Quando um grupo se manifesta pela supremacia branca ou um torcedor joga uma banana para um jogador em um campo de futebol, está declarando abertamente o seu racismo e tornando bem evidente o que pensa sobre minorias.
Mas existem as chamadas microagressões – atitudes mais sutis, como aqueles comentários racistas, intencionais ou não, que pessoas fazem em tom de brincadeira entre amigos. Quando confrontados, os autores muitas vezes dizem que é só uma “piada inofensiva”, que “jamais teriam preconceito” e que “o mundo está ficando muito chato”. Mas sabe aquele ditado de que toda brincadeira tem um fundo de verdade? Então.
Acontece que essas declarações não são tão inofensivas assim – não só porque realmente podem ofender seu alvo, mas também porque, segundo um estudo da Universidade de Washington, revelam preconceitos bem arraigados, quer seus autores estejam cientes disso ou não.
Os autores acreditam que o estudo seja o primeiro do tipo a explorar microagressões na perspectiva daqueles que as cometeram e sugere que os brancos que são mais propensos a cometê-las também são mais propensos a abrigar algum grau de sensação negativa em relação aos negros.
“Nossos resultados oferecem validação para pessoas de cor quando experimentam microagressões. Suas reações não podem simplesmente ser descartadas como loucas, irracionais ou sensíveis”, disse em comunicado um dos autores, Jonathan Kanter, professor de psicologia da universidade de Washington.
O estudo
A pesquisa, publicada no Journal Race and Social Problems, focou no racismo contra negros. Os autores aplicaram um questionário de 56 itens a um grupo de 33 estudantes negros e 118 brancos de uma universidade pública nos Estados Unidos.
O questionário solicita ao entrevistado branco que considere a probabilidade de pensar ou dizer declarações específicas em cinco cenários diferentes envolvendo interações com pessoas negras, como uma conversa sobre eventos atuais (a violência policial e o desemprego, por exemplo), a participação em uma oficina sobre diversidade ou ouvir música.
Para os entrevistados negros, os cenários e as questões foram adaptados para avaliar se já experimentaram racismo nessas situações e se consideram racistas as declarações mostradas aos estudantes brancos.
Mais da metade dos brancos disseram que pensariam ou diriam coisas como “Todas as vidas são importantes, e não apenas vidas negras”, e 30% disseram “não penso em negros como pretos”. E mais da metade dos entrevistados negros identificaram cada uma dessas declarações como racistas.
E os alunos brancos que se disseram mais propensos a fazer declarações microagressivas também eram significativamente mais propensos a marcar mais alto em todas as outras medidas de racismo e preconceito.
A declaração que produziu a maior correlação estatística com outras medidas de racismo veio do cenário da “oficina de diversidade”, no qual uma turma discute o privilégio branco. Embora apenas cerca de 14% dos entrevistados brancos tenham dito que provavelmente pensariam ou diriam “Muitas minorias são muito sensíveis”, a declaração foi a que apresentou a maior correlação com sentimentos negativos em relação aos negros.
Entendendo os dados
Os autores fizeram questão de deixar claro que as correlações entre declarações e atitudes reveladas pelo estudo são médias estatísticas, e os resultados não abordam as intenções ou sentimentos das pessoas caso a caso. Ou seja, “isso não significa que se você se envolver em uma microagressão tem necessariamente sentimentos racistas”, disse Kanter.
“Mas o estudo revela que, independentemente da intenção por trás de uma microagressão ou dos sentimentos da pessoa que a pronunciou, é razoável que uma pessoa negra se sinta ofendida. Em média, se você se engajar em uma microagressão, é mais provável que tenha sentimentos mais frios em relação aos negros e que, quer tenha ou não intenção, você participou de uma experiência de racismo para uma pessoa negra”, completa.
Racismo hoje
Kanter diz que as pessoas brancas muitas vezes acham que estão imunes a comportamentos racistas por não pronunciarem insultos raciais e talvez até estarem familiarizadas com a questão e defenderem a justiça social.
“Pode surpreender muitas pessoas brancas que seus comportamentos e atitudes estão sob escrutínio”, disse. E completou: “A forma como estamos olhando para o racismo está mudando. Agora podemos ver e combater formas mais sutis em que não focávamos antes porque o racismo explícito estava chamando muita atenção”.
É verdade que o tamanho e a localização da amostra do estudo limitam as generalizações que podem ser feitas. Mas a ideia dos autores é que o questionário seja aplicado em outros lugares e possa ser adaptado para outras minorias raciais e étnicas, permitindo assim compreender melhor o racismo e desenvolver ferramentas educacionais para combatê-lo. A pesquisa já foi aplicada na Universidade de Washington, por exemplo, e os primeiros resultados são muito semelhantes aos relatados no estudo.