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Fela Kuti: O guerreiro do pop

A saga de Fela Kuti, músico que fundou sua própria república e virou herói nacional

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h51 - Publicado em 31 jul 2004, 22h00

João Paulo Gomes

Na noite de 18 de fevereiro de 1977, mil soldados do exército nigeriano montaram cerco a um conglomerado de casas conhecido como República de Kalakuta, lugar nos arredores de Lagos. A missão era calar o maior popstar africano: Fela Kuti.

Não é difícil entender o motivo de tamanha antipatia que o músico causava nos governantes, a ponto de destacarem um batalhão inteiro do exército para caçá-lo. Dono de uma personalidade que misturava o comprometimento político de Bob Dylan e a extravagância de Mick Jagger, Fela fazia de tudo para antagonizar e denunciar as brutalidades cometidas pelo regime militar que controlava a Nigéria nos anos 70. Sua arma mais poderosa era o afrobeat, gênero musical de invenção própria que mesclava ritmos tribais e elementos do jazz e funk americanos. Dos Estados Unidos também vinha a influência de Malcolm X e dos ideais afrocêntricos espalhados pelos militantes dos Panteras Negras.

Com títulos sugestivos como Vagabundos no Poder, as músicas de Fela ridicularizavam os militares e a elite nigeriana, que cada vez mais exploravam os pobres e macaqueavam o modo de vida ocidental. O músico, é claro, discordava de tudo isso e fazia muito barulho para engajar o povo na luta por uma África livre da miséria e corrupção.

No auge de sua rebeldia – e megalomania –, Fela juntou seus seguidores e fundou a República de Kalakuta, declarando-a independente da Nigéria. O lugar, um conjunto de casas pintadas de amarelo e cercadas por arame farpado, tornou-se o lar perfeito para o retorno às raízes africanas que Fela tanto buscava em suas canções. O músico passava a maior parte dos dias sentado em um trono, vestindo apenas uma tanga e fumando baseados de maconha egípcia que impressionavam pelo tamanho. Para completar, casou-se com 27 mulheres de uma só vez, em uma cerimônia tribal que faria inveja a qualquer rockstar americano.

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Apesar do discurso contra a repressão militar, Fela tinha idéias próprias de como deveria ser a liberdade dentro de sua república e se mostrou um homem rigoroso com quem ousasse sair da linha. Para os homens, a punição vinha na forma de golpes de um cajado de madeira, aplicados sem pena pelo próprio músico, enquanto as mulheres desobedientes eram confinadas em uma pequena prisão. No entanto, nada disso parecia contraditório para o o povo nigeriano, que tinha em Fela um herói nacional.

A paciência do regime militar, porém, tinha limites, o que nos traz de volta à noite de 18 de fevereiro de 1977. Enraivecidos com a pregação antimilitarista do músico, os governantes resolveram dar um fim na república. Em uma operação de cinco horas, os soldados invadiram o lugar, espancaram os homens e estupraram as mulheres. Sobrou até para a mãe de Fela, que foi arremessada do segundo andar de um prédio. Gravemente ferida, ela morreria meses depois.

Com uma fratura no crânio, Fela viu sua república em chamas enquanto era levado preso pelos soldados. Depois de um período de exílio em Gana, o músico retornou à Nigéria. Durante os anos que se seguiram, Fela continuou a desafiar os militares e voltou para a cadeia algumas vezes, até que, no dia 2 de agosto de 1997, morreu vítima da aids.

Um milhão de pessoas foram ao enterro, preparado com honras militares. Ironicamente, o mesmo regime que o caçou por toda a sua vida decretou quatro dias de luto oficial.

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