As primeiras-damas do PCC
Como uma disputa entre três mulheres rachou e redesenhou a organização criminosa mais poderosa do Brasil
No dia 31 de agosto de 2002, o PCC completava nove anos. Depois da morte de Sombra, a facção tinha dois homens no topo: Geleião e Cesinha. Junto deles vinha Marcola. Para celebrar a data, os chefões mandaram fechar o Vermelhinho, bar próximo ao Carandiru. Nos convites para o evento, a mensagem: “Você é um convidado especial para comemorar a resistência contra a discriminação e a opressão carcerária”. Na comemoração, regada a salgadinhos, refrigerante e cerveja, as esposas de membros do PCC, parentes e amigos vestiam camisetas com as inscrições Paz, Justiça e Liberdade.
Dois meses depois, o clima dentro da organização era outro, nada familiar. E a culpa era, sobretudo, das mulheres dos chefões. Na disputa pela cúpula feminina da facção estavam Aurinete Félix da Silva, a “Neti”, mulher de Cesinha, e Petronilha Maria Carvalho Felício, a “Petrô”, casada com Geleião. Mas quem levou a pior foi a Ana Maria Olivatto Camacho, ex-mulher de Marcola.
A execução de Ana, morta com dois tiros de pistola na porta de casa, em Guarulhos (SP), marcou o início de uma nova era para o PCC. Amiga tanto de Neti quanto de Petrô, a advogada se preparava para visitar Cesinha e Geleião no Centro de Readaptação Penitenciária (CRP) de Presidente Bernardes quando foi executada. A notícia chegou rápido aos ouvidos de Marcola, que ordenou a busca imediata pelo autor. Logo apareceu um retrato falado apontando Lauro Gomes Gabriel, o “Ceará”, como assassino. Detalhe: o pistoleiro era irmão de Neti – cunhado de Cesinha.
Marcola não entendia a motivação do crime. Mas a polícia trabalhava com três hipóteses. Em uma delas, Ana teria descoberto um caso de Neti com um policial e poderia dedurá-la a Cesinha. Outra versão indicava Geleião como mandante. O bandido estaria indignado com a intervenção de Ana, que convenceu Petrô a abortar a explosão de um carro-bomba na sede da Bovespa. A última conjectura era também a menos provável: o próprio Marcola teria mandado matar a ex-mulher, suspeitando que ela mantinha um caso com Cesinha. Até hoje não há certeza sobre a motivação, mas indícios apontam Neti como a cabeça da emboscada.
Ao saber que Ceará fora o autor dos disparos, Marcola resolveu dar fim à cumplicidade de quase uma década com Cesinha e Geleião. Para ele, não havia dúvidas de que os dois estavam por trás da execução. Por isso, acabariam jurados de morte, assim como suas esposas, acusados de trair o PCC. Marcola ascendeu sozinho ao topo e, em janeiro de 2007, casou-se pela segunda vez – agora em pleno presídio de segurança máxima de Presidente Bernardes, com a estudante de direito Cynthia Giglioli da Silva.