, a DoNotPay mudou o discurso: está desistindo da empreitada, pois teria recebido ameaças de processo, vindas de “promotores estaduais”, relacionadas ao uso da IA. No começo de janeiro, ela não parecia nada preocupada – afirmou que, como as cortes americanas permitem aparelhos auditivos, o réu poderia usar um par de fones AirPods.
O fundador e CEO da empresa, Joshua Browder, chegou a oferecer US$ 1 milhão para um advogado que topasse usar fones de ouvido, e repetir instruções de uma IA, na Suprema Corte dos EUA. Agora, tudo isso foi deixado de lado – e a DoNotPay diz que não irá mais tentar levar uma IA aos tribunais.
A empresa, que existe desde 2015, oferece serviços automatizados para quem precisa questionar multas de trânsito, entrar com determinados tipos de ação judicial ou lidar com o SAC de empresas. A empresa diz que sua inteligência artificial é baseada no GPT-3 (Generative Pre-Trained Transformer), a mesma IA usada no popular robô ChatGPT.
Mas, na prática, o atendimento da DoNotPay é totalmente diferente de conversar com o ChatGPT. Você entra no site dela, seleciona o seu problema (que pode ir desde “anular meu casamento” a “roubo de identidade”) numa lista, paga US$ 18 e aí recebe instruções passo-a-passo, com documentos pré-preenchidos para usar no seu caso. Dependendo do problema, a empresa também oferece bots. A DoNotPay diz ter uma taxa de sucesso entre 65% e 70%.
Talvez não seja bem assim. Tanto no Better Business Bureau quanto no TrustPilot, duas plataformas de review de serviços, a grande maioria de avaliações da empresa são muito ruins – no Better Business Bureau, a nota dela é 1,7 (de 5 pontos), e no TrustPilot, 62% das pessoas deram à DoNotPay apenas uma estrela, que significa péssimo.
“Os documentos são tão genéricos que é melhor você pesquisar um modelo no Google”, diz um suposto cliente. “Esperei 7 dias e nada se resolveu, vou ter de ligar e resolver eu mesmo”, afirma outro. Também há diversos relatos sobre supostas cobranças indevidas, da DoNotPay, no cartão de crédito dos clientes. Em suma: ela está mais próxima de práticas comerciais questionáveis do que na vanguarda da IA.