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O filósofo americano , Jacob Needleman

O filósofo americano diz que dinheiro não traz felicidade e explica como é possível viver sem dar tanta importância à conta bancária

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h48 - Publicado em 30 jun 2001, 22h00

Laura Somoggi

O filósofo americano Jacob Needleman dedica seu tempo a pregar um ditado universal que anda meio esquecido nestes tempos de negócios intercontinentais e fortunas reunidas da noite para o dia. “Dinheiro não traz felicidade”, diz a máxima que ele gosta de repetir. Aos 66 anos, 30 deles dedicados a estudar as crises da vida moderna, Needleman hoje foca sua atenção na relação dos homens com o dinheiro. Para um tema desses, o professor dispõe de um observatório privilegiado: San Francisco, na Califórnia, o Estado mais rico do país mais rico do mundo. É ali que ele vive e dá aulas de filosofia e religião comparada, na Universidade Estadual de San Francisco. Em seus cursos, ele recorre a lições antigas – como os velhos ditados – e a filosofias orientais e ocidentais. Foi dessas aulas que surgiu O Dinheiro e o Significado da Vida (Editora Best Seller, já esgotado), uma de suas 12 obras.

Super – Por que é tão difícil lidar com dinheiro?

O dinheiro reflete nossa imaginação, nossos desejos, necessidades e temores. Ele é nossa principal tecnologia social, por meio da qual vivemos hoje. Se somos sugestionáveis e vulneráveis ao que dizem e pensam os outros, o dinheiro espelhará tudo isso. A angústia que sentimos em relação ao dinheiro é reflexo da angústia que sentimos em relação a nós mesmos.

Por que ele tem esse poder?

O dinheiro foi inventado para facilitar trocas entre as pessoas. O detalhe é que muitas coisas que não podiam ser medidas em termos monetários hoje têm preço. É o caso do cuidado com os filhos. As pessoas saem para trabalhar e deixam os filhos com profissionais. Outros não têm tempo nem para a amizade e, quando querem falar dos problemas, têm de pagar a um terapeuta. O dinheiro virou instrumento para aferir até nosso amor-próprio. Aqui nos Estados Unidos dizemos: “Quanto vale essa pessoa?” Há algum tempo, isso seria loucura. O dinheiro por si mesmo não proporciona felicidade. Ele dá prazer, alguma sensação de segurança. Mas, com o passar do tempo, percebe-se que ele não alimenta nossa alma. Temos de tratá-lo como um meio, não como um fim. Mas, para isso, temos de ter um fim, um objetivo. Só somos felizes quando a vida tem um significado. Transformar o dinheiro em nosso único objetivo é como comer comida com gosto de plástico.

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E por que tanta gente ainda acredita que o dinheiro traz felicidade?

As pessoas procuram algo que confira um significado a suas vidas. E muitas das coisas que antigamente se acreditava trazer felicidade perderam poder: religião, espiritualismo, filosofia ou mesmo arte. Todos precisamos de dinheiro, assim como de ar, de alimentos e convívio social. Sim, porque ninguém pode se mudar para uma floresta e viver sozinho. As forças da cultura são fortes demais. Não podemos simplesmente abandonar a sociedade, nem abrir mão do que temos, da tecnologia. Primeiro, teríamos de descobrir outras pessoas que sintam a mesma angústia. Juntos, teríamos de cultivar o contato humano, que é a fonte maior de felicidade. Muitos hoje têm consciência de que comprar mais um carro não propicia felicidade genuína, mas não sabem a que recorrer. Quando temos uma meta real, o dinheiro deixa de ser um problema tão grande.

Qual a influência do dinheiro sobre as emoções?

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Nossa cultura nos faz crer que coisas materiais podem nos fazer felizes, mas elas dão apenas um prazer superficial. Prazer é diversão, não perdura, é diferente de felicidade. Precisamos dessas coisas, mas a sociedade capitalista em que vivemos cria desejos para que haja sempre mais demanda. Pelo menos 75% dos produtos disponíveis hoje são dispensáveis.

Então, quanto dinheiro é o bastante?

Depende principalmente do seu objetivo na vida. As pessoas não sabem quanto dinheiro basta porque não têm objetivo na vida. Para piorar, as incertezas econômicas deixam as pessoas sem saber de quanto dinheiro precisam para se sentir seguras. Além disso, quanto mais você tem, mais medo tem de perder o que possui. É a velha história: se você coloca coisas bonitas em casa, vai precisar pôr trancas nas portas, contratar um segurança.

Dinheiro traz infelicidade?

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Quando temos dinheiro, começamos a satisfazer os desejos. E descobrimos outros que jamais imaginávamos ter. A ansiedade aumenta. Algumas pessoas sabem como desfrutar dessa situação, mas são exceção. O dinheiro não muda as pessoas, ele apenas traz à tona com mais força algumas características que o indivíduo já possuía, mas estavam latentes. Alguns tornam-se arrogantes. Outros, generosos, mas tudo isso já estava dentro deles, só que não tinham chance de se expressar.

Como manter o equilíbrio emocional depois de ganhar muito dinheiro?

É preciso cultivar valores humanos, ajudar outras pessoas. Um aluno meu, no México, tinha um filho de cinco anos. No Natal, um menino bateu à porta pedindo esmola. O pai disse ao filho: “Dê a ele um de seus brinquedos”. O jovem pegou um, mas o pai lhe disse: “Não. Um de seus brinquedos preferidos”. O filho resistiu e chorou até que, muito triste, pegou um dos brinquedos de que mais gostava e o deu ao mendigo. Quando voltou, estava radiante e disse: “Pai, posso fazer isso de novo?” Ele descobriu a alegria de dar alguma coisa de valor.

E quando se perde muito dinheiro?

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Muitas vezes, depois de perder algo importante, descobri que aquilo não era tão importante assim. É bom ter isso em mente. Mas há perdas que nos deixam arrasados. Todas as vezes que perdi algo assim, descobri em mim forças que eu desconhecia. O que quero dizer é que muito do medo que sentimos em perder dinheiro não é real. O amor-próprio precisa vir de alguma outra coisa.

De que forma o dinheiro influencia o relacionamento das pessoas?

O dinheiro pode ser um instrumento de atenção, ajuda, compartilhamento. De certa forma, ele foi inventado para ser isso mesmo. Nesse sentido, o dinheiro pode ser uma ferramenta formidável. Ou não. Pode acontecer de você ter um amigo de quem gosta muito, alguém por quem seria capaz de fazer qualquer coisa. Aí ele lhe pede 1 000 dólares emprestado e você diz: “Desculpe, não dá”. Você gosta dele, mas não a esse ponto. É chocante. Você descobre seu medo em relação ao dinheiro, fica confuso. Se prestarmos atenção nas coisas em que gastamos, descobriremos o que é importante para nós. Faça um exercício: anote seus gastos. No fim do mês, você vê que gastou dinheiro em coisas que não sabia serem importantes.

O primeiro contato com o dinheiro é importante?

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As experiências de infância ficam enraizadas em nossa personalidade. Mais tarde, quando procuramos adotar padrões éticos, eles não conseguem penetrar no mais profundo da nossa natureza. Nossas idéias sobre o bem e o mal não têm influência alguma naquela parte íntima do nosso ser associada ao dinheiro.

Como os pais podem ensinar o papel do dinheiro aos filhos?

Em vez de dizer aos filhos isso ou aquilo, os pais devem procurar um meio de mudar sua atitude em relação ao dinheiro. Libertar os filhos do medo em relação ao dinheiro é uma das coisas mais importantes que podemos fazer por eles.

* Laura Somoggi é redatora-chefe da revista Meu Dinheiro

Frase

“Transformar o dinheiro em nosso único objetivo é como comer comida com gosto de plástico”

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