Técnica de meditação tem ajudado esportistas a afastar pensamentos negativos durante as competições.
Texto: Agência Fronteira | Edição de Arte: Juliana Vidigal | Design: Andy Faria
Os desafios de um esporte de resistência como a maratona aquática são os mais diversos. Além dos adversários, os atletas enfrentam a temperatura da água, as condições climáticas do dia, a correnteza de onde é realizada a prova, o Michel Teló… Pois é, o Michel Teló. “É comum levar para dentro da água uma musiquinha boba que gruda da cabeça e vai te importunar por toda a prova. E, poxa, é horrível!”, conta o atleta Matheus Evangelista, quinto melhor nadador do mundo em águas abertas pela Federação Internacional de Natação.
Se já é difícil realizar uma prova como a Rio Negro Challenge, em Manaus, onde a temperatura exterior é de 40 °C e da água chega a 33 °C, imagine cumprir esses 30 km cantarolando Ai, se eu te pego. É contra essa e outras armadilhas menos infames da nossa mente – um fracasso passado, o fantasma de uma lesão recorrente – que atua o treinamento mindfulness.
Segundo Maurício Marques, doutor em psicologia do esporte e um dos preparadores de Matheus, inserir nas rotinas de treinamento exercícios de mindfulness auxilia o atleta, na hora de uma competição, a ter consciência do seu fluxo mental: “O mindfulness é uma técnica para que o atleta habite o corpo. É um meio de afastar um pensamento negativo que possa estagná-lo”, explica.
O objetivo de um treinamento mindfulness em um jogador de futebol, por exemplo, é fazer com que ele consiga trazer o seu pensamento para o vento batendo no rosto, para a textura da bola ao encaixá-la na marca da cal e, assim, esquecer tanto das últimas duas cobranças de pênalti perdidas quanto da taça que o aguarda caso converta a cobrança. Focado nas sensações do presente, o atleta se mantém tranquilo e vigilante ao mesmo tempo.
Daí a recente popularidade da prática entre atletas de alta performance, como a lenda do basquete LeBron James (procure no YouTube vídeos dele meditando em quadra) e a dupla tricampeã olímpica no vôlei de praia dos Estados Unidos, Misty May-Treanor e Kerri Walsh. Talvez o fã mais ilustre, o tenista Novak Djokovic foi questionado em abril passado pelo site da ATP sobre Roland Garros, o único troféu de Grand Slam ausente da sua estante.
A um mês e 11 dias do torneio, Djoko respondeu praticamente um tratado sobre o mindfulness. “Eu não gosto da palavra obsessão porque ela não vem da emoção certa. Roland Garros é um desejo e um objetivo. Eu sinto que nos últimos anos eu consegui treinar a minha mente para ficar o mais tempo possível no tempo presente e focar no que vai acontecer a seguir”, disse Djoko.
“Claro, como todos os jogadores, eu planejo coisas à frente. Mas, quando você precisa operar como uma máquina humana, você necessita fazer isso apenas no momento presente. Quando o momento chegar, eu vou pensar nele mais do que estou pensando agora”, completou o campeão de 12 Grand Slams. Em 2016, a hora chegou: Djokovic pensou em Roland Garros e levantou o troféu inédito.
Metáforas visuais
Além dos exercícios de meditação e respiração no dia a dia, Matheus Evangelista tenta explicar como o mindfulness funciona em tempo real: “Na prova no Rio Negro (realizada em maio de 2015), a adversidade era a temperatura da água. Então o meu pensamento era inspirar vermelho e expirar azul.
Pensava nas cores enquanto realizava a respiração, apostando na associação que fazemos entre elas com o calor e o frio. O mindfulness foi o que me transformou de simples competidor em um medalhista”.
Respirando com tranquilidade Rio Negro adentro, Matheus superou o favoritismo do campeão mundial Dámian Blaum e venceu a prova em 5h22min4s. Cozido em águas manauaras, o argentino se desestabilizou e não resistiu às investidas do rival. Terminou longos cinco minutos atrás do brasileiro e ficou no Ai, se eu te pego.