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Nos anos 1990, James Cameron quase fez um filme do Homem-Aranha

Com Leonardo DiCaprio no papel do herói, o diretor de "Avatar" queria uma história com palavrões, sexo e um tom mais realista. Veja por que não deu certo.

Por Rafael Battaglia
Atualizado em 26 dez 2022, 15h27 - Publicado em 22 dez 2022, 19h49

Em 40 anos de carreira, James Cameron dirigiu nove filmes. Para os padrões de Hollywood, não é um currículo extenso – o colega de profissão Steven Spielberg, por exemplo, já fez 33. Mas a taxa de acerto é altíssima. Cameron criou O Exterminador do Futuro (1984) e dirigiu os dois primeiros capítulos da franquia. Dirigiu também Alien, O Resgate  (1986), sequência de Alien (1979). E, claro: Titanic (1997) e Avatar (2009), a terceira e primeira maiores bilheterias da história do cinema, respectivamente. Juntas, elas arrecadaram mais de US$ 5 bilhões.

Com esse perfil de LinkedIn, é de se imaginar que ele não tenha dificuldade em aprovar projetos – e dar a palavra final neles. De fato: Cameron passou a última década desenvolvendo a história e as tecnologias necessárias para as continuações de Avatar. A primeira delas, O Caminho da Água, que estreou na última semana, custou entre US$ 350 milhões e US$ 400 milhões – o que a coloca no páreo como um dos filmes mais caros da história.

Mas não foi sempre assim. Nos anos 1990, Cameron se esforçou para fazer uma adaptação em live-action do Homem-Aranha. A produção tinha tudo: um roteiro, uma diretora (Kathryn Bigelow, de Guerra ao Terror e ex-esposa de Cameron), vilões definidos e um astro em ascensão para o papel de Peter Parker – Leonardo DiCaprio. Só que não vingou: questões legais envolvendo os direitos do personagem esfriaram o projeto, que acabou engavetado para sempre.

Vamos entender essa história.

X-Men, Stan Lee e sexo na Ponte do Brooklyn

No início da década de 1990, nenhum quadrinho era tão popular quanto os dos X-Men. A HQ X-Men #1, de 1991, ocupa até hoje o posto de mais vendida da história: 8,1 milhões de cópias. O sucesso dos mutantes extrapolou a mídia impressa com uma série animada de sucesso, exibida entre 1992 e 1997 (e que vai voltar em 2023, no Disney+). Adaptar a história para os cinemas, claro, estava no radar de muitos produtores. Entre eles, James Cameron.

Cameron e Bigelow se reuniram em um almoço com Stan Lee. Naquela época, Lee morava em Los Angeles e já não apitava mais nas decisões editoriais da Marvel (cuja sede é em Nova York) – mas tentava a todo custo fazer com que os personagens que havia ajudado a criar ganhassem vida em outras mídias.

Não há muitos detalhes desse encontro. Ao que tudo indica, Lee teria convencido Cameron de que seria mais interessante fazer um filme live-action do Homem-Aranha. Dito e feito: em 1993, Cameron desenvolveu uma estrutura de roteiro para a adaptação, cheia de detalhes sobre a trama.

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Em 2000, o site IGN teve acesso a esse documento e o analisou. O enredo tinha pontos similares com o Homem-Aranha de Sam Raimi, lançado em 2002. O foco da história, por exemplo, era a relação de Peter Parker e Mary Jane Watson. E a teia de Peter também era orgânica e saía de seus pulsos (nos quadrinhos, ela é artificial, e o herói precisa de um lançador para usá-las).

Mas as semelhanças param por aí. Em vez do Duende Verde, o Homem-Aranha de Cameron enfrentaria Electro e o Homem-Areia. Mas os vilões, que se chamam Maxwell Dillon e Flint Marko, respectivamente, teriam novos nomes: Carlton Strand e Boyd. Eles tentariam recrutar Peter para uma organização de supercriminosos (o Sexteto Sinistro, talvez?); no final do filme, o Aranha os derrotaria em uma batalha no topo das Torres Gêmeas.

(Curiosidade: o Homem-Aranha de 2002 também teria uma cena nas Torres Gêmeas, que foi deletada após o 11 de Setembro. Mas você pode conferi-la no YouTube.)

A principal característica do Homem-Aranha de Cameron era o seu tom realista. O diretor não queria que o filme fosse parecido com as primeiras HQs do herói, voltadas para o público infantojuvenil. Pelo contrário: queria algo na pegada de O Exterminador do Futuro e Alien (algo parecido com o que Christopher Nolan faria mais tarde na sua trilogia do Batman).

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O roteiro de Cameron tinha referências ao clássico A Metamorfose, livro de Franz Kafka, em que o protagonista, Gregor Samsa, transforma-se repentinamente em um inseto. O Peter Parker dessa adaptação não economizava nos palavrões – e havia até uma cena de sexo com Mary Jane no topo da Ponte do Brooklyn, em Nova York.

Em uma recente entrevista, Cameron relembrou a proposta: “Eis o que eu queria: é Nova York. É hoje. Um cara é mordido por uma aranha. Ele se transforma nesse garoto com poderes e quer ser o Homem-Aranha. Aí ele faz um traje e é terrível, e então ele tem que melhorá-lo. O seu grande problema é esse maldito traje. Eu queria coisas desse tipo, sabe? Fundamentar isso na realidade e na experiência humana universal”.

Faltou combinar com os advogados

Em 1993, quando o roteiro de Cameron começou a circular por Hollywood, um agente disse à revista Variety que o filme tinha “potencial para ser tão grande quanto o Batman (1989) de Tim Burton. Não há muitos detalhes sobre o elenco, mas há rumores de que Arnold Schwarzenegger, parceiro do diretor em O Exterminador… e True Lies (1994), estaria envolvido no projeto. Assim como Leonardo DiCaprio, que faria o papel do herói aracnídeo.

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Em uma entrevista à revista Empire, em 2015, DiCaprio afirmou que teve algumas conversas com Cameron sobre o filme – mas nunca chegaram a bater o martelo sobre o papel. Na conversa, o ator, que mais tarde trabalharia com o diretor em Titanic, disse não lamentar que o filme nunca tenha se concretizado – e que sua carreira provavelmente não mudaria se tivesse vivido Peter Parker. Coincidentemente, o papel acabou com Tobey Maguire, amigo de DiCaprio desde a infância.

Mas, afinal, por que esse projeto não deu certo?

Em meados dos anos 1990, investimentos errados do chefão da Marvel, Ron Perelman, fizeram a empresa entrar com um pedido de falência, com quase US$ 1 bilhão de dívidas. Para saldá-las, a editora vendeu a preço de banana o direito dos seus personagens para estúdios de Hollywood.

Àquela altura, os direitos do Homem-Aranha (e todo o seu universo particular de personagens secundários) pertenciam à 21st Century Film Corporation, que uniu forças com outro estúdio, a Carolco Pictures, para produzir o filme do herói. A Carolco havia financiado O Exterminador do Futuro 2 (1991). Cameron, então, teria velhos aliados na empreitada.

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Mas não rolou: ambos os estúdios faliram no meio do caminho. Outro estúdio, a MGM, comprou a Carolco e parte da 21st Century.

A partir daí, ninguém sabia mais a quem pertenciam os direitos sobre o Aranha: se eles haviam voltado para a Marvel, se foram para a MGM via aquisição da Carolco – ou, ainda, se eram do produtor israelense Menahem Golan, presidente da 21st Century e que, desde os anos 1980, tentava criar um filme do personagem.

Em meio ao quiprocó judicial, Cameron tentava, em vão, continuar o projeto. Ele insistiu para a 20th Century Fox adquirir os direitos do Homem-Aranha para que eles pudessem lançar o filme. A Fox, porém, não quis se meter. E nem a MGM: em um acordo com a Marvel, o personagem voltou para a editora.

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Por fim, a Sony comprou os direitos e lançou a trilogia de Raimi nos anos 2000. O estúdio detém até hoje o poder sobre o personagem nas telonas (os filmes do Aranha no MCU, o universo da Marvel nos cinemas, são fruto de um acordo do estúdio com a Disney).

Com o tempo, Cameron abriu mão da adaptação. “É o maior filme que eu jamais fiz”, confessou em seu livro, Tech Noir: The Art of James Cameron, de 2021. Mas houve um lado bom dessa história: a partir dali, o cineasta passou a focar em projetos originais, nos quais não precisaria se envolver em disputas judiciais novamente. Sorte do público, que ganhou Titanic e Avatar como resultado dessa decisão.

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