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Tilt na economia?

Por que os investidores entram em pânico e tomam decisões irracionais? Veja como a neuroeconomia explica o sobe-e-desce dos mercados

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Atualizado em 31 out 2016, 18h47 - Publicado em 31 out 2008, 22h00

Texto Gisela Blanco

A Bolsa de Londres estava batendo todos os recordes. As ações subiam tanto que um dos investidores desconfiou: aquilo poderia ser uma bolha, ou seja, um período de otimismo exagerado e insustentável. Mas ele não resistiu e colocou seu dinheiro no mercado. Até que o pior aconteceu: a bolha estourou, e nosso amigo perdeu todo o dinheiro. O ano era 1720 e o investidor ninguém menos que o físico Isaac Newton. Falido e perplexo, o homem que descobriu a lei da gravidade disse: “Consigo calcular os movimentos dos corpos celestes, mas não a loucura dos homens”. Pode parecer discurso de mau perdedor, mas na verdade foi uma grande sacada. Sem saber, Newton estava prevendo a criação de uma nova ciência, cujas descobertas podem ajudar a entender a crise atual: a neuroeconomia, que vasculha a mente humana em busca de explicações para o comportamento dos mercados. Por que até pessoas hiper-racionais, como Newton, acabam tomando decisões irracionais quando o assunto é dinheiro? Como se formam as ondas de pânico, e por que ele é contagioso? A ciência está começando a encontrar possíveis respostas. “No cérebro dos humanos, assim como em outros animais, existem os chamados neurônios-espelho, que são ativados quando você vê uma pessoa fazendo alguma coisa. Em certos casos, se torna irresistível imitar o comportamento dela”, explica o neurologista Armando Rocha, da Fundação Getúlio Vargas. “É um mecanismo de autopreservação. Se você vê animais da sua espécie correndo do fogo, não é muito inteligente ficar parado”, explica o economista Marcos Fernandes, também da FGV. Só que essa reação, fundamental para a sobrevivência na floresta, pode ser letal para o sistema financeiro: se todo mundo corre para o mesmo lado, tirando seu dinheiro do mercado ao mesmo tempo, ele quebra. Com as últimas experiências em laboratório e técnicas de mapeamento do cérebro, já é possível prever as atitudes das pessoas ao lidar com dinheiro. E os resultados são surpreendentes. O melhor exemplo disso é o “ultimatum game”, um jogo que foi criado por psiquiatras para tentar entender a dinâmica dos mercados. Ele funciona assim: o jogador 1 recebe uma determinada quantia em dinheiro e precisa dividi-la com o jogador 2 – que pode aceitar ou rejeitar a oferta do jogador 1. Se ele rejeitar, ninguém ganha nada: ambos os jogadores saem de mãos vazias. As teorias clássicas sobre o comportamento humano prevêem que o jogador 2 vai aceitar qualquer quantia – afinal de contas, ganhar algum dinheiro é melhor do que nada. Só que, na prática, não é bem isso o que acontece. O jogador 2 costuma rejeitar ofertas muito baixas – ele não se importa de ficar sem dinheiro, mas faz questão de prejudicar o adversário ganancioso.

Menos é mais

Isso tem explicação. Monitorando o cérebro de voluntários, um grupo de cientistas da Universidade da Califórnia fez uma descoberta surpreendente: as pessoas mais odeiam perder do que amam ganhar. Na experiência, os voluntários tinham de fazer apostas num jogo em que as chances de vitória e derrota eram iguais. Quando eles ganhavam, o cérebro aumentava a produção de um neurotransmissor ligado ao bem-estar, a dopamina. Quando perdiam, acontecia o efeito inverso – só que com intensidade maior. Muito maior. Em 2002, o psicólogo David Kahneman ganhou o Prêmio Nobel de Economia com um estudo mostrando que, para o cérebro, a dor de uma perda é 200% mais forte que o prazer de um ganho. Isso explica o desespero que leva as pessoas a vender suas ações em épocas de baixa, mesmo sabendo que com isso podem estar jogando dinheiro fora. O cientista Gregory Berns, da Universidade Emory (EUA), provou a teoria de maneira chocante: deu choques elétricos em voluntários enquanto monitorava o cérebro deles. Cada pessoa podia escolher. Ou tomava um choque mais forte, e na hora, ou levava um choque mais fraco, alguns segundos mais tarde. O incrível é que boa parte das pessoas optou pelo choque mais intenso – não se importava em sentir uma dor mais forte, desde que ela fosse imediata. É por isso que as pessoas correm para vender suas ações em momentos de crise, mesmo que isso signifique perder dinheiro. Em troca de uma solução rápida, o cérebro aceita um prejuízo maior.

O que ele não suporta, de jeito nenhum, é a incerteza. Uma pesquisa da Universidade Caltech, nos EUA, colocou voluntários para realizar duas tarefas: fazer um investimento em ações com riscos claros, fáceis de calcular, e uma aplicação em papéis de riscos incertos, difíceis ou impossíveis de estimar. Na primeira tarefa o estrato dorsal, área do cérebro ligada à tomada de decisões, se ativava. Já quando os riscos eram incertos, agiam partes mais “emocionais” do cérebro, como a amídala e o córtex orbitofrontal. E as respostas emocionais também acontecem, claro, por causa dos hormônios. Não, não estamos falando de mulheres enlouquecidas pela tensão pré-menstrual. Cientistas da Universidade de Cambridge mediram os níveis de testosterona de 17 operadores da Bolsa de Londres. Quando os rapazes tinham níveis altos de testosterona pela manhã, ganhavam mais dinheiro durante o dia. É que a testosterona deixa os homens mais corajosos, fazendo-os investir mais agressivamente. Então os machões são a solução para a crise global? Não. “Acima de certo nível, a testosterona faz o homem se arriscar demais, e perder dinheiro”, afirma o neurologista Armando Rocha. “Se pudéssemos analisar os níveis de testosterona desses operadores em tempo real, saberíamos alertá-los quando fosse hora de parar e tirar umas férias”, diz. O psicólogo Alden Cass, da Universidade do Sul da Flórida, analisou 26 investidores bem-sucedidos da Bolsa de Nova York. Ele descobriu que 70% deles tinham algum grau de depressão – distúrbio relacionado à falta de serotonina no cérebro. Além de deixar as pessoas pra baixo, isso pode confundir suas decisões financeiras, pois quem tem pouca serotonina fica menos racional: sente euforia demais quando as coisas vão bem e pessimismo demais quando o mundo parece estar acabando. Talvez os investidores realmente precisem descansar. E, quem sabe, tomar um pouco de sol. Isso mesmo. O economista David Hirshleifer, da Universidade de Ohio, analisou as cotações de 26 mercados durante 15 anos e descobriu que, em dias ensolarados, as bolsas sobem 3 vezes mais do que em dias nublados. Será que o sol deixa os investidores mais animados? Ninguém sabe. Mas uma coisa é certa. Entre o lucro e o prejuízo, existem muito mais variáveis do que supõe a nossa vã economia.

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O cérebro em 3 tempos

Veja o que acontece na cabeça das pessoas quando o mercado está subindo, estável ou caindo

Mercado em alta

O tempo está aberto e os machões reinam: pesquisas mostram que os investidores com mais testosterona têm mais lucro – e os mercados sobem mais quando faz sol.

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Mercado no auge

Tudo está bem. Mas não por muito tempo. Quando estão felizes, as pessoas utilizam menos informações e pensam menos antes de tomar decisões – uma péssima receita para ganhar dinheiro.

Crise

Como o cérebro é duas vezes mais sensível a perdas do que a ganhos, o investidor entra em desespero – e vende suas ações no ato, mesmo que isso signifique perder dinheiro.

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Para saber mais

Desvendando a Mente do Investidor

Richard Peterson, Editora Elsevier, 2008.

Center for Neuroeconomic Studies

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neuroeconomics.duke.edu/news

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