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“Carmilla”: conheça o romance lésbico que inspirou “Drácula”

Em plena Inglaterra vitoriana, obra do irlandês Sheridan Le Fanu narra, sem rodeios, a conturbada relação entre uma jovem e uma vampira.

Por Leo Caparroz
Atualizado em 3 jul 2023, 14h30 - Publicado em 28 jun 2023, 22h20

Drácula (1897), escrito pelo irlandês Bram Stocker, é a pedra fundamental da mitologia dos vampiros. O protagonista do romance gótico é a referência-mor da criatura – mas Stocker, ao contrário do que muitos pensam, não inventou essa história do zero.

A lenda dos vampiros já eram comuns na época. E os relatos de pessoas que juravam ter visto um ser de dentes afiados alimentavam a literatura. O livro The Vampyre, escrito pelo britânico John William Polidori em 1819, é considerado uma das primeiras obras modernas sobre o assunto.

Não vamos falar sobre ela aqui – mas sim de outra obra vampiresca (e uma das possíveis inspirações para Stoker): Carmilla, do (também) irlandês Sheridan Le Fanu, que ficou marcada não apenas pela trama fantástica – mas por abordar uma relação homoafetiva em pleno século 19.

A história

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A história foi lançada em capítulos, que acompanhavam um periódico literário londrino – como os folhetins aqui no Brasil – entre 1871 e 1872. A trama é narrada por Laura, uma jovem inglesa que, depois de um estranho acidente na estrada, acaba abrigando uma mulher misteriosa em sua casa: Carmilla.

Laura, no começo, fica receosa com a estranha, que se parece muito com a mulher de um sonho que teve quando criança. Mas esses sentimentos são rapidamente substituídos por uma relação intensa e calorosa entre as duas.

Enquanto o romance floresce, o pânico se instaura na região: moças de várias cidades estão adoecendo, de forma súbita e grave – muitas acabam morrendo. Não demora muito para que Laura também fique doente.

(A partir daqui, vamos dar alguns spoilers da trama. Caso não queira saber, pule para o próximo intertítulo do texto.)

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A jovem passa a ter várias vezes o mesmo sonho. Nele, ela recebe a visita de figura parecida com um gato gigante em seu quarto. Laura sente duas pontadas em seu pescoço e observa o monstro se transformar em uma mulher – que sai de seu quarto sem abrir a porta. Ela acorda – e vê duas marcas de mordida exatamente onde havia sido atacada.

Quando um general que perdeu sua sobrinha para a doença misteriosa visita o pai de Laura, ele reconhece Carmilla. A mulher, na verdade, era a vampira Mircalla. O encontro dos dois se desenrola em uma briga. Carmilla, descoberta, foge.

Após o incidente, o pai de Laura, junto ao general e um caçador de vampiros, vão atrás da tumba escondida de Carmilla. Eles enfiam uma estaca em seu coração, cortam sua cabeça e queimam seus restos. Laura volta a ficar saudável, mas nunca por completo – e a memória de Carmilla continua a assombrá-la pelo resto de sua vida.

Precursora

A história de Carmilla saiu 26 anos antes de Drácula, e a maioria dos historiadores concordam que rolou uma inspiração.

A primeira semelhança é no título das histórias (ambas trazem apenas o primeiro nome do vampiro). As duas são narradas em primeira pessoa e têm personagens parecidos: um caçador de vampiros que aparece no final com o conhecimento oculto das criaturas e uma vampira descrita sensualmente.

Além disso, Carmilla e Drácula escondem sua identidade, afirmando serem “parentes” de figuras antigas – que, na verdade, são eles mesmos.

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Contudo, vale reforçar que nenhum dos dois inventou o gênero vampiresco. A ficção gótica do século 19 já tinha algumas histórias de vampiros em poemas. O próprio Le Fanu pode ter, por sua vez, se inspirado em um poema do escritor romântico S. T. Coleridge. A história, escrita na virada do século, mas publicada mais tarde, conta da vampira Geraldine, que seduz a heroína Christabel, que dá o título ao poema. Essa história, porém, ficou inacabada.

Vampiras lésbicas na Era Vitoriana

Grande parte do que torna Carmilla tão relevante é o fato da obra girar em torno de duas protagonistas femininas – e que vivem uma relação homossexual.

A Era Vitoriana britânica (1837-1901) foi marcada por códigos morais rígidos e forte repressão sexual. O relacionamento entre homens era proibido por lei. A legislação não falava nada sobre casais lésbicos. Mas eles existiam, claro – e eram tão mal vistos quanto os casais gays.

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A repreensão serviu de fonte para várias histórias do gênero. Os contos de vampiros viraram um escape para desejos reprimidos – mas, em muitos casos, ensinavam uma lição sobre o perigo de sucumbir a tais paixões.

Laura experimenta essa moral vitoriana, já que sente tanto repulsa quanto atração pela criatura. Essa dualidade, comum em contos vampirescos, é exacerbada pelo fato do tal vampiro ser uma mulher. Conforme Carmilla a seduz, os sentimentos da protagonista ficam mais e mais confusos.

A relação entre as duas não é velada ou representada por metáforas. As trocas de carícias são narradas sem rodeios, e a proximidade romântica delas é incontestável. Para uma época em que a sensualidade deveria ser reprimida, a sensualidade entre duas mulheres era um escândalo.

Carmilla, infelizmente, por décadas permaneceu em esquecimento (é de se esperar que, em uma sociedade com morais tão rígidas, ela não tenha recebido a atenção devida). Quem sabe agora, mais de 150 anos depois, a história possa ser vista com outros olhos.

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Carmilla: A Vampira de Karnstein

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