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A força da resistência

A seu modo, milhares de pessoas, em seus países, travaram uma luta paralela à de seus Exércitos contra a dominação nazista

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h21 - Publicado em 14 abr 2012, 22h00

Muitos pegaram em armas pela primeira vez, outros combateram tanques com coquetéis molotov caseiros, imprimiram panfletos em mimeógrafos de porão e até mesmo formaram exércitos com algum conhecimento de táticas de combate. Eram os partisans – agentes não militares da resistência ao domínio nazista em seus países. O iugoslavo foi o mais forte desses movimentos, com quase 500 mil guerreiros em 1944. Reconquistaram o que se tornaria a Iugoslávia; seu líder, Josip Tito, seria o presidente do país. Em 25 de novembro de 1942, partisans gregos sabotaram suprimentos nazistas rumo ao norte da África, comprometendo a capacidade de luta dos Afrika Korps. Na Dinamarca, salvaram quase toda a população judia, levando-a para a neutra Suécia em outubro de 1943. A reação dos nazistas era brutal. Cidades como Lidice, na República Tcheca, ou a capital da Polônia, Varsóvia, foram arrasadas. Os partisans poloneses foram os que mais salvaram judeus (50 mil, metade dos que sobreviveram no país). Muitos desses soldados, porém, acabaram nos gulags soviéticos.

 

A brigada do “Tio Misha”

QUEM
MISHA GILDENMAN

NASCIMENTO
KORETS (UCRÂNIA)

ONDE ATUOU
FLORESTAS UCRANIANAS

POR QUE É HERÓI?
FUNDOU BRIGADA E ENFRENTOU GUARNIÇÃO COM 200 ALEMÃES

Em 21 de maio de 1942, os Einsatzgruppen (esquadrões da morte nazistas) mataram 2 mil judeus do gueto de Korets, na Ucrânia. Só pouparam alguns homens porque eles poderiam ser úteis em trabalhos forçados. Naquela noite os sobreviventes se reuniram na sinagoga para rezar o kadish (a oração dos mortos). Entre eles estava o engenheiro Misha Gildenman, que havia perdido a mulher e a filha de 13 anos. “Ao contrário dos demais, Misha não tinha o coração cheio de medo, mas de vingança”, diz o historiador Allan Levine. Em 23 de setembro, quando os nazistas rodearam o gueto para liquidá-lo, Misha escapou com o filho e outros judeus para a floresta. Eram 16 no total, divididos em grupos de 3 ou 4. Seu arsenal se restringia a uma pistola, 5 balas e uma faca de açougueiro. Foi assim que o “Tio Misha” fundou uma brigada judaica que ganhou fama e respeito entre os fugitivos das florestas. Soldados soviéticos se aliaram ao grupo, mas Misha manteve a liderança dos ataques. Um deles foi em Rozvazhev, onde havia uma guarnição de 200 alemães. Divididos em 5 grupos, os partisans renderam os vigias, roubaram armas e avançaram sobre a casa do comandante, onde 9 oficiais bebiam para espantar o frio. “Entrei na casa pela janela. Os olhos dos oficiais bêbados miravam uma linda mulher cantando músicas em russo”, relatou Misha. “Empurramos a porta e começamos a disparar. Foi tudo tão repentino que apenas um soldado sacou a pistola e atirou, ferindo um dos nossos. Mas logo caiu no chão com uma bala na testa.”

 

 

Pequeno violinista

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QUEM
MORDECHAI SCHLEIN

NASCIMENTO
KRASNOWKA (UCRÂNIA)

ONDE ATUOU
OVRUCH (UCRÂNIA)

POR QUE É HERÓI?
AOS 12 ANOS ADERIU À GUERRILHA DE MISHA

A guerrilha do Tio Misha contava com um soldado especial: Mordechai “Motele” Schlein, de 12 anos, único sobrevivente de sua família depois de um ataque nazista em 1941. Violinista, o menino foi ouvido por um grupo de alemães que não sabia de onde ele vinha. E foi convidado a tocar no bar que frequentavam, em Ovruch. Não sabiam que ele roubava explosivos, os escondia na caixa do violino e os estocava no porão do bar. Motele divertiu os oficiais por semanas até que teve o sinal verde para levar a cabo seu plano: em 1943, depois de tocar como de costume, acendeu o pavio, correu e viu o bar explodir com os nazistas dentro. Morreria dois anos depois, em combate. Misha guardou o violino. Em 2009, ele foi tocado durante um concerto especial, em Jerusalém.

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Irmãos bons de briga

QUEM
TUVIA, ZUS E ASAEL BIELSKI

NASCIMENTO
STANKIEWICZ (POLÔNIA)

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ONDE ATUARAM
BIELORRÚSSIA

POR QUE SÃO HERÓIS?
SALVARAM 1230 JUDEUS, O MAIOR RESGATE DA GUERRA

“É melhor salvar um judeu do que matar 20 alemães.” Seguindo esse princípio após o massacre de seus familiares na cidade de Novogrudek (Polônia), o camponês Tuvia Bielski montou a maior operação de resgate de judeus por judeus durante a guerra. Ao lado dos irmãos Zus e Asael, salvou 1230 pessoas na Bielorrúsia. Apenas 50 membros desse grupo morreram. Em outras guerrilhas judaicas, nem a metade sobrevivia: a maioria era gente da cidade escapando dos guetos. Ao chegarem à floresta, enfrentavam novos perigos. “Muitos eram roubados e assassinados, e as mulheres, estupradas”, diz a sobrevivente Nechama Tec no livro Um Ato de Liberdade, que inspirou o filme homônimo com Daniel Craig. Com a cabeça a prêmio (por alguns milhares de reichmarks, moeda corrente no regime nazista), Tuvia tinha dois trunfos: havia sido cabo do Exército polonês e conhecia cada palmo da floresta de Lipiczanska, onde montou os primeiros acampamentos em 1943, com apenas 13 pessoas. Divulgaram então a mensagem entre judeus escondidos e presos: “Salvem-se juntando-se a nós na floresta”. Pouco tempo depois a comunidade já tinha mais de 100 pessoas. Um ano depois passariam de mil. Ali a ordem era evitar confrontos com russos e alemães. “Quando atacados, os Bielski preferiam dispersar e se reagrupar depois”, diz Tec. A guerrilha queimava plantações, fazia emboscadas, explodia pontes e eliminava informantes. Para se mover com mais facilidade, usava unidades de 25 integrantes. Do total, 75% eram velhos, mulheres e crianças. Os 20% armados faziam tarefas de proteção, inteligência, sabotagem, saque de comida e busca de fugitivos dos guetos. O grupo virou comunidade com sinagoga, escola, teatro, enfermaria, sapataria e fábrica de sabão – esforços para manter intacta sua identidade cultural e religiosa mesmo diante de massacres e conflitos sangrentos. Em 1944, após a contraofensiva soviética, 1230 pessoas formaram uma fila de quase 1 km caminhando de volta a Novogrudek, com os irmãos Bielski na frente. Depois da guerra, Tuvia se mudou para Israel e de lá para os EUA, onde trabalhou dirigindo caminhão até morrer, em 1988.

 

Sapateiros treinados

QUEM
YEHIEL GRYNSZPAN

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NASCIMENTO
LUBLIN (POLÔNIA)

ONDE ATUOU
FLORESTAS POLONESAS

POR QUE É HERÓI?
TOMOU PARTE NA MAIOR REDE DE GUERRILHAS DA POLÔNIA

Em agosto de 1942, os nazistas começaram a eliminar a população judaica de Lublin, no sudeste da Polônia. A maioria acabou no campo de concentração de Belzek. Yehiel “Chil” Grynszpan foi dos poucos que se salvaram. Aos 24 anos, organizou uma das guerrilhas mais eficientes da Europa Oriental. “Além de contar com treinamento militar, ele se tornou um grande líder porque tinha bons julgamentos sobre pessoas e situações. Ele inspirava confiança sobre o melhor curso da ação”, diz Harold Werner, que integrou a unidade, no livro Fighting Back (inédito no Brasil). Resultado: o que era um grupinho de sapateiros, comerciantes e lavradores se transformou em destacamento militar com 200 judeus na floresta de Parczew. O grupo se uniu à Gwardia Ludowa, a organização clandestina de comunistas poloneses, aliada dos soviéticos, e integrou a maior e mais bem treinada rede de partisans russo-polonesa. Após o conflito, ele emigrou para o Brasil.

 

 

Coragem e loucura

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QUEM
WITOLD PILECKI

NASCIMENTO
OLNIEC (POLÔNIA)

ONDE ATUOU
POLÔNIA

POR QUE É HERÓI?
INFILTROU-SE EM AUSCHWITZ E ORGANIZOU RESISTÊNCIA A NAZISTAS E VIÉTICOS

Witold Pilecki era um veterano da 1ª Guerra que havia sido promovido a comandante de cavalaria. Quando os nazistas invadiram a Polônia, em 1º de setembro de 1939, a unidade de Pilecki conseguiu destruir 7 tanques alemães e três aviões. Em 17 de setembro, a União Soviética também invadiu a Polônia, e a tropa nacional jogou a toalha. Mas Pilecki não se deu por vencido e ajudou a fundar o Exército Secreto Polonês, que se destacava entre os partisans do país. Em 1940, ele apresentou a seus superiores um plano aparentemente suicida: entraria no campo de extermínio de Auschwitz para organizar a resistência interna e passar informações sobre o que acontecia lá. Como? Pela porta da frente. Os alemães detinham civis a esmo para ser usados como escravos. Pilecki se misturou a um grupo que estava sendo preso e foi despachado para o campo de concentração.

Conseguiu enviar a autoridades dos Aliados relatórios sobre as atrocidades cometidas ali, mas o testemunho foi considerado exagerado. Em 20 de junho de 1942, um ucraniano e três poloneses se vestiram de soldados da SS, roubaram o carro do chefe do campo, Rudolph Hoss, e saíram… novamente pela porta de frente. O próprio Pilecki só não foi junto porque acreditava que os partisans fariam um ataque ao complexo e pretendia ajudá-los. Em 27 de abril de 1943, outro episódio bizarro: ao chegar à padaria onde seria obrigado a trabalhar, fora do campo de concentração, dominou os guardas e fugiu.

Livre, Pilecki foi um dos organizadores da Insurreição de Varsóvia, em 1º de agosto de 1944. Encabeçou, mais tarde, um movimento antissoviético. Encerrada a guerra, foi preso, julgado sem direito a defesa real e executado por um pelotão de fuzilamento do governo comunista da Polônia em 25 de maio de 1948. Tinha acabado de completar 47 anos. O governo polonês se retratou por esse julgamento em 1990, e hoje ele é um grande herói nacional.

 

 

O poeta e a guerrilha

QUEM
ABBA KOVNER

NASCIMENTO
VILNA (LITUÂNIA)

ONDE ATUOU
GUETO DE VILNA

POR QUE É HERÓI?
FUNDOU A ORGANIZAÇÃO PARTISAN UNIDA (FPO)

Os livros do poeta russo Abba Kovner relatam a dura realidade da ocupação alemã. Kovner tinha 23 anos ao fugir do gueto de Vilna, na Lituânia, para um convento. Mas não suportou a ideia de se salvar sozinho e voltou para organizar uma revolta. “Não nos deixemos levar como ovelhas ao matadouro”, disse ele em uma reunião em 1941. Naquela altura, dois terços dos 60 mil judeus de Vilna estavam mortos. Kovner fundou a FPO (iniciais em iídiche de Organização Partisan Unida). Chefes judaicos convidaram o grupo a se juntar a eles nas florestas. Kovner recusou. Achava que o combate tinha de ser feito dentro do gueto – até que, em 1943, os nazistas liquidaram o local. A FPO fugiu para a floresta, aliou-se aos partisans e lutou durante toda a guerra. Depois dela, Kovner e sua mulher, Vitka, caçaram nazistas no esquadrão Dam Yehudi Nakam (“O Sangue Judeu Será Vingado”). Em sua ação mais radical, pincelaram arsênico no pão de prisioneiros alemães.

 

 

Fuga a machadadas

QUEM
BERL LOPATYN

NASCIMENTO
LACHVA (POLÔNIA)

ONDE ATUOU
GUETO DE LACHVA

POR QUE É HERÓI?
AJUDOU NA FUGA DE 600 JUDEUS DO GUETO

Mais de 2 mil judeus se espremiam no gueto de Lachva, na Bielorrúsia. Em 3 de setembro de 1942, os nazistas cercaram o local para liquidá-los. O líder do grupo, Berl Lopatyn, comandou a reação. Dezenas de judeus atacaram com machados e facas. Lopatyn agarrou a pistola de um alemão e matou quantos nazistas conseguiu. Depois incendiou uma casa – oportunidade para que os prisioneiros corressem até a cerca. Pelo menos mil judeus morreram. Embora ferido, Lopatyn ajudou 600 pessoas a escapar.

 

 

 

Vive La Resistance!

Em 18 de junho de 1940, os franceses receberam uma transmissão insólita pelo rádio. Quatro dias antes, os nazistas haviam marchado sobre Paris, e, na véspera, o chefe do Exército, o marechal Philippe Pétain, anunciara sua intenção de se render. Naquela quarta-feira, porém, os poucos que sintonizaram seus rádios na BBC britânica notaram uma mensagem em sua língua: “A última palavra foi dita? Deve a esperança desaparecer? A derrota é final? Não!”

Era o general Charles de Gaulle, até então pouco conhecido dos franceses, que havia liderado uma das raras contraofensivas bem-sucedidas da malfadada Batalha da França. Exilado na Inglaterra, ele organizaria as forças da resistência nacional. Até o fim da guerra, muitos franceses fizeram de tudo para sabotar os nazistas e o governo marionete do marechal Pétain. Foram atos de espionagem, assassinatos, destruição de fábricas, sabotagem de linhas férreas, envenenamento de suprimentos e emboscadas em que os membros da Resistance seguiam sempre uma instrução: não fazer prisioneiros.

A Resistência Francesa reuniu muitos intelectuais, artistas, gente que já era ou seria conhecida no pós-guerra: o pintor Pablo Picasso, o filósofo Jean-Paul Sartre, o escritor Albert Camus e o piloto americano Chuck Yeager, o primeiro ser humano a quebrar a barreira do som (e sobreviver), em 1946. Incluiu ainda o brasileiro Apolônio de Carvalho. E deixou alguns heróis famosos – como Jean Moulin, que unificou as forças do movimento, foi traído e morreu sob tortura em junho de 1943.

O movimento teve também uma líder, Marie-Madeleine Fourcade (leia sobre as heroínas na pág. 38), entre seus estimados 220 mil membros.

 

 

Um príncipe sem cerimônia

QUEM
LOUIS NAPOLEÓN BONAPARTE

NASCIMENTO
BRUXELAS (BÉLGICA)

ONDE ATUOU
NORTE DA ÁFRICA E FRANÇA

POR QUE É HERÓI?
NOBRE, LUTOU COMO LDADO COMUM ATÉ SUA PATRULHA SER DIZIMADA

O nome não deixava dúvida: Louis Napoleón Bonaparte era o príncipe herdeiro da coroa francesa, que havia sido dissolvida com Napoleão 3º em 1870. Ninguém esperava que ele fosse se tornar imperador, menos ainda que fosse se tornar herói da Resistência. Quando a guerra foi declarada, mandou uma carta ao primeiro-ministro Édouard Daladier dizendo que queria se alistar. Como a República, evidentemente, não simpatizava com ele, foi recusado. Louis assumiu um nome falso e se alistou assim mesmo, como um soldado qualquer, na Legião Estrangeira. Napoleão 4º (seu título oficial) lutou no norte da África até o armistício. Ao ser dispensado, imediatamente uniu-se à Resistência Francesa. Em 1942, acabou preso enquanto tentava cruzar a fronteira rumo à Espanha. Recusou tratamento especial dos alemães. Foi para a prisão domiciliar, fugiu e voltou à guerrilha. A patrulha em que atuava foi dizimada no dia 28 de agosto de 1944. Só ele sobreviveu. Ganhou várias condecorações e só então passou a se concentrar em postular o (inexistente) trono francês.

 

 

 

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