(Se você tem alguma dúvida de que a literatura é um dos fatores mais importantes para definir a identidade de um povo, esse post é para você – caso esteja convencido disso, continue aqui mesmo assim)
Quando estava na escola, minha professora de Literatura pediu que escolhêssemos um livro do Érico Veríssimo para analisar ao longo do semestre. Ainda era abril e, apesar de já fazer algum frio nesta época do ano no Rio Grande do Sul, o termômetro naquele dia passava dos 25 graus. Lembro de ir à biblioteca em busca do primeiro volume de O Tempo e o Vento suando e poucas páginas depois de começar a leitura, sentir uma leve friagem ao ler as passagens em que Érico narra o vento Minuano cortando as noites na estância da família Terra – “Noite de ventos, noite de mortos”.
Algum tempo depois, essa mesma professora sugeriu que lêssemos Graciliano Ramos. Pedi o livro Vidas Secas a um amigo que me emprestou com a seguinte recomendação: “Até a metade você vai conseguir ler tranquilamente, mas depois é melhor ter uma garrafinha de água junto contigo”. De fato, durante a leitura senti a secura da cachorrinha Baleia e a apatia dos filhos de Fabiano dentro da boca, não deixando uma só gota de saliva descer pela garganta. Só consegui chegar ao fim seguindo o conselho do meu amigo.
Anos mais tarde, antes de visitar a Bahia, decidi que precisava ler Gabriela, Cravo e Canela. Em menos de 50 páginas, já tinha absorvido a cadência do sotaque mesmo sem ouvi-lo, sentia vontade de comer tapioca, acarajé, moqueca e de tomar uma(s) no bar do Nacib como se estivesse na Ilhéus do início do século.
Os livros nos apresentam a lugares que, mesmo quando reais, talvez nunca visitaremos, nos transportam para enredos que não podemos mudar e nos deixam íntimos de personagens cujos sotaques, hábitos, personalidades e aparências são adaptações de alguém, releituras de várias pessoas coladas em um determinado tempo e espaço.
É essa junção de elementos que faz a obra de Jorge Amado ser sinônimo de Bahia e a de Érico Veríssimo de Rio Grande do Sul, é isso que faz a literatura ser um dos mais importantes símbolos para a formação da identidade cultural de um lugar.
Pensando nisso, selecionamos os 27 autores mais representativos de cada estado brasileiro. Nossa seleção se baseou em número de prêmios ganhos, participações em Academia de Letras de suas respectivas federações, cobrança nos vestibulares locais, número de traduções para línguas estrangeiras e, é claro, se o autor é reconhecido por sintetizar a identidade de cada estado — não sendo determinante seu local de nascimento.
SUL
– Rio Grande do Sul: Érico Veríssimo (O Tempo e o Vento, 1949)
– Santa Catarina: Cruz e Sousa (Broquéis, 1893)
– Paraná: Dalton Trevisan (O Vampiro de Curitiba, 1965)
NORDESTE
– Paraíba: Ariano Suassuna (O Auto da Compadecida, 1955)
– Pernambuco: Clarice Lispector (A Hora da Estrela, 1977)
– Rio Grande do Norte: Madalena Antunes (Oiteiro – Memórias de uma sinhá-moça, 1958)
– Bahia: Jorge Amado (Gabriela Cravo e Canela, 1958)
– Sergipe: Vladimir Souza Carvalho ( Feijão de Cego, 2009)
– Ceará: Rachel de Queiroz (O Quinze, 1930)
– Alagoas: Graciliano Ramos (Vidas Secas, 1938)
– Piauí: Carlos Castello Branco ( O Arco de Triunfo, 1959)
– Maranhão: Aluísio Azevedo (O Cortiço, 1890)
NORTE
– Pará: Olga Savary (Sumidouro, 1977)
– Amazonas: Milton Hatoum (Dois Irmãos, 2002)
– Rondônia: Otávio Afonso (Cidade Morta, 1980)
– Tocantins: José Concesso (Meu Primeiro Picolé, 2004)
– Acre: Márcio Souza, (Galvez, Imperador do Acre, 1976)
– Amapá: Manoel Bispo Corrêa (Cristais das Horas, 1978)
– Roraima: Nenê Macaggi (Água Parada, 1933)
SUDESTE
– São Paulo: Mário de Andrade (Macunaíma, 1928)
– Rio de Janeiro: Machado de Assis (Memórias Póstumas de Brás Cubas, 1881)
– Minas Gerais: Guimarães Rosa (Grande Sertão Veredas, 1956)
– Espírito Santo: Rubem Braga (50 Crônicas Escolhidas, 1951)
CENTRO-OESTE
– Mato Grosso do Sul: Miguel Jorge (Veias e Vinhos, 1981)
– Mato Grosso: Manoel de Barros (Livro sobre Nada, 1996)
– Goiás: Cora Coralina (Poemas dos Becos de Goiás e estórias mais, 1965)
– Distrito Federal: Renato Russo (Faroeste Caboclo, 1987)