Livre-se da forca
Use uma versão bem mais elaborada do popular passatempo com palavras.
Luiz Dal Monte Neto
Qual é a palavra que você pensa que eu penso que você está pensando? Esse tipo de dúvida é constante no forca coletiva, um jogo inventado pelo americano Scott Marley. Forca, você se lembra, é aquele divertimento em que uma pessoa imagina uma palavra e coloca num papel tantos traços quantas letras nela houver. Então, o parceiro vai dizendo uma letra por vez. Quando ela pertence à palavra, o primeiro a escreve sobre os respectivos traços. Quando não, ele desenha uma parte de um enforcado. O número de pedaços a serem desenhados é previamente combinado. Se o parceiro conseguir adivinhar a palavra antes de acabar o desenho, vence; se não, vence quem a imaginou.
Outro jogo com palavras, não tanto popular, é o ghost (fantasma). Nele, duas ou mais pessoas se alternam acrescentando uma letra por vez à direita ou à esquerda, sem que nenhum dos participantes saiba previamente que palavra se está construindo. Quando alguém não encontrar continuidade e ela existir, perde. Também perde quem propõe uma letra que inviabilize a formação de qualquer palavra, desde que alguém o questione.
O que Scott Marley fez foi misturar a forca com o ghost – uma mórbida e involuntária combinação de palavras. Na forca coletiva, o primeiro jogador põe no papel um certo número de traços – o autor sugere algo entre cinco e se-
te –, sem precisar ter uma palavra em mente. Ela vai aparecer aos poucos. Será uma criação coletiva. O objetivo não é adivinhar o vocábulo final, mas sim ir estreitando as possibilidades até que ele se defina. E se manter vivo até o desfecho.
A brincadeira se dá da seguinte forma: colocados os traços, o segundo jogador pergunta sobre a existência de uma letra. O seguinte deverá respondê-lo e questionar sobre outra letra. O próximo fará o mesmo e assim por diante. Quem responder que a letra existe deve escrevê-la sobre o traço apropriado (um só, mesmo que ela apareça mais que uma vez na palavra que estiver pensando). Se for dito que a letra não existe, ela deverá ser anotada numa folha à vista de todos.
O blefe é possível, mas perigoso. Qualquer jogador pode desafiar tanto respostas quanto perguntas. As respostas, quando se julgar que não existe nenhuma palavra capaz de encaixar na situação criada. Se o desafiado conseguir escrever um vocábulo válido (de acordo com os critérios adotados previamente), o desafiante perde uma vida (todos têm duas). Se não conseguir, ele é que perde uma vida.
As perguntas poderão ser desafiadas quando se achar que são supérfluas, isto é, que não ajudam a estreitar o número de palavras possíveis no caso. Para se defender, o desafiado deve mencionar duas palavras e sugerir uma resposta à sua pergunta que elimine uma delas e não a outra, prova de que não era supérflua. Nesse caso o desafiante perde uma vida. Senão é o desafiado que a perde.
Um exemplo de partida entre três jogadores ajudará a compreender o mecanismo. André começa fazendo cinco traços. Bruno pergunta se tem A. Carlos diz que sim (põe um A sobre o primeiro espaço) e pergunta se tem C. André diz que não e pergunta se tem S. Bruno põe um S sobre o segundo traço e pergunta se tem O. Carlos põe um O no último traço e pergunta se tem A. André diz que não e pergunta se tem I. Bruno põe um I no terceiro traço e, sem outra alternativa, pergunta se tem L. Carlos desafia a pergunta de Bruno, por considerá-la supérflua. Bruno não consegue mencionar nenhuma palavra além de ASILO, portanto perde uma vida…
Luiz Dal Monte Neto é arquiteto e designer de jogos e brinquedos