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A evolução em jogo

Um passatempo com palavras que lembra o desenvolvimento e a transformação das espécies.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h50 - Publicado em 31 mar 1998, 22h00

Luiz Barco

Dia desses recebi em casa a visita de um colega dos bons tempos do colégio. Como sempre acontece nessas ocasiões, falamos dos nossos sonhos de adolescentes e da importância que certos professores tiveram na construção e até na realização de alguns deles. Lembramos em especial do professor Victor Eisenmann, para nós o “Charutinho”, que, em meio a vigorosas baforadas, falava com entusiasmo sobre o seu time favorito e sobre a importância da matemática. O realce quase mágico que ele dava aos aspectos lúdicos da disciplina encantava-nos. Mesmo aqueles que abominavam tudo que tivesse qualquer referência a números respeitavam e queriam bem ao homem escondido no professor.

Foi em uma das aulas do Charutinho que eu ouvi falar pela primeira vez do reverendo Charles L. Dodgson (1832-1898). Embora não possa ser considerado um grande matemático, Dodgson imortalizou-se com o pseudônimo de Lewis Carrol, sob o qual escreveu, entre outras obras, Alice no País das Maravilhas.

Não são poucos os livros de brincadeiras matemáticas que exibem um curioso problema criado por Lewis Carrol – segundo consta, no Natal de 1877 – para distrair duas meninas que não tinham nada para fazer. O nome dado à brincadeira foi

cadeia de palavras. A idéia básica é transformar um vocábulo, como “ódio”, em outro, com o mesmo numero de letras, como “amor”. Isso deve ser feito trocando-se uma única letra de cada vez e passando-se sempre por palavras dicionarizadas, isto é, com significado conhecido. Claro que o vencedor será aquele que descobrir a cadeia com o menor número de passos. Veja o resultado de nosso exemplo:

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ódio – adio – adir – amir – amor.

Confesso que usei uma variação do problema original, pois tomei a liberdade de usar “adio”, que é o verbo adiar conjugado na primeira pessoa do singular do presente do indicativo, e eu não havia proposto o uso de verbos flexionados. Bem como “amir”, palavra de cuja existência eu apenas desconfiava. Só tive certeza quando folheei o dicionário e lá estava: amir, forma erudita de emir.

Imagine uma escola que incentive jogos como esse. Os alunos certamente iriam enriquecer o próprio vocabulário. De acordo com o matemático Martin Gardner, o evolucionista John Maynard Smith, no seu ensaio As Limitações da Evolução Molecular, mostra que há uma surpreendente semelhança entre esse jogo e o processo pelo qual uma espécie evolui para outra. Procure pensar na molécula helicoidal do DNA como numa palavra na qual os genes seriam as letras. Seria uma palavra

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gigante, com um número bem grande de letras. As mutações simples corresponderiam às passagens do jogo das palavras. Ou seja, houve um longo caminho entre o “símio” e o “homem” e a natureza gastou para isso vários dicionários e diversas línguas.

Esse raciocínio meio maluco nos leva a algumas perguntas. Quem estaria jogando esse belo jogo?

E como ele irá terminar? Claro, as respostas são difíceis de encontrar. Pensando nisso, resolvi criar para os leitores desta coluna um problema difícil mas bem mais ameno que o da evolução. Por mais erudito que você seja, sugiro que pegue um bom dicionário. Acredite, vai precisar dele. Depois, treine um pouco o jogo das palavras, começando com vocábulos curtos. Tente primeiro transformar

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“mau” em “bom” ou “mal” em “bem”. Ou, quem sabe, prefira construir um desafio mais interessante ainda, passando de “mal” para “mau”, depois de “mau” para “bom” e, finalmente, de “bom” para “bem”.

Quando estiver afiado, encare a nossa proposição: transforme a palavra “homem” em “feliz”. Mas faça isso homenageando a nossa revista. Antes de chegar ao “feliz”, dê um jeito de incluir uma passagem por “super”. Bom divertimento.

Luiz Barco é professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo

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