Como o streetwear indiano se tornou pijama no Ocidente
Entenda como calças largas milenares, criadas por nômades asiáticos para montar cavalos, deram origem às nossas roupas de dormir.

A história dos pijamas começa na Ásia, há cerca de 3 mil anos. A palavra vem do persa pāy-jāma, que significa literalmente “roupa para as pernas” — até então, o termo se referia unicamente à parte de baixo da roupa.
A mudança ocorreu quando povos nômades que habitavam as vastas planícies da Eurásia começaram a usar calças largas amarradas na cintura em vez de mantos ou túnicas, que eram vestimentas mais comuns na época.
Eles eram cavaleiros e pastores como os Dothraki de Game of Thrones, e preferiam essa vestimenta inovadora porque ela era mais confortável para a montaria (de fato, a hipótese mais aceita é que a invenção das calças foi uma consequência do uso de cavalos como meio de transporte).
Foi assim que a peça chegou ao subcontinente indiano, onde acabou combinada com um tipo de blusa chamada kurta: uma peça longa, sem gola e bastante larga, semelhante a uma bata — esse conjunto é usado até hoje na própria Índia, no Paquistão e em Bangladesh.

O mundo não era exatamente globalizado nessa época, e os europeus da Idade Média não faziam ideia de que essas peças existiam.
Séculos se passaram até os ingleses invadirem e ocuparem violentamente a Índia. Kurtas e pijamas se tornaram ícones de riqueza e luxo no Ocidente, reservados à elite da Companhia das Índias Orientais que enriquecia às custas da exploração e submissão de seus colonizados.
Na época, essas ainda eram roupas diurnas. Na Inglaterra, até então, usava-se um tipo de roupão de linho ou lã por cima de uma camisa para dormir. A peça lembrava um kimono japonês ou uma camisola.
Em um artigo escrito na National Geographic, Ana Velasco escreve que “a camisola era usada por homens e mulheres. Foi só no final do século 19 que o “pijama” [agora referindo-se ao conjunto de duas peças de calças largas e camisa] se tornou peça de roupa para dormir.”
O que aconteceu foi que, enquanto os britânicos dominavam a Índia, eles precisavam de roupinhas confortáveis para usar em casa. Por isso, os soldados começaram a imitar o vestuário local, mais adequado ao calor tropical.
Na era vitoriana, o vestuário de duas peças (uma blusa solta e uma calça), inspirado nas roupas indianas, passou a ser adotado mais amplamente na Europa, mas com algumas adaptações: as blusas ficaram mais curtas e botões foram inseridos na parte da frente da peça.

Os EUA, que eram uma potência industrial nascente, agarraram a oportunidade de produzir essas peças em massa, o que ajudou a espalhar o costume pelo mundo: os pijamas de duas peças passaram a ser vendidos a preços acessíveis nas lojas de departamento.
Em 1933, uma revista francesa especializada em moda masculina escreveu sobre os benefícios do pijama: “Ele nos dá grande liberdade de movimentos, necessária ao corpo durante o sono, e favorece a dignidade e o estilo que não eram atendidos pela camisola.”
O autor afirma que “houve um desequilíbrio causado pelo uso das camisolas (sendo o equilíbrio a qualidade primordial da elegância) que os pijamas restabeleceram, acrescentando a graça de sua linha.”
Todo esse discurso favoreceu o público masculino, que se encantou com a possibilidade de abandonar o vestidão para dormir. Somado com a popularidade dos filmes do início do século 20, o pijama se tornou a nova norma.
Enquanto isso, na índia, os pijamas e kurtas permaneceram uma peça popular do streetwear, e também são usados em ocasiões especiais, como casamentos e festivais. Ou seja: se quiser passar o dia de pijama, já sabe aonde morar.