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Americanos não sabem agradar uma mulher

O namorico durou semanas e a sua iniciativa me fez crer que os cavalheiros americanos eram como os brasileiros: seguiam, literalmente, seus impulsos sexuais.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h26 - Publicado em 31 Maio 2003, 22h00

Tania Menai

Era uma noite de outono em 1995 em Nova York. Eu estava em Manhattan. Saí da escola e peguei o metrô. Ele era um americano de vinte e poucos anos, vestia paletó e carregava uma bolsa amarela. Descemos na estação seguinte. Ele me olhou. Trocamos de plataformas e entramos em outros trens mais duas vezes. Ele continuou a me olhar. Desci na rua 72. Ele também. Segui pela Broadway. Ele idem. Até que, num passo apressado, ele me parou e disse: “Posso falar com você?”. “Já está falando”, respondi. “Eu estava indo pra ginástica, mas, quando te vi, desisti. Você tem nome?” Chris era um jovem recém-formado curtindo seu primeiro trabalho em banco. Foi ele o protagonista do meu primeiro beijo na cidade aonde eu havia chegado três semanas antes. O namorico durou semanas e a sua iniciativa me fez crer que os cavalheiros americanos eram como os brasileiros: seguiam, literalmente, seus impulsos sexuais.

Que engano. Hoje, vivendo há sete anos em Nova York, posso afirmar: os homens daqui ainda têm muito – ou tudo – o que aprender com os brasileiros. A começar pelo olhar. Sim, os homens brasileiros nos olham com poder de raios X, daqueles que parecem varrer seu corpo e sua alma. Já os americanos preferem mirar o chão. Para eles, o olho no olho pode implicar um algo mais, e isso, para eles, seria extraordinariamente constrangedor. Uma mulher em Nova York depende dos latinos e dos trabalhadores das delis (um tipo de lanchonete) ou de restaurantes, para ouvir um galanteio. Depende também dos homeless (mendigos) – os únicos homens da cidade que abrem a porta para as damas. E mesmo assim, a porta do banco, esperando por uma esmola em troca.

Para atender a uma socidade que exige nada menos do que cidadãos super-heróis, ultra-ricos e bem-sucedidos, os homens respiram trabalho e não encontram tempo para ver aonde vão dar as trilhas de pintas no corpo de suas amadas. Desconhecem aqueles arrepios causados por toques inesperados – cresceram se cumprimentando com aperto de mão. E só. Seus abraços são desengonçados, o espaço interpessoal é quilométrico e o medo do processo por assédio sexual os leva a se esconder debaixo de seus cachecóis. As pessoas não se encostam nem dentro dos ônibus entupidos na hora do rush. Mesmo na Inglaterra, de onde os americanos importaram o tal puritanismo anglo-saxão, as relações não são tão impessoais. No país de Bush, onde festas têm hora marcada para terminar e as férias do verão de 2009 já estão marcadas, não sobra brecha alguma para o acaso. E isso vale para relacionamentos.

Ah, o delicioso acaso. Nos Estados Unidos, isso só acontece nos filmes de Hollywood. Resta ao povo procurar sua tampa da panela nos milhares de anúncios de jornais e revistas, que mais lembram classificados de emprego: a cara-metade tem de ter a idade X, a carreira W, gostar do cineasta Y e da gastronomia Z. O humorista Seinfeld já brincou dizendo que, ao buscar a mulher ideal, deu-se conta de que almejava a si mesmo. Duas revistas semanais nova-iorquinas ainda reservam guias anuais para solteiros na cidade – aonde ir e como agir. Aulas sobre o óbvio.

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Como carioca (cidade de PhDs no assunto), confesso que me sinto como o ator inglês Jeremy Irons no filme O Último Entardecer – um correspondente em Hong Kong que cobre economia e política, mas que não compreende a mentalidade dos habitantes. Cresci nas calçadas onde, décadas antes, Tom e Vinicius assobiavam para a Garota de Ipanema e o cartunista Lan já derramava seu olhar italiano sobre doces mulatas. Sim, as mulheres brasileiras são famosas porque seus homens são poetas, beijam suas curvas, babam, babam mais ainda, fazem versos e serenatas. Enfim, valorizam o produto nacional. Todas passariam despercebidas pelos americanos mesmo numa cidade como Nova York, onde há muita vida nas ruas.

Nova-iorquinos não se atrevem a assobiar, muito menos se esbarrar por querer. Tentam vencer o distanciamento humano puxando conversa com o cão da pretendida: o rapaz elogia o poodle da moça e, se tudo correr bem, o papo pode acabar com uma troca de telefones (mas alguns só se dirigem ao cachorro). Os americanos com sal buscam suas mulheres em terras distantes. Querem mais sabor. Sou madrinha de casamento de um deles, que trocou Chicago pelos braços de uma carioca. Essa trilha nunca falha. Segui e proclamo: meu namorado é brasileiro. Que nem Deus.

* Jornalista brasileira, vive em Nova York

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