Se o elétron é negativo e o núcleo é positivo, por que o elétron não “cai”?
Esqueça o modelo do átomo como um Sistema Solar. O elétron não cai no núcleo porque nem sequer está órbita; a física quântica funciona de um jeito diferente.
É difícil, mas chegou a hora de ter uma conversa, caro leitor – uma conversa tão pivotal para sua compreensão do mundo quanto a sua primeira conversa sobre sexo. Respire fundo. Sabe aquele desenho do átomo que está em todos lugares, com um núcleo no meio e os elétrons rodando em volta como se fossem planetinhas de um Sistema Solar? Pois é, esqueça. Isso não existe. De fato, nós não fazemos a menor ideia de qual é a aparência de um átomo, porque não é possível vê-los em qualquer acepção familiar da palavra. Eles são muito menores que o comprimento de onda da luz visível.
Quando o neozelandês Ernest Rutherford descobriu, em 1911, que o átomo consistia em um núcleo minúsculo de carga elétrica positiva e uma enorme nuvem ao seu redor de carga negativa, o dinamarquês Niels Bohr usou esse insight para dar um dos primeiros passos na transição da física dita clássica (pré-século 20, baseada em Newton, Maxwell etc.) para a quântica.
Bohr percebeu que podia explicar certas propriedades dos átomos se partisse do princípio de que os elétrons ocupam órbitas fixas em torno do núcleo – e que eles precisam absorver uma quantidade fixa de energia para pular de uma órbita mais baixa para uma mais alta (ou emiti-la para realizar o trajeto oposto). A física quântica é como uma escada com degraus em vez de uma rampa.
Isso era estranho, porque o mundo macroscópico é um degradê contínuo. Não há nada que impeça um planeta de orbitar entre a Terra e Marte. Por que, então, as órbitas de elétrons haveriam de funcionar como uma pista de autorama, com caminhos pré-definidos? Por que os fenômenos se dão em saltos inteiros, e não transições graduais?
Quando Bohr fez sua quantização de órbitas, porém, ele já sabia das conclusões de Einstein sobre o efeito fotoelétrico, em 1905: a luz também é descontínua, vem em pacotinhos de energia chamados fótons. Perceba: era um momento revolucionário para física; estavam todos tateando uma novidade no escuro. Aparentemente, o mundo microscópico não funcionava de um jeito tão intuitivo.
O modelo de átomo de Bohr era um remendo da mecânica clássica, de Newton. Perceba que a Terra gira em torno do Sol sem cair nele, mesmo que haja uma atração gravitacional mútua. Portanto, o fato de que há uma carga negativa no elétron e uma positiva no núcleo não era, por si só, uma limitação à visão do átomo como um mini Sistema Solar. O defeito era outro: os cálculos indicavam que o elétron conseguiria manter-se em órbita por um tempo minúsculo antes de espiralar de encontro ao núcleo. Se é assim, como todos os átomos do mundo permanecem existindo sem colapsar?
Mas Bohr já sabia, nessa altura, que a visão de mundo de Newton não vale na escala microscópica. Que lá as coisas funcionam de outro jeito; seguem outras regras. Ele também sabia que seu modelo de átomo era provisório. Foi aí que chegaram Erwin Schrödinger e Werner Heisenberg.
Por volta de 1925, Heisenberg desenvolveu uma maneira de calcular as propriedades do mundo microscópico, – utilizando matrizes, que eram um recurso matemático novo para os físicos da época – que não fazia nenhuma pressuposição sobre como seria o átomo. Heisenberg adotou a postura de que bastava o cálculo prever o experimento. Que não está ao alcance do físico tentar interpretar, a partir da matemática, qual é a natureza das coisas que não podemos ver. Heisenberg se tornou uma espécie de pupilo de Bohr, que compartilhou dessa visão e abandonou o modelo planetário por uma alternativa mais honesta filosoficamente: modelo nenhum.
Já Schrödinger, na Áustria, afastado do círculo de Bohr, usou sua famosa equação para fazer as mesmas previsões que Heisenberg. Mas a equação de Schödinger, que se assemelhava às equações usadas para prever o comportamento de ondas da mecânica clássica, agradou os físicos de opinião oposta. Os físicos que acreditavam na capacidade das equações de explicar o que os átomos são, e não só de fornecer previsões experimentais corretas. Max Born concluiu que a equação de Schödinger permitia predizer a probabilidade de se encontrar um elétron em torno do núcleo do átomo.
Assim, se o leitor quiser uma visão realista do que é um átomo, essa é a melhor alternativa que a ciência contemporânea oferece: é possível imaginar que a região em torno do núcleo é uma nuvem de probabilidades, e que podemos apenas dizer com 70% ou 80% de chance que o elétron estará em algum lugar dessa nuvem em um dado momento. Essa interpretação da mecânica quântica é mais amigável que a de Heisenberg, que envolve simplesmente admitir que não temos como saber.