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Pesquisadoras brasileiras contam sobre o seu trabalho e os desafios da carreira.
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Desirée Schuck testou drogas que vencem a malária pelo relógio

Os protozoários que causam a doença usam a melatonina – o hormônio do sono – como sinal para realizar um ataque sincronizado aos nossos glóbulos vermelhos. A #MulherCientista desta semana descobriu como confundi-los.

Por Maria Clara Rossini
Atualizado em 6 set 2024, 09h28 - Publicado em 13 ago 2021, 18h49

Imagine que você seja um estudante de biologia que ama estudar DNA. Em qual área você deve se especializar? Para Desirée Schuck, caloura do curso, o caminho lógico era ser geneticista. Mas aí veio a surpresa logo no início da faculdade: genética tem muito mais a ver com números e computação do que moléculas e laboratório. O que ela queria, na verdade, se chama biologia molecular

Enquanto os geneticistas se preocupam com a matemática da distribuição de características hereditárias pelas populações de seres vivos, os biólogos moleculares investigam o hardware da vida: a molécula de DNA em si e a maneira como o código dela se traduz na fabricação de proteínas no interior das células.

A pesquisadora fez seu primeiro estágio estudando genes de regeneração em planárias – aqueles animais que podem ser cortados ao meio para virar dois indivíduos diferentes. Ela não continuou com os bichinhos por muito tempo, mas foi com eles que aprendeu o que é o método científico e decidiu que queria ser pesquisadora.

Uma de suas principais pesquisas ocorreu no doutorado, realizado na USP. Natural do Rio Grande do Sul, ela se mudou para São Paulo para estudar o Plasmodium falciparum, parasita causador da malária. Esses protozoários passam por um ciclo de vida complexo dentro dos humanos.

Em determinado momento, eles infectam os glóbulos vermelhos – células sanguíneas que transportam oxigênio –, se multiplicam lá dentro e então causam a explosão de diversas células simultaneamente. Ao se libertarem, sobrecarregam o sistema imunológico.

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Pensa só: são milhares de microorganismos que permanecem sintonizados entre si, prontos para atacar no momento certo. Eles não têm relógio para organizar esse pequeno ato terrorista biológico, o que tornava a sincronia dos plasmódios um mistério para os cientistas. A pesquisadora Célia Garcia, orientadora de Desirée no doutorado, descobriu que o segredo estava no nosso próprio ciclo circadiano. Os parasitas detectam a presença do hormônio melatonina, que é liberado à noite. Esse é o despertador por trás da ação simultânea dos protozoários.

Conhecendo esse mecanismo, Desirée quis testar novas drogas que impedissem o protozoário de detectar a melatonina. Sem a explosão de várias hemácias de uma vez só, o sistema imunológico talvez conseguisse combater o parasita. Pensando nisso, a pesquisadora colocou os plasmódios em contato com moléculas parecidas com a melatonina. A ideia era que esses fakes se ligassem ao receptor do plasmódio, servindo como uma tampa para impedir que a molécula real se encaixe ali. 

Mas aí surgiu um desafio: como saber em qual fase do ciclo os parasitas estão? Desirée estava testando muitas moléculas diferentes, então não era viável olhar cada protozoário, um por um, no microscópio. Nesse momento, a pesquisadora resgatou o interesse antigo que tinha pelo DNA. Junto com outros pesquisadores, ela desenvolveu uma técnica para contar quantas moléculas de DNA existem na amostra. Quanto mais avançado o protozoário está em seu ciclo de vida, mais moléculas de DNA ele tem. Dessa forma, a cientista conseguia determinar se os plasmódios estavam na mesma fase ou não. Drogas contra a malária que empregam esse técnica estão sendo testadas em fase pré-clínica – isto é, ainda não começaram a ser aplicadas em humanos. 

Durante toda sua carreira acadêmica, Desirée trabalhou com diferentes técnicas de biologia molecular – além de ter criado uma inédita. Isso chamou a atenção da equipe de pesquisa e desenvolvimento (P&D) do Grupo Boticário, que a contratou como pesquisadora da empresa. Por lá, ela já investigou a criação de peles sintéticas e trabalhou até no desenvolvimento de órgãos em forma de chip.

(Por “chip”, entenda: trata-se de uma plaquinha que reúne células de vários órgãos em um lugar só. Assim é possível testar se um cosmético é alergênico para a pele ou para o olho ao mesmo tempo).

Tanto a pele sintética quanto os chips são técnicas alternativas que eliminaram os testes em animais. Desirée ainda faz pesquisas para avaliar o impacto dos produtos na vida marinha. Como alguns compostos atravessam a barreira da pele e chegam à corrente sanguínea, eles também podem acabar indo para o esgoto por meio do xixi. É importante garantir que os as moléculas presentes nos cosméticos não causem nenhuma desregulação hormonal nos peixes. Visando compartilhar essas pesquisas com o público, Desirée também liderou o projeto Beleza Transparente, site que reúne os estudos desenvolvidos por ela e sua equipe.

“Sempre pensei em ser professora acadêmica, mas estou feliz na minha área hoje. É muito bom ver o meu trabalho refletindo na ponta da cadeia. Fazer o teste em laboratório e depois ver uma legenda no rótulo do produto contando o que ele faz. Motiva muito a equipe”, conta a pesquisadora. Hoje, Desirée é gerente de segurança de produtos e métodos alternativos do Grupo Boticário.

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