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As escolas do futuro

"O que você fez hoje na escola, meu filho?" "Transformei um carro normal num modelo super-econômico, papai." Esqueça as provas, a feira de ciências e a tabuada. Se a maior parte das escolas de hoje ainda é igualzinha à dos nossos pais, as do futuro serão muito diferentes. E algumas delas já estão funcionando.

Por Marcos Ricardo dos Santos
Atualizado em 31 out 2016, 18h45 - Publicado em 29 abr 2013, 22h00

A escola onde tudo é um jogo

MINDDRIVE
Onde fica – Kansas City, EUA
Número de alunos – 50
Tipo – Comunitária (ONG) e gratuita

Um grupo de alunos está reunido na sala de aulas no meio de um debate caloroso. Mas a lição aqui não é de matemática ou história – eles estão tentando adaptar um carro normal em um modelo ecológico e econômico. Essa é apenas uma das lições desta escola, chamada Minddrive, no Kansas, EUA. De fato, o maior feito dos alunos por lá é ter desenvolvido um veículo elétrico capaz de rodar 128 km com a energia equivalente à de 1 litro de combustível. Esta não é uma escola normal, claro. O Minddrive, na verdade, é um reforço escolar para adolescentes que não vão bem no ensino regular. Mas seu método educativo não é tão exótico assim. Ele é todo baseado nos jogos epistêmicos, uma espécie de RPG (role playing games), no qual os alunos simulam situações cotidianas e pensam em soluções para os problemas que vão surgindo. “Os desafios que as nossas escolas enfrentam hoje são importantes demais para ficarmos isolados. Precisamos preparar os alunos para o mundo real”, diz David Shaffer, professor de pedagogia da Universidade de Wisconsin e chefe do projeto de jogos epistêmicos para uso na educação. A ideia básica do Minddrive é apresentar um grande desafio real aos alunos e, sob a orientação de um instrutor, fazer com que eles encontrem as soluções para este problema. O aprendizado viria naturalmente, como consequência do processo. De fato, depois de entrar no reforço, quase todos os adolescentes melhoraram seu desempenho na escola tradicional.

A escola verde

GREEN SCHOOL
Onde fica – Bali, Indonésia
Número de alunos – Cerca de 370
Tipo – Privada – custo aproximado de R$ 2 mil mensais

Nessa escola, tudo é natural: as estruturas são de bambu e as salas de aula, abertas, para que o calor e o vento balineses possam entrar. Criada pelo americano John Hardy, ela se baseia na metodologia do educador britânico Alan Wagstaff, que defende uma maneira de ensinar que conecta aspectos racionais, emocionais, fisicos e espirituais. Na prática, isso quer dizer que o conhecimento está dividido em temas, e não em matérias. Por exemplo, no ensino fundamental, crianças de sete anos aprendem “padrões de contagem” pulando corda. Em outra aula, o objetivo é relacionar senti-mento a números e aconte-cimentos históricos. Assim, os alunos pensam em datas e cifras e as imaginam com as cores que quiserem. De acordo com o método de ensino, isso humaniza o conhecimento e, consequentemente, ajuda a memorizar os fatos. O discurso pode parecer meio hippie, mas Hardy garante que funciona. Até porque um dos objetivos da Green School é que seus alunos saiam de lá prontos para abrir seus próprios negócios – sustentáveis, de preferência. Ainda durante o ensino médio, eles simulam a criação de uma empresa. E muitas acabam saindo do papel. Rasa Milaknyte, que criou sua empresa no 11º ano (penúltimo do ensino médio), foi um desses casos. “Meu negócio é um serviço: ensino aikidô para crianças de cinco a 12 anos”, diz.

A escola da coletividade

ESCOLA MUNICIPAL DESEMBARGADOR AMORIM LIMA
Onde fica – São Paulo, Brasil
Número de alunos – 700
Tipo – Pública e gratuita

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Todo mundo pode participar de tudo na escola Desembargador Amorim Lima. Os pais organizam as festas, os alunos coordenam os debates, a diretora faz papel de tutora. Até a página do Facebook da escola é atualizada por pais. Há inclusive um conselho em que todos têm poder de decisão sobre rumos futuros. “A conquista do espaço público deve ser feita por todo mundo”, diz a diretora Ana Elisa Siqueira. Os alunos estudam em grupos de diferentes faixas etárias, espalhados por grandes salões – no maior deles, cabem mais de 100 estudantes. Parte das paredes da escola foi literalmente arrancada: os espaços foram formados a partir da união das antigas salas de aula, já no final da década de 1990. A lousa continua por lá, mas sem uso: não há aulas expositivas nesses espaços – apenas as de inglês, português e matemática acontecem por perto do quadro-negro, em salas menores. Se você entra num dos salões, encontra vários pequenos aglomerados de estudantes, além de professores em pé, correndo de um lado para o outro para atender aos diversos chamados. Cada um dos jovens anda com um caderno de roteiros de pesquisa, cujo conteúdo carrega os temas que podem ser estudados durante o ano, como “consumismo”, “comunicação e memória” e “sangue e excreção”. E adivinhe quem escolhe por onde começar e por onde terminar? O próprio aluno, que é incentivado a ser independente.

A escola dos hyperlinks

POLITEIA
Onde fica – São Paulo, Brasil
Número de alunos – 18
Tipo – Privada: custo aproximado de R$ 1,2 mil mensais

Um dos alunos desenvolveu um game interativo que acompanha a jornada de zumbis. Outro, uma pesquisa sobre Albert Einstein – durante uma apresentação, ele até explicou o que é o paradoxo dos gêmeos, um experimento mental sobre a relatividade. Outra das alunas começou uma pesquisa sobre cães e gatos abandonados, motivada pela sua paixão por animais. Todos eles são estudantes da Politeia, uma escola em São Paulo que deixa os alunos imergirem nos temas que lhes interessam. As pesquisas levam a caminhos inimagináveis. O exemplo de Joyce Dorea, a garota de 13 anos que decidiu pesquisar animais abandonados, é emblemático: ao se debruçar sobre o tema, ela descobriu que muitos animais não são apenas deixados na rua, mas são também deliberadamente maltratados. Ela então pesquisou mais o assunto e se deparou com a seguinte história: uma cadela russa chamada Laika foi lançada ao espaço numa nave, com um fim trágico, pois morreu durante a experiência. A garota ficou curiosíssima para entender o contexto histórico daquele fato e começou uma pesquisa sobre a corrida espacial. Esse assunto está diretamente conectado com a Guerra Fria e termos que até então ela não entendia muito bem, como “capitalismo” e “comunismo”. Foi nesse momento que a garota encontrou as tirinhas da Mafalda e seus pensamentos impregnados de reflexões políticas – sim, a personagem virou o tema da última pesquisa da jovem. O percurso de Joyce é apenas um exemplo entre outros na Politeia. Ele mostra a lógica do hyperlink: de um ponto para outro e para outro, num percurso imprevisível, aprendendo no meio do caminho. O desenvolvimento das pesquisas é feito com a ajuda de tutores e professores. “Durante as pesquisas, o professor precisa entrar no papel de aprendiz, aceitando que não sabe tudo e aprendendo junto com o estudante”, conta Yvan Dourado, um dos tutores.

A escola high tech

VITTRA
Onde fica – Suécia
Número de alunos – 8 500, em mais de 30 unidades
Tipo – Pública e gratuita

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Quando você anda por uma das unidades da Vittra, vê crianças com computadores por todo lado. Ao se matricular, cada aluno recebe um notebook de última geração, desde os seis anos. Os aparelhos então são usados em atividades como o projeto Future City. Nele, cada aluno cria um avatar e escolhe características e habilidades que considera importantes para si. Juntos, os personagens criam uma cidade, desenhando a infraestrutura física e estabelecendo relações sociais, incluindo a criação de leis e a realização de eleições. As atividades em grupo misturam crianças de diferentes idades e níveis de conhecimento, e os alunos as escolhem a partir de seus interesses. Em uma aula sobre o corpo humano, por exemplo, são as crianças mais velhas que ensinam as mais jovens – e podem usar o que quiser para isso: livros, animações ou apresentações digitais. “Ensinar alguém é uma ótima forma de aprender”, explica a professora Frida Monsén. “Observamos que os alunos dão o seu melhor quando sabem que o trabalho é para seus colegas e não apenas para o professor”, diz.

A escola mais difícil do mundo

JUKU E HAGWON
Onde fica – Japão e Coreia do Sul
Número de alunos – Variável
Tipo – Privada – custo aproximado de R$ 1 mil a R$ 1,5 mil mensais (fora o valor da escola regular)

Juku e hagwon são cursinhos preparatórios para crianças que viraram febre no Japão e na Coreia do Sul. No Japão, cerca de 20% dos alunos frequentam os juku já na pré-escola, para se preparar para os exames de admissão do ensino fundamental. Isso mesmo, são crianças de cinco ou seis anos fazendo cursinho. Depois que entram na 1ª série, os alunos passam a estudar em outro juku, já com a intenção de se preparar para o ensino médio, e assim seguem até o vestibular. Resultado: boa parte das crianças passa de dez a 12 horas por dia estudando. “Assim que chegam em casa, os pais querem que estudem ainda mais”, explica Julian Dierkes, da universidade canadense de British Columbia, especialista nas metodologias pedagógicas da Ásia. Na Coreia do Sul, país com as melhores notas nos testes escolares internacionais, a mania é ainda mais extrema. Tanto que virou caso de polícia: existem equipes especializadas em investigar os cursinhos noturnos, os hagwon. Por lei, esses espaços só podem funcionar até as 22 h, mas, para conseguir melhores resultados, alguns hagwon seguem com as aulas madrugada adentro. Em um caso recente, após receber uma denúncia anônima, uma patrulha especial da polícia chegou a um beco no distrito de Gangnam, em Seul (aquele da música do Psy). Os policiais identificaram o endereço, cercaram o prédio e encontraram uma sala de aula, onde dez alunos estudavam. O professor acabou preso e processado. Preocupado com os altos índices de estresse dos alunos, o ministério da educação coreano quer desestimular os hagwon. Pretende aumentar a qualidade das aulas regulares e mudar os sistemas de ingresso nas universidades, que estão passando a considerar testes de habilidades e entrevistas, além das supercompetitivas notas.

A escola do YouTube

KHAN ACADEMY
Onde fica – Na internet
Número de alunos – 43 milhões
Tipo – Livre

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Em 2004, nos EUA, um jovem americano chamado Salman Khan, filho de mãe indiana e pai de Bangladesh, queria ajudar sua prima, que morava na Índia, a estudar matemática. Como estava longe, gravou umas aulas em vídeo e as publicou no Youtube, para que a prima pudesse acessar suas explicações. Mas ele não esperava que suas aulas fossem virar hits. Khan começou a receber pedidos para que gravasse vídeos de outros assuntos. Assim surgiu a Khan Academy, hoje uma febre mundial. A Khan disponibiliza gratuitamente na internet mais de 3 200 aulas em vídeo e animação. Somados, eles já têm mais de 200 milhões de visualizações. Algumas escolas dos EUA (e do Brasil tambem!)utilizam os vídeos da Khan na sala de aula – o que aponta para uma sutil e gradual tendência de, aos poucos, substituir as tradicionais aulas com lousa e giz. “O velho modelo simplesmente não atende mais às necessidades das pessoas,” diz Salman Khan. “É uma forma de aprender essencialmente passiva, mas o mundo requer uma maneira mais ativa de processar informação. E a tecnologia oferece isso.”

A escola onde o aluno decide o que fazer

SÃO TOMÉ DE NEGRELOS (conhecida como Escola da Ponte)
Onde fica – Vila das Aves, Portugal
Número de alunos – 220
Tipo – Pública

A escola tradicional se baseia na ideia de que o aprendizado segue um caminho mais ou menos igual para todos. Por isso, temos a divisão em turmas por idade, currículos padronizados e provas iguais para todos os alunos. Mas há quem discorde: algumas teorias da educação entendem que cada aluno é único e deve ter autonomia para aprender. Com base nessa ideia, surgiu em Portugal, em 1976, a Escola da Ponte, que fica numa vila a 30 km do Porto. A escola não tem salas de aula, não separa o conteúdo em disciplinas, não demarca horário para iniciar ou terminar uma atividade. Funciona assim: os professores apresentam aos alunos uma variedade de temas. Cada um escolhe um assunto que mais lhe interesse e diz se quer trabalhar sozinho ou em grupo. Todos dividem o espaço da escola, espalhados por grupos de mesas. Se preferirem, podem fazer as atividades ao ar livre. “Os alunos gerem, quase com total autonomia, os tempos e os espaços educativos. Escolhem o que querem estudar e com quem”, explicou José Pacheco, fundador da escola, em palestra recente no Brasil. Ao final de cada dia, há uma espécie de assembleia geral, onde os alunos compartilham com os colegas o que aprenderam. Quando sentem que estão preparados para fazer uma prova, definem quando vão fazer o teste, individualizado para cada um, levando em conta a lista de conhecimentos adquiridos. Parece o paraíso na Terra, mas nem todos se adaptam ao modelo. Há aqueles que desistem, e acabam voltando ao sistema tradicional. Mas a metodologia da Escola da Ponte convenceu o governo português, que valida seu diploma como o de qualquer outra escola.

A escola para gays

HARVEY MILK HIGH SCHOOL
Onde fica – Nova york, EUA
Número de alunos – 110
Tipo – Pública

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A Harvey Milk School (que leva o nome do principal ativista político americano da causa gay, assassinado em 1978) é voltada prioritariamente para jovens homossexuais. Suas diretrizes dizem que “a escola é aberta para todos os alunos, independentemente de raça, gênero, orientação sexual”. Mas, na prática, quase todos os alunos são abertamente gays ou lésbicas. “A escola foi criada para que adolescentes homossexuais pudessem estudar sem a ameaça de violência física ou emocional que costumavam enfrentar no ambiente escolar tradicional”, explica Thomas Krever, diretor executivo da iniciativa. Para o diretor, em um ambiente em que possam se expressar livremente, os alunos têm mais condições de se dedicar aos estudos. A instituição foi alvo de críticas por ser abertamente voltada a um perfil específico de estudantes, especialmente depois de ter sido trans-formada em uma escola pública em 2002, passando a receber recursos do governo. Mas, pelos dados da escola, os resultados dos alunos da Harvey Milk em exames são superiores aos da média de Nova York. Aí fica difícil contestar.

Para saber mais
https://www.educ-acao.com

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