Como se colocavam as legendas nos filmes antigamente?
Conheça o (complicado) processo de legendagem que durou de 1930 a 2010.
O cinema hollywoodiano falado surgiu em 1927, e chegou ao Brasil não muito tempo depois. A partir daí, surgiu a necessidade de traduzir os diálogos para um público que não falava inglês. Segundo José Augusto De Blasiis, consultor de pós-produção de cinema que trabalhou com legendagem analógica, o processo não mudou muito desde os anos 1930.
O primeiro passo é a pietagem: um técnico brasileiro assiste ao filme original e marca, no roteiro, o minuto e o segundo em que entra e sai cada fala. Então, o roteiro segue para o tradutor, que já leva em conta como as legendas aparecerão na tela: cada uma deve ter no máximo duas linhas e algo entre 34 e 36 caracteres.
A próxima etapa é fazer a arte das letras, imprimir as legendas em folhas brancas e filmar cada folha pelo número de frames equivalente à duração daquela fala. Essa câmera não usa um filme comum, mas um rolo de material chamado HC, de high contrast (alto contraste), que só registra preto ou branco, sem tons de cinza. Dessa forma, as legendas ficam padronizadas de uma cor só.
Esse material HC vai para uma máquina que corre as legendas em um filme virgem, jogando luz sobre as letras. Legal: agora temos uma fita de duração equivalente ao filme, com palavras em preto.
Neste ponto, temos três rolos de filme para cada longa-metragem: um com as imagens, um com o som e outro com a legenda. O passo final é gerar um negativo, para as palavras ficarem em branco, e então colar o rolo das legendas no rolo do filme.
As salas de cinema já recebiam os rolos de filmes legendados, daí era só rodar. Esse processo continuou até a década de 2010, quando os cinemas passaram a receber cópias digitais dos filmes (até então, eles ainda chegavam em rolos). Com a digitalização das salas de cinema, o processo de legendagem também se digitalizou.
Uma breve história das legendas no Brasil
A primeira técnica de tradução de filmes estrangeiros no Brasil foi a distribuição de folhetos com os diálogos em português. O filme era exibido na língua original, e os espectadores liam a tradução das falas. Isso só era viável enquanto os filmes tinham poucos diálogos, lá no final dos anos 1920.
Em 1929, o cinema sonoro se consolidou e os filmes passaram a ter mais diálogos – o que virou um problema para o público que dependia dos folhetos para entender o enredo. O filme Melodia da Broadway, de 1929, foi o primeiro a ter algumas legendas em português, só nas falas mais importantes. As legendas foram feitas em um laboratório brasileiro, de forma semelhante ao processo descrito acima. Essa era uma técnica experimental, e que não foi adotada inicialmente por ser muito trabalhosa.
Nesse período de transição para o cinema falado, a opção mais comum era intercalar as cenas com letreiros que explicavam o enredo – uma técnica herdada do cinema mudo. Em alguns casos, as cenas de diálogos eram cortadas do filme, deixando apenas o letreiro explicativo. Em outros, as cenas eram mantidas, deixando o filme mais extenso.
De toda forma, os filmes se tornaram menos atraentes e receberam muitas críticas do público. Foi aí, em 1930, que as produtoras passaram a adotar a técnica de Melodia da Broadway, com as legendas em português aparecendo na parte inferior da tela. Isso passou a ser feito para todos os diálogos da trama, e não apenas os principais.
A nova técnica, chamada inicialmente de letreiros sobrepostos, foi um sucesso de bilheteria, fazendo com que mais filmes fossem traduzidos dessa forma. Esse era um processo mais caro, mas que foi se instalando aos poucos e virou o padrão para filmes brasileiros.
Fonte: José Augusto De Blasiis, consultor de pós-produção de cinema; artigo “O início da legendagem de filmes no Brasil”, de Rafael de Luna Freire.
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